O capitão Kirk chorou. E o turismo espacial ainda nos vai salvar*
"Levou-me às lágrimas". Foi desta forma que William Shatner descreveu à revista Time ter visto o Planeta Terra do espaço.
A emoção do canadiano de 90 anos, que para sempre será o Capitão Kirk da nave espacial Enterprise, da série Star Trek, foi bem visível no momento em que saiu da cápsula que o levou 100 quilómetros acima do nível do mar, mas ainda mais durante os momentos que esteve "lá em cima".
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Shatner nunca foi propriamente conhecido por uma forma contida de atuar, mas não houve espaço para dúvidas de que o seu comportamento, tanto no espaço como em Terra, nas imagens que correram mundo, foi genuíno.
Até porque está longe de ser o único a ter uma reação semelhante. Ver o planeta de longe muda até o mais profissional especialista.
Michael Collins, o "astronauta esquecido" da Apollo 11, que morreu neste ano, afirmou ainda em 2019: "A coisa que mais me surpreendeu foi o facto de a Terra projetar um aspeto de tal fragilidade. E porquê, não sei, até hoje. A sensação com que fiquei é de que é pequenina, é brilhante, é linda, é a nossa casa e é frágil".
Também o astronauta Scott Kelly, que ficou famoso por ter passado um ano na Estação Espacial Internacional, fez questão de dizer à CBS, em 2015, enquanto estava em órbita: "Aqui podemos ver os continentes e os países sem fronteiras políticas. Isso dá-nos a impressão de que estamos todos juntos nesta coisa chamada humanidade".
Até porque, convém lembrar, do espaço não há qualquer construção humana visível. É um mito aquela ideia de que se pode ver a Grande Muralha da China (que provavelmente nem deve ter sido começado por chineses...)
Esta maneira de começar a olhar para a realidade de uma forma diferente depois de passar um período em órbita é descrita por dezenas de astronautas e cosmonautas, tendo dado origem, em 1987, ao livro The Overview Effect - Space Exploration and Human Evolution, de Frank White, cujo título acabou por ficar como a definição do fenómeno -- overview effect ou, traduzindo, efeito de visão geral.
Aparentemente, para a maioria das pessoas, é abissal a diferença entre experimentar essa visão da curvatura do planeta com o negro do espaço em fundo, em "gravidade zero", e simplesmente ver imagens ou vídeos do mesmo.
Só assim se consegue o tal resultado "transformador".
Ao regressar à Terra, após descer as curtas escadas da New Shepard 18, Shatner afirmou. "Toda a gente no mundo precisa de fazer isto. Toda a gente no mundo precisa de ver isto. (...) E eis ali a mãe Terra e o nosso conforto. E ali.... E há ali morte? Não sei [o que dizer]."
Tem razão. Quanto mais gente puder fazê-lo -- de preferência pessoas com poder de decisão em todas as áreas --, mais pessoas se preocuparão em proteger o planeta. De uma forma realista e sólida, com aposta séria na tecnologia.