Filhos com cancro, pais sem emprego: "Não é só a doença, é tudo o que traz com ela"

Quatro histórias. Uma doença. Dezasseis vidas interrompidas. O cancro a imiscuir-se nas emoções, no trabalho, a impor a baixa ou o rendimento de inserção social.
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"Não é só a doença, é tudo o que traz com ela", dizem. Setembro é dourado para a oncologia pediátrica. É tempo de sensibilização e de alertas de quem vive esta realidade.

Elisabete, Vera, Diana e Sónia quiseram ser mães. E são. Da Sofia, 9 anos, do Eduardo, 10, da Eva, 4, e do Ivo, 8. São da Madeira, da Trofa, de Vila Franca de Xira e de Aveiro, mulheres na casa dos 30, algumas com outros filhos, casadas ou separadas, que viram a sua ideia de maternidade violentamente abalada por um diagnóstico de cancro num filho. "O chão foge-nos debaixo dos pés", "interrompe-nos a vida", dizem. Não se conhecem, mas as frases repetem-se como se as tivessem partilhado vezes sem fim. São vividas, de "causa própria", e só quem a sente a conhece. Da tristeza ao vazio, da revolta à força para "sorrir quando só apetece desabar". "Desistir? Nem pensar. Só eles importam."

Estas quatro mulheres aprendem a viver um dia de cada vez, focadas no essencial, no positivo. "São os nossos filhos, merecem tudo de nós." Por eles vale até "deixar de ser pessoa", de "existir". Tudo o resto, o que não depende delas, o resto que o Estado, os deputados, os governantes talvez pudessem resolver, só lhes "inferniza as rotinas do internamento, do isolamento, das sequelas da químio ou da radioterapia". Acabam por resolvê-lo. E basta "um sorriso" ou um "mãe, estou bem" para se sentirem outras. "São eles que nos dão força a maior parte das vezes."

A realidade colateral que o cancro traz é pesada. As despesas disparam, um dos salários vai à vida, o projeto de carreira começa a ruir até ao limite em que o desemprego ou o rendimento de inserção social se impõem. É essa realidade que queriam ver mudar. "Os políticos que venham ao IPO passar um dia para saberem que realidade é esta. Não é só a doença, é muito mais", diz Diana. Elisabete aceitou dar a cara por uma causa que "se calhar já nem me vai beneficiar a mim, será para outros. Tornamo-nos invisíveis para uma carreira contributiva, mas exigem-nos tudo e mais alguma coisa. Não podemos ficar esquecidos. Já basta a doença".

E nenhum pai está preparado para ela. Sónia e Vera lidam há anos com as sequelas que ela deixou, mas não aceitam que lhes digam que os filhos não são um caso de sucesso. "A lei é que não está feita para casos que podem ter complicações." Anseiam pela revisão das leis que existem e que lhes corta o direito de estar com os filhos quando mais precisam.

"A doença interrompe-nos a vida"

Elisabete tem 39 anos, é de Porto Santo, vive no Funchal com o marido e os dois filhos, Sofia, 9 anos, e Diogo, 16. Há um mês, Sofia teve nova recaída da leucemia de há dois anos. "É o terceiro cancro desde que em 2013 lhe foi detetado um tumor nos ossos."

Os últimos anos têm sido vividos entre o continente e a ilha, a mãe cá e o pai lá. "O Diogo precisa de apoio. A doença aparece mas a vida lá fora continua. E ninguém imagina o que se segue a uma notícia destas", diz Elisabete na varanda do último piso do Instituto Português de Oncologia de Lisboa, na Praça de Espanha, onde a filha está mais uma vez no isolamento. "Todos dizem que vai passar, mas não sei o que esperar. É um dia de cada vez." Regressa ao tempo em que decidiu casar, ter filhos, ficar a cuidar deles até mais tarde do que é habitual e só depois pensar numa carreira. "Sonhamos com uma vida melhor, trabalhamos para isso e, de repente, ficamos sem chão. E não se sabe quando tudo acaba."

Elisabete tinha um negócio de estética há dois meses quando soube da doença de Sofia. Só mais tarde percebeu que não teria direito a nada do Estado, da Segurança Social, nem sequer à baixa por assistência a um filho menor, que a lei prevê, ou a um subsídio para amaciar as despesas que surgiram com a doença. Não tinha seis meses de descontos. "A doença apanhou-me na fase em que queria crescer profissionalmente para ajudar a família. Dediquei-me durante muito tempo à maternidade e, quando quis dar o salto, cortaram-me as pernas. Toda a força que encontrara para ter uma atividade de que gostasse ruiu." Fez os restantes quatro meses de descontos que faltavam do seu bolso para ter direito à baixa. Passou a receber 350 euros, que lhe permitiram custear as despesas para estar com a filha em Lisboa. Os quatro anos de baixa acabaram. Sofia teve nova recaída. "Nem sei se tenho direito a mais alguma coisa", o que importa é "focar-me nela."

Elisabete vai falando sem abandonar o sorriso, mesmo quando refere os momentos mais duros. Quando lhe perguntam "como aguentas?", só sabe responder: "É ela que me dá força. Ontem tinha febre, fica murchinha, mas disse-me: "Mãe, estou bem. Não tenho dores." E quando não tem dores está tudo bem." Perante isto, diz: "Não devíamos ter de lidar com tanta burocracia, só nos tira tempo e energia." Quando chegou ao IPO não sabia ao que vinha. "Ninguém sabe, quando recebe uma notícia destas." O diagnóstico tinha sido feito no Hospital do Funchal, que logo enviou Sofia para Lisboa.

"Combinei com o meu marido que viria ele. Se era só para exames, eu ficava no Funchal com o Diogo (12), a preparar o ano escolar. Foi em setembro, eles ficaram em casa de uma tia que vive em Lisboa, mas percebemos que não voltariam. Eu tive de vir a 26 desse mês, os meus pais têm muita idade, mas saíram do Porto Santo para ficarem com o Diogo - tudo mudou também na vida dele. O meu marido ficou comigo uns tempos, depois voltou. Alguém tinha de ter ordenado."

A partir daqui, foi sempre assim. Uns cá, outros lá, juntos sempre que possível, a aproveitar viagens baratas e férias. "Já basta a doença, a distância, quanto mais não podermos matar saudades... "A doença mudou tudo, tivemos de nos adaptar, mas do que a Sofia precisa mais é da família. Tentamos resolver isso diariamente com as conversas, refeições e momentos que passamos uns com outros através da internet", mas não chega.

A mãe madeirense tem agora duas casas. "A Acreditar é a segunda, abriu-nos as portas, tirou-nos um peso de cima - o ter de pagar renda, água, gás. É só atravessar o jardim e estamos no IPO. E todos falamos a mesma linguagem. Quem nos ouve já sabe o que sentimos. Tornamo-nos uma família e para isso contribuem muito os profissionais do IPO. Sem o apoio que nos dão, a forma como nos recebem, não sei como seria."

A baixa terminou em março e Elisabete tem medo. "Temos feito planos, mas vem a doença e leva-nos o mundo. Andamos às cabeçadas até nos levantarmos, mas aos poucos e com muito esforço conseguimos manter algumas coisas, ultrapassar outras. Nesta altura, há dívidas que não sei como pagar. Estou sem ordenado há cinco anos..."

Dois anos depois do primeiro tumor, quando tudo parecia estar bem encaminhado, apareceu o segundo, uma leucemia mieloblástica que obrigou Sofia a voltar a Lisboa. Precisou de transplante, o irmão foi o dador, "era compatível e isso também nos descansou". Ficou mais 14 meses a fazer químio. O último ano estava a ser muito positivo, o sistema imunitário tinha-se fortalecido, passou a ir à escola e a estar com outras crianças - o mundo em que devia estar -, mas a terminar o 3.º ano soube que tinha de voltar ao IPO. "Aguardávamos por setembro para ela voltar à escola e eu ao trabalho. Não a podíamos pôr em tempos livres - na Madeira, são em montanha ou no mar e ela não pode; tem uma prótese num calcanhar, colocada durante o primeiro cancro, para não perder o andar. Mas mais uma vez a doença cortou-me a hipótese", diz com a voz a tremer.

O que lhe reserva o futuro, não sabe. Sabe que gostaria de ver a sua situação e a de tantos pais salvaguardada na legislação. "Alguma coisa tem de mudar. Estamos a cuidar dos nossos filhos, temos de estar presentes 24 horas. Não temos direito a nada?" Sabe que "a Sofia é uma criança feliz. É especial, quem a conhece sabe que sofre, mas dá o salto assim que pode. Viveu a infância num hospital a ver cair-lhe o cabelo e tantas outras coisas, mas não se queixa. A dor de alma dela é estar longe, não ter a família junta".

Entrar às 04.00, sair à hora de almoço para dar apoio ao filho

A história de Vera é diferente, mas igual. Tem 37 anos e o marido 40. O filho, Eduardo, tem 10, mas aos 15 meses foi-lhe diagnosticada leucemia mieloblástica. Os quatro anos de baixa a que teve direito para lhe dar assistência acabaram há muito. Desde essa altura, Vera sai de casa todos os dias antes das 04.00 para se dirigir ao matadouro de São Romão, na Trofa, onde já trabalhava antes. O turno acaba às 13.00 - ela chega e sai o marido para trabalhar. É assim que conseguem apoiar Eduardo, que ainda precisa de muitos cuidados. "Quando se soube da doença, ficámos quatro meses e meio no IPO do Porto para químio e transplante. Correu tudo bem, mas depois vieram as consequências. O enxerto provocou-lhe lesões nos pulmões, usa oxigénio durante 24 horas, tem de ser ventilado muitas vezes. Ainda faz muita medicação e até há um ano tinha crises constantes, saía do trabalho a correr para ir para o hospital. Tem estado melhor, mas há um mês teve outra crise", conta.

Vera é mulher de muita energia. Usou a folga para ir ao dentista - "ando aflita de um dente, até nos esquecemos de nós", ri-se. Tem outro filho, Rafael, hoje com 16 anos. Tinha 6 quando a doença chegou à família. "Foi muito duro para ele, andou de casa em casa, ora de amigos ora da madrinha." Mas após estes anos, a família mantém-se junta. "Há quem não aguente a pressão... Não é fácil. É uma cambalhota na vida."

A empresa onde Vera trabalha "foi compreensiva, não reclamaram e não me despediram. Estive de baixa e quando os quatro anos acabaram perguntei aos médicos se o Eduardo podia ir para um infantário. Eu tinha de trabalhar. Se dois ordenados já são pouco... Os médicos diziam-me que não podia, que o Eduardo precisava de mim, que nenhum infantário o iria aceitar, chegaram a assustar-me: "Ó mãe, você agora chega a casa e tem o Eduardo, mas um dia pode não ter"". Sabia que o estado dele era complicada, ficou em casa dois meses sem ordenado, mas tinha outro filho. Então negociou com a empresa o horário das 4.00 e o marido, que trabalhava por turnos, pediu ao patrão para fazer um fixo, das 14.00 às 22.00. "Eu entro e ele sai, mas conseguimos organizar-nos para estar sempre alguém com ele."

Eduardo tem várias consultas por mês - diabetes, tiroide, olhos... ficou com cataratas - "depende se está estável". Nesses dias, Vera não usa o direito que a empresa lhe dá de ir ao médico uma vez por mês. "Se o usasse acabavam por me descontar no prémio de assiduidade, sempre são 30 euros." Usa dias de férias. Já lá vão oito anos desde o início da doença, não tem descanso. Eduardo tem aulas em casa.

Apoios do Estado ou uma situação legal que lhe permitisse tratar do filho sabe que não tem, e "prefiro fazer assim". "Quando o Eduardo entrou no IPO e me disseram que tinha de ficar, fiquei. Na primeira semana, o meu marido ficou com o Rafael, depois teve de ir trabalhar. A lei não permite a cada pai um mês de baixa por assistência a cada filho..." Nesse mês, nem estavam bem conscientes do que se passava. "Geríamos o dia-a-dia, íamos atrás do que era preciso fazer e, para ser sincera, hoje tenho mais dificuldade em lidar com os problemas dele." O desânimo por vezes surge - muitas crianças passaram por ali e estão curadas, mas não o Eduardo... Mas logo dá a volta: "Ele é um caso de sucesso. É um menino com uma força fora do normal, muito alegre. É isso que nos agarra."

Vera preferia ser ela a cuidar sempre de Eduardo: "Se estivesse lá quando começa uma crise, talvez não chegassem ao ponto de termos de ir para o hospital, de ficar internado, mas não há nada na lei que ajude. Vivemos com receio. Não tinha nada há um ano, há um mês estava aqui em casa com a professora e teve uma crise de epilepsia. Desmaiou, vomitou sangue e foi um caos. Tive de vir a correr, chamar o INEM e ir para o hospital. Vivemos todos os dias sem saber o que pode acontecer no minuto seguinte."

Vera sabe que há uma proposta para criar um estatuto do cuidador e acredita que isso pode trazer melhor qualidade de vida. "Eu sinto isso na pele, como pais de crianças com uma doença destas somos esquecidos. Já basta o sofrimento delas, mas para a sociedade é como se não existíssemos."

"Nenhuma criança o merece"

Diana Santos tem 35 anos. Trabalhava há uma semana na restauração quando soube da doença da filha, a 14 de setembro de 2015. "Nem contrato assinado tinha." Veio direta do Hospital de Vila Franca de Xira para o IPO de Lisboa com a filha, então de 2 anos. "Leucemia de muito alto risco."

Foram cinco meses de internamento, químio e muita fisioterapia. Eva perdeu o andar, ainda não anda e assim será mais um ou dois anos devido aos danos neuropáticos da químio. "Ficou muito dependente, a precisar de mim a 100%." A ausência ao trabalho cortou-lhe de imediato a hipótese de ter contrato, salário e até direitos. "Não houve interesse. Sabiam que ia ficar no IPO um a dois meses, e depois logo se via. Fiquei sem direito a nada." Nem sequer à baixa por assistência a um filho. Antes, trabalhava aos fins de semana, em restaurantes e cafés. Situações que lhe permitiam estar com a Vera. "Não havia infantários que abrissem às 5.00, era o horário que encontrava para trabalhar, não dava para conciliar com o pré-escolar da Eva. Tive de optar por servir almoços ou jantares aos fins de semana", conta, sentada num dos bancos da entrada no IPO, quando aguarda a químio que a Eva faz todas as segundas-feiras. Com ela estão os sogros, apesar da separação, os avós da Eva, que lhe têm dado todo o apoio. "Estar separada não é importante. O importante é que a Eva esteja bem e tenha tudo o que necessita. E tem tido, uma família espetacular, do lado pai e do meu. É o que conta."

Tem outra filha, Jéssica, de 16 anos, que perdeu o pai meses depois de nascer. A vida de Diana e das filhas não tem sido fácil, mas até à doença de Eva não sabia "o que era fundamental". Sorri para dizer que se passa a andar "de sorriso nos lábios quando a vontade é de gritar, de chorar - mas não é disso que os nossos filhos precisam". Confessa: "Entramos aqui e conhecemos um mundo à parte, os profissionais, os outros pais, que se entreajudam. Sabemos ler o olhar, quando cada um precisa de um abraço, de uma palavra."

Recebe um subsídio de 62 euros a que Eva tem direito pela doença, mais 113 pela outra filha menor, que perdeu o pai, e agora mais 244 do rendimento social de inserção (RSI). Levou um ano até pedir este apoio. Estava a ser ajudada pela Acreditar, a família estava ao seu lado e não queria pedir um subsídio ao qual podia não ter direito. "Foi assim que fui educada, mas ajudaram-me a tratar de tudo e hoje estou a receber." Não chega ao ordenado mínimo, e as despesas são muitas. "Não são só os medicamentos, são os pequenos desejos que tentamos satisfazer..."

Passaram dois anos, a leucemia de Eva está em remissão. "Está bonita, tem cabelo e é uma criança feliz." Diana sabe que tem de ser forte, é o que a filha lhe pede, o que todos os filhos pedem a uma mãe ou a um pai, nesta situação, eles são quase "transcendentais na força que transmitem". Até gostaria de arranjar trabalho, mas sabe que seria difícil conciliar tudo. "Ela não pode ir para um infantário. Basta darem-lhe um empurrão para cair e fraturar um osso - os médicos dizem que ficou com ossos de vidro. Por isso, diz: "Falo por mim, mas também por outros pais. Não queremos palmadinhas nas costas, queremos que os governantes tenham noção do que é esta realidade. Estamos ocupados a 100 %, a tratar dos nossos filhos. Para a sociedade é como se não estivéssemos a contribuir, não consigo trabalhar, não posso descontar. É por minha vontade? Não! O que vai ser da minha vida, das minhas filhas. Vou continuar a viver de ajudas? Eu preferia ter uma lei e direitos que me ajudassem." Por duas vezes, ia perdendo a Eva, mas ela está cá. "Só tenho de sorrir", mas o que gostaria mesmo "é que esta maldita doença deixasse de existir, nenhuma criança o merece".

"Precisa menos de mim, isso é bom"

Sónia só tem um filho, Ivo, de 8 anos - tinha 20 meses quando soube da doença, leucemia linfoblástica -, trabalhava no Porto e vivia em Aveiro. O marido trabalhava em Aveiro, mas com o Ivo no IPO do Porto, mudaram-se, primeiro para junto de familiares, depois para a casa da Acreditar. Na altura, tinha um contrato seguro, informou a empresa que teriam de a substituir por ano e meio a dois anos. "Foi o que me disseram os médicos. A empresa não me criou obstáculos."

Dois anos depois, em dezembro de 2013, o Ivo parecia estar bem e Sónia queria voltar a trabalhar, por "necessidade emocional" e para dar ao filho uma vida tão normal quanto possível, "não queria que vivêssemos só em função da doença". À empresa, um laboratório de águas residuais, disse que voltaria em fevereiro, dias depois as notícias não foram as que esperava. "O Ivo sofria de doença residual, tinha células cancerígenas, mas em baixa quantidade, o que não permitia iniciar um protocolo de tratamento de químio. Tinha de ser vigiado para se saber se era uma recaída, se se avançava para a químio ou se o sistema imunitário conseguiria combater essas células. Um período de impasse. O caso dele era único, não havia historial de doença residual no sistema nervoso central. Os médicos preferiram aguardar. Desaconselharam voltar logo ao trabalho mas já tinha falado com a empresa e fui."

Em fevereiro apresentou-se. Trabalhou até junho, quando perceberam que era uma recaída, teve de voltar à baixa. Acabou por usar os quatro anos a que tinha direito. O marido teve de continuar a trabalhar. "Era preciso um ordenado, eu tinha de estar presente."

O filho sobreviveu aos dois anos que dão para a recidiva, "muitos morrem nesse tempo". O Estado pensa que quatro anos de baixa chegam, mas não. Nessa altura teve de recorrer a tudo, meteu baixa psiquiátrica. Sucederam-se juntas médicas e sempre que era chamada expunha os argumentos. "Tinha de estar com o meu filho e não havia outra forma. Não foi fácil perceberem as minhas razões. Ouvi coisas inacreditáveis - diziam que tinha condições para trabalhar, recomendaram que tomasse medicação para me sentir mais equilibrada, acusaram-me de querer enganar a lei, nunca me disseram vamos tentar resolver de outra maneira para acompanhar o seu filho. Saí sempre de lá num estado lastimável, só chorava. Mas consegui."

Por tudo isto, aceitou falar da sua história, quanto mais pais expuserem as suas dificuldades, mais perto estaremos de os governantes olharem para esta realidade. Em junho do ano passado, Ivo ficou bem. "Recebemos a notícia que esperávamos." Sónia podia voltar ao trabalho, mas a empresa estava em reestruturação e chegou a acordo. "O Ivo ia continuar a precisar de vigilância e não interessava à empresa que eu não estivesse a tempo inteiro. Vivia em Aveiro e trabalhava no Porto, era difícil." Rescindiu.

Hoje está noutra empresa ao pé de casa. Ivo já vai à escola, fez o 3.º ano e tem amigos. Deixou de ter a mãe a 100% e às vezes queixa-se. "Digo-lhe sempre que é por bons motivos, não precisa tanto de mim."

O que diz lei sobre o acompanhamento a um filho doente

O que está na lei - Baixa por assistência à família (Decreto-Lei 133B-1997) que dá um mês por ano aos acompanhantes de crianças com doença crónica ou oncológica; Para a função pública - Dec.-Lei 89, de 2009; Para Regime de Segurança Social - Dec.-Lei 91, de 2009.

- Licença de acompanhamento (Dec.-Lei 71-2009) para filhos no agregado familiar até aos 24 anos por período de seis meses até ao máximo de quatro anos.

- Redução do tempo de trabalho para meio tempo por assistência a um filho (art. 54 da Lei n.º 7, de 2009). Só para os funcionários públicos.

- Bonificação por deficiência até aos 24 anos, começa nos 62 euros.

O que os pais e técnicos gostariam de ver mudar

- Aumentar a licença de acompanhamento nos casos em que isso se justifique.

- Alargar o período de licença por falecimento de um filho até um mês - agora é de seis dias, qualquer que seja o familiar.

- Permitir aos pais acompanhar o filho doente de forma alternada.

- Aprovar o estatuto do cuidador

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