O cancro, a viuvez e a cadeia: o inferno de Lula pós-Planalto
Mais do que ascensão e queda, os últimos anos da longa e intensa vida de Luiz Inácio Lula da Silva podem ser definidos por uma imagem ainda mais expressiva: a descida dos céus ao inferno.
Em 2010, o metalúrgico nascido no sertão pernambucano saía do Palácio do Planalto, após sete anos de governo e dois triunfos eleitorais categóricos, com perto de 80% de aprovação popular e ainda conseguia eleger uma burocrata meio desconhecida como sucessora. Pelo mundo, ecoavam os sucessos da sua gestão, começando pelos programas sociais que levaram 50 milhões de brasileiros, antes abaixo do limiar da pobreza, à sociedade de consumo, e terminando no crescimento sustentado do PIB de um dos BRIC mais promissores à época.
"This is the most popular guy on earth, this is the guy!" ("Este é o tipo mais popular à face da terra, este é o homem!"), exclamou Barack Obama, então presidente dos Estados Unidos, ao esbarrar com o brasileiro quase em fim de mandato numa reunião de líderes na ONU.
Logo em 2011, no entanto, após 40 anos de vício em tabaco, Lula foi diagnosticado com um tumor na laringe. O tratamento de rádio e quimioterapia, sob coordenação dos médicos da elite paulistana que o ex-sindicalista passou nos últimos anos a frequentar, correu bem mas fez desaparecer por uns meses a principal imagem de marca do rosto do carismático político: as barbas. Já recuperado, Lula assistiu atónito à prisão por causa do escândalo do mensalão de José Dirceu e outros seus ex-colaboradores e amigos íntimos.
Precisou ainda, tempos depois, de começar a socorrer Dilma Rousseff, em forte queda de popularidade, sobretudo após os protestos de junho de 2013 iniciados por causa do aumento em dez centavos de uma tarifa de autocarro em São Paulo. Sem tato político, ao contrário do padrinho, para lidar com um Congresso Nacional assumidamente clientelista, errante na condução económica e sob uma conjuntura internacional negativa, Dilma acabaria destituída em 2016. E 13 anos de poder depois, o PT, dizimado entretanto nas eleições municipais daquele ano, voltava à oposição para angústia de Lula.
Em janeiro de 2017, entretanto, Marisa Letícia Lula da Silva, companheira do político desde os primórdios da sua ação sindical, em 1973, sofreu um acidente vascular cerebral, vindo a morrer no dia 3 de fevereiro. Foi a segunda viuvez da vida de Lula, que perdeu aos 25 anos a primeira mulher, Lourdes Silva, por complicações derivadas de hepatite em plena gravidez.
Seis meses após a morte de Marisa Letícia, Lula ouviu a sentença do juiz Sergio Moro no caso do apartamento tríplex no Guarujá, um dos seis processos em que é réu ou acusado na Operação Lava-Jato e outras: nove anos e seis meses de encarceramento, agravados entretanto em segunda instância para 12 anos e um mês. Agora Moro decretou a prisão do velho metalúrgico nascido na miserável Caetés no sertão pernambucano que em 2010 parecia ter o mundo a seus pés.
Em São Paulo