O canal que ninguém vê... mas que toda a gente vê
9 de dezembro, 17 horas de emissão em direto da Assembleia da República. Esta foi a grelha de programação de muitos canais de informação portugueses, que não quiseram deixar por mãos alheias a cobertura noticiosa de uma comissão de inquérito a um dos maiores escândalos da banca portuguesa. Ao contrário da televisão em movimento que é conhecia por gerar audiências, o auditório não arredou pé de uma imagem que colocava, como se diz na gíria, o "Portugal sentado" a fazer perguntas e procurar respostas junto de Ricardo Salgado, ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES), e de José Maria Ricciardi, presidente do Banco Espírito Santo Investimento (BESI).
Somados todos os canais que exibiram a maior parte da maratona de audições (RTP Informação, SIC Notícias, TVI24, CMTV e Económico TV), as médias do dia apontavam para 113 mil pessoas sintonizadas, mas destas só quatro mil, ou seja, 3,5% daquele valor, escolheram a AR TV, o Canal Parlamento que partilhou o sinal para os canais.
"Distribuímos gratuitamente e para nós o trabalho está feito de base. As outras televisões têm mais mercado, é normal e natural que as pessoas liguem, mas o nosso objetivo é do serviço público e ficamos contentes que seja retransmitido. Sem nós, também não seria simples", refere Nuno Encarnação, que considera ver cumprida uma "melhor informação" em "matérias que são importantes". Este deputado do PSD, presidente do Conselho de Direção do Canal Parlamento, considera que a emissão "é um complemento porque o interesse das pessoas neste tipo de comissões é muito grande", refere. Na verdade, naquele mesmo dia, também o Canal Parlamento viu as suas audiências subirem quatro vezes mais do que a média de dezembro, conquistando quatro mil espectadores. O canal voltaria a suplantar os seus valores médios a 11 de dezembro, dois dias depois, com a audição de Amílcar Morais Pires, o antigo CFO do BES.
Couto dos Santos admite que antecipava resultados mais avultados, embora olhe para os resultados "de forma positiva". "Esperava mais, mas acho que vai atingir mais auditório quando se criar a cultura do valor que a AR TV tem do ponto de vista do debate político", afirma o presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República, de onde parte o orçamento do canal.O responsável alerta que quem está a ver outros canais , "não vai mudar", mas lembra que é à AR TV que "vão buscar o sinal". Por isso, conclui que se trata de "um serviço público de grande interesse para o cidadão e é um instrumento de enorme relevância, para que o cidadão tenha uma perceção diferente do que é o Parlamento e criar uma consciência política".
Sem estagiários e com sete profissionais
"Um coordenador, quatro técnicos e dois jornalistas", enumera Nuno Encarnação quando referencia a equipa que prepara as emissões para o canal emitido na televisão digital terrestre (TDT) e no cabo (mais alargada do que a emitida em sinal aberto), "que têm programações diferentes". Em janeiro de 2013, a AR TV passou a ser emitida regularmente em sinal aberto. As oito a dez horas, de segunda a sexta, custam em transporte de sinal "à volta de 400 mil euros", diz.
A emissão é feita "por funcionários da Assembleia" dedicados a estas funções e não conta, garante Nuno Encarnação, "com trabalhadores a recibos verdes, nem colaboradores". Quanto a estagiários, Encarnação explica que "não há, nem tem havido", vincando que "na atual gestão nem sequer tem estado previsto que existam". "Não tem sido prática do Canal Parlamento", resume.
Os orçamentos alocados à emissão, a imprensa tem feito eco de custos a rondar os dois milhões de euros anuais. À Notícias TV, a Secretaria Geral da AR especificou. "A AR TV está integrada nos Serviços da Assembleia da República. Assim, pondo de lado as despesas com pessoal, o Orçamento da AR para 2015 prevê uma rubrica de investimento, no valor de 689 500euro, para o Canal Parlamento. Este valor destina-se ao projeto Arquivo digital AR TV/Canal Parlamento, ao upgrade do servidor de emissão, a consumíveis e outro equipamento para o audiovisual (AR TV, sistemas de áudio, projeção e votação), instalado em espaços diversos da AR. Acresce a este valor o compromisso anual para distribuição da AR TV na TDT, no valor de 516 600euro (IVA incluído)."
Média de audiência mais baixa em 2014
O ano ainda não terminou, mas o Canal Parlamento arrisca fechar 2014 com menos 100 espectadores de média face ao ano anterior, ou seja, com 700. Para Nuno Encarnação, mais do que os resultados, está em causa a missão. "Sem a AR TV seguramente que muitas das televisões não fariam este trabalho, nem ele era reconhecido, como é óbvio, havendo transmissões noutros canais cumprimos a nossa missão de serviço público", afirma. O presidente do Conselho de Direção do Canal Parlamento olha antes para o salto entre 2012 e 2013, dos 300 para os 800 espectadores em média, em ano de arranque em free-to-air. "O quinto canal na TDT veio colmatar uma necessidade que era proporcionar a quem vive nos locais mais longínquos do país uma alternativa aos canais generalistas e um acompanhamento dos trabalhos. Os cidadãos estão mais informados sobre os trabalhos dos deputados que elegem e acompanham mais de perto a política nacional", ressalva Nuno Encarnação.
Com uma página do canal na rede social Facebook, Nuno Encarnação fala em alargamento da oferta no online em 2015. "Estimamos que o novo site do Canal Parlamento tenha novas funcionalidades a partir do início de 2015, permitindo que os interessados possam escolher a comissão que querem acompanhar - que estejam a decorrer, mas que não estejam a ser transmitidas em direto - através da internet", antecipa.