O brexit e os direitos dos cidadãos

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Na semana que passou, o Reino Unido e a União Europeia concluíram a 2.ª ronda da negociação sobre os termos da nossa saída da UE. Foram reuniões construtivas e substantivas que abrangeram a maior parte das questões que sustentam as nossas respetivas posições em matéria de direitos dos cidadãos.

Juntos demos um grande passo em frente. Há agora uma compreensão muito maior sobre as posições de ambas as partes e uma convergência significativa sobre as principais questões que realmente importam aos nossos cidadãos - sejam eles britânicos em Portugal ou portugueses no Reino Unido. Ambos os lados querem avançar para um acordo, e é isso que estamos a fazer.

Estas conversações demonstraram que o RU apresentou uma proposta abrangente em matéria de direitos dos cidadãos que aborda todo o âmbito das propostas da UE, e que analisa a sua aplicação prática em benefício dos cidadãos.

Não é verdade que aquilo que propomos é vago ou pouco claro. Tentámos expor de forma pormenorizada o que a nossa proposta significa para os cidadãos da UE que vivem no RU, seja em matéria de imigração, segurança social, cuidados de saúde, educação ou direitos económicos. Para todos os efeitos, os cidadãos portugueses com settled status serão tratados da mesma forma que um cidadão britânico.

Na quinta-feira, o Reino Unido e a Comissão Europeia publicaram uma nota técnica conjunta que estabelece as áreas em que estamos de acordo, as áreas em que é necessário negociar e as áreas em que não estamos alinhados. Há mais áreas de acordo do que desacordo - e algumas das divergências dizem respeito a questões em que as propostas britânicas vão para além das da Comissão Europeia.

Conseguimos, por exemplo, alcançar um elevado grau de convergência sobre o âmbito das nossas propostas sobre residência e segurança social; sobre a nossa interpretação e definição de conceitos-chave, tais como "residência permanente/settled status" e "residência ininterrupta"; sobre os critérios de elegibilidade para pedidos de residência; e sobre os direitos dos familiares atuais. Acresce que alcançámos um compromisso comum para tornar o processo de pedido de residência mais eficiente e mais simples.

E conseguimos corrigir alguns mal-entendidos. Tem-se afirmado que os cidadãos da UE que vivem no RU iriam perder o seu direito de voto em eleições locais. Não é verdade. Protegeremos o direito dos cidadãos da UE de votarem - e se candidatarem - em eleições locais. Esperamos que a UE proteja os direitos dos britânicos, de forma recíproca.

Claro que existem áreas em que não estamos de acordo. Uma das mais significativas é a da competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. A verdade é que uma das principais razões que levaram os cidadãos britânicos a votar para sair da UE foi a vontade de recuperar soberania para o Parlamento britânico. Daí que a primeira-ministra May tenha sido muito clara: ao sairmos da UE deixaremos de estar sob a jurisdição do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.

Isto não deve ser encarado como uma surpresa. No final de contas, o Tribunal de Justiça não tem jurisdição direta sobre países terceiros. Um cidadão português que viva nos EUA, por exemplo, depende do sistema jurídico daquele país para fazer valer e proteger os seus direitos. Por isso, o que propomos dificilmente pode ser visto como algo fora do comum. Nem é, como alguns têm sugerido, uma tentativa de retirar direitos a cidadãos da UE. O RU orgulha-se da sua longa tradição de assegurar que direitos e liberdades sejam protegidos no seu território e de cumprir as suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos. Nada se altera com a nossa saída.

Mas isso não significa que não compreendamos a posição da UE. E por isso as disposições que propomos serão consagradas na legislação britânica e executáveis por qualquer tribunal do nosso sistema judicial. O sistema jurídico e judiciário do RU é um dos mais antigos no mundo e um dos mais respeitados. Mas também estamos dispostos a assumir compromissos no Acordo de Saída que tenham estatuto de direito internacional.

Há muito mais a fazer. Mas, no geral, esta foi uma semana produtiva. E representa um importante passo em frente para transmitir tranquilidade e segurança aos portugueses no Reino Unido e aos britânicos em Portugal.

Transmitir essa confiança é um dos nossos principais objetivos. Cerca de 400 mil portugueses fizeram do Reino Unido a sua casa. Dos relvados da Premier League ao Serviço Nacional de Saúde, na banca, nos serviços financeiros, nas universidades e na restauração, eles têm contribuído para o sucesso económico e para o dinamismo cultural do nosso país. E aqui a grande comunidade britânica também continua dar uma contribuição importante para a vida em Portugal.

Na semana que passou, o RU e a UE conseguiram chegar a acordo em diversas áreas. Compreendemos agora melhor as nossas respetivas posições e, acima de tudo, realçámos a seriedade e a profundidade da nossa proposta.

Embaixadora do Reino Unido em Portugal

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