O arquitecto português com obra na Casa Branca
"Aumentar a qualidade de vida" é a sua principal preocupação quando começa a esboçar um projecto. Qual a sua função? Como se integrará no espaço? Como é que as pessoas vão usá-lo? Apesar das dificuldades iniciais inerentes à profissão, Filipe Oliveira Dias é hoje um exemplo raro de sucesso. Tem 43 anos e o seu atelier, no Porto, já participou em 32 concursos de obras. Ganhou 23, de Bragança a Marrocos. E o último cliente a figurar no currículo é a Casa Branca, que este mês encomendou a cadeira Flame para a sua sala de imprensa.
Quando a desenhou para o Teatro Helena Sá e Costa, no Porto, o arquitecto não encontrou nenhuma empresa nacional disposta a produzi-la.Nesse mesmo ano de 1999, criou também a linha sanitária Assimétrica, hoje exportada para 80 países. Demorou quase quatro anos a convencer a Cerâmica Valadares. A atitude das empresas mudou muito desde então, mas "ainda não há a abertura desejável", diz.
"A arquitectura e o design tocam aspectos comuns", recorda. "Se num edifício é preciso pensar no espaço físico, nas condicionantes do terreno e prédios vizinhos, no caso do design os objectos têm de ser pensados atendendo a quem os vai utilizar e a ergonomia é importantíssima. Muitas vezes, os operários têm as mãos duras porque trabalham com ferramentas inadequadas, que só tiveram em conta a economia do produto."
Tentando analisar todos os "ruídos" em torno de cada projecto, seja ele um teatro ou uma cadeira, Filipe Oliveira Dias é "apaixonado" pela investigação e aposta nos brainstormings. Ao falar das obras, usa a terceira pessoa do singular. "O atelier funciona como uma equipa muito coesa de pessoas com formação diferente. Só assim se consegue somar conhecimentos e ter autocrítica."
Dependendo da sua especificidade e complexidade, um projecto pode envolver 25 colaboradores. Mas o núcleo principal do atelier é composto por 12 pessoas, incluindo arquitectos e designers. Concepção, projecto, obra e manutenção são fases que todos acompanham. Em "sintonia". Além disso, conta a rir este pai de quatro filhos, "temos de sentir realização profissional, não apenas servidão profissional".
"Os edifícios deviam passar 50 anos sem dar problemas, como se fazia antigamente. Serem resistentes e de manutenção quase nula", acrescenta o arquitecto que conseguiu, por "64 contos o metro quadrado", fazer um bairro social com bom desenho e bons materiais.
De astronauta a arquitecto
Neto de arquitecto e filho de professor da Faculdade de Engenharia do Porto, Filipe Oliveira Dias sonhava ser astronauta. A miopia cortou-lhe as ilusões. Ao secundário na Escola Infante D. Henrique, seguiu-se engenharia. "Para me aproximar da aeronáutica e das tecnologias, mas cedo percebi que não era aquilo."
"Aquilo", o que descobriu ser a sua grande paixão, eram "as artes e o desenho". Por isso, não foi para a Faculdade de Arquitectura. Preferiu o jovem curso da Árvore (hoje Escola Superior Artística do Porto), onde absorveu tudo o que podia sobre teatro, fotografia, pintura e vídeo. E onde teve aulas com Siza, Souto de Moura ou Hestnes Ferreira. Porém, no momento da verdade, reconhece que sentiu o peso da opção. "Ser 'da casa de fulano' abre portas."
"Sendo um jovem arquitecto, não havia muitas formas de conseguir trabalho sem ter lobbies. A solução era participar em concursos públicos", recorda. E daí nasceu o fascínio pela obra colectiva. "É um desafio muito aliciante, porque a complexidade aumenta num edifício destinado a ser usado por muitas pessoas de diferentes hábitos culturais." Não que considere menos a encomenda privada, mas o "gozo" não é igual.
A sua arquitectura, diz, é norteada pelo seguinte princípio: "Responder de uma forma estética ao espaço e ter uma imagem de marca, mas ao mesmo tempo pensar no uso a longo prazo." Assim, "terá muito mais possibilidades de sobreviver e ser reconhecida como a obra correcta", argumenta.
Quais os seus mestres? Filipe Oliveira Dias aponta o arquitecto cubano Ricardo Porro, pela "percepção do espaço e do prazer que dá sonhar". Em Portugal, cita Fernando Távora, de quem foi amigo, pela "percepção do desenho".
Criado entre artistas, convoca sempre para as suas obras a intervenção plástica. Já o fez com Júlio Resende, Graça Morais ou Ângelo de Sousa, com quem trabalhou na reconversão da Rua Miguel Bombarda, artéria que concentra maior número de galerias do Porto, invertendo o sentido do trânsito e criando uma ampla faixa pedonal. A obra, espera, deve avançar em 2008. |