O argumentista que está a ganhar o Festival de Toronto

O mais afamado argumentista de Hollywood, Aaron Sorkin, estreia-se na realização com "Molly"s Game". Um biopic com muito hype.
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Charlie Hunman, ator britânico muito procurado, dizia anteontem à imprensa no Festival Internacional de Cinema de Toronto (TIFF), muito exaltado, que o novo Papillon, de Michael Noer, não é um remake do clássico de Franklyn J. Schaffer. Em parte tem razão, a história do famoso ladrão francês que conseguiu escapar do inferno da prisão da Guiana Francesa é baseada num livro escrito pelo próprio, mas nos créditos do filme não deixa de estar lá bem patente que o argumento inspira-se no filme de 1973... Aliás, inspira-se mas não chega lá. Este Papillon não vai inspirar a nova geração nem vai ficar na história como um decente filme prisional. São clichés atrás de clichés e Remi Malick (Mr. Robot) e Charlie Hunman não têm qualquer química entre si. É heresia compará-los a Dustin Hoffman e Steve McQueen.

Mas a estreia mundial mais esperada do arranque do TIFF foi Molly"s Game, o primeiro filme realizado por Aaron Sorkin, o argumentista de Steve Jobs e Uma Questão de Honra. Jessica Chastian e Idris Elba são as estrelas de um drama sobre o julgamento de Molly Bloom, uma empresária de sucesso que foi considerada a rainha da organização de jogos privados de póquer. Sorkin debruça-se na sua batalha jurídica para provar a sua inocência depois de uma violenta detenção pelo FBI.

Molly"s Game tem alguns problemas de primeira obra (nota-se que é um filme de um argumentista), em especial a sua excessiva duração, mas reluz sempre quando os atores debitam os diálogos "musicados" de Sorkin. Tudo é seco e de uma vertiginosa precisão, sempre sem debitar lugares-comuns do drama jurídico. E o mais interessante é que Sorkin aposta em longas sequências de jogadas de póquer, filmadas com genuíno suspense. Não é preciso perceber truques de bluff ou gostar do jogo para se ficar preso àquilo.

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A vida de Molly Bloom, pela pena e câmara de Sorkin, predispõe-se sempre numa arrojada velocidade narrativa, sem medos dos mais arriscados avanços e recuos temporais. Nada que atrapalhe a justeza no retrato de uma mulher verdadeira. A Molly de Sorkin é a Molly real, mas é também um exemplo de um problema americano em lidar com uma força da natureza feminina. Um furacão de mulher que fez milhões de dólares com clientes como Leonardo DiCaprio, máfia russa e campeões profissionais do jogo. Aliás, este é um festival em que a tendência são as personagens femininas reais e fortes.

Outro acontecimento com o filme é Jessica Chastain, que na sua gala no Elgin Theater foi aplaudida a meio das cenas, e há quem diga que Chastain está a caminho de mais uma nomeação ao Óscar. Provavelmente, é uma precipitação pois a atriz já fez bastante melhor e porque, mais para frente, ainda chegará aqui ao TIFF A Woman Walks Ahead, de Susanna White, outra das apostas fortes para a temporada dos prémios. Aconteça o que acontecer, Jessica Chastain será uma das protagonistas do festival.

A gala de Toronto mais esperada foi a de Suburbicon, de George Clooney. A imprensa salivava por um red carpet que poderia incluir Matt Damon e o próprio Clooney. Se em Veneza as opiniões se dividiram, agora compreende-se: este argumento dos irmãos Coen não é material dourado.

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Trata-se de uma visão sarcástica sobre a América de subúrbio dos anos 1950 e sua escalada de racismo. Um conto sobre gente má com uma mistura no mínimo selvagem entre o grotesco e o negro. Nas mãos de Clooney funciona numa comédia com pouca ambição, se tivesse sido realizado pelos Coen seria algo parecido com Arizona Júnior e O Grande Salto. Dá para sorrir imenso e tem momentos antológicos de violência, mas será exagero considerá-lo para as vagas da temporada de prémios.

* Em Toronto

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