Novo pluralismo
Acirculação descontrolada das populações, fugindo de péssimas condições de vida, em busca de acolhimento em sociedades frequentemente mais atraentes pela imagem do que pela realidade, aconselha a repensar o pluralismo que subitamente desafia patrimónios imateriais que pareciam consolidados.
Não se trata das minorias tradicionais, de que o direito internacional se ocupou com pouca eficácia em relação à fixação de fronteiras em regra criadas pela guer- ra, e de que a Europa está amargamente recordada. As novas migrações, muito condicionadas pelos mercados de trabalho, falhas de amparo jurídico com uma frequência inquietante, estão a ser abrangidas por uma doutrinação que muitas vezes confunde o multiculturalismo deste século com o cosmopolitismo de outras épocas.
As actuais minorias precisam sobretudo de ser olhadas com um critério, ainda assim revisitado, de pluralismo. Isto porque os migrantes, sobretudo depois do processo da descolonização, possuem uma nacionalidade de origem, e por isso não é sempre e seguramente a integração na cidadania dos países de destino que necessariamente será procurada com convicção.
Não são apenas as antigas metrópoles colonizadoras que se preocupam com as diásporas respectivas, dedicando-lhe responsabilidades ministeriais e instâncias de acompanhamento nos lugares do destino. A Inglaterra, a França, a Espanha, e Portugal, designadamente, praticam essa política de manutenção dos laços dos emigrantes e dos seus descendentes com as origens nacionais e familiares. Esta questão tem exigido atenção especial, e legislação cuidada, designadamente da Espanha que tem a especificidade das praças do Norte de África, o que não simplifica a distinção, por vezes culturalmente difícil de efectuar, entre emigrantes que procuram circular com a sua nacionalidade espanhola bem estabelecida, e os emigrantes que a não possuem, embora os laços culturais, incluindo a religião, estabeleçam naturais solidariedades. Ainda quando tais solidariedades não existem, a identificação social pode tender para não distinguir entre eles na vida de uma sociedade civil inquieta com o multiculturalismo crescente.
Quando o clima de confronto, alimentado pela memória das guerras de colonização, mesmo que a independência possa estar consolidada, é agravado pelas respostas agressivas do terrorismo local ou internacional, a vida habitual, nos locais de destino, não tende para distinguir entre cidadãos e simples emigrantes, agravando todas as disfunções. Nos dias actuais, são os muçulmanos os que mais frequentemente são envolvidos por estas inquietantes situações, que sobretudo os Estados que tiveram o poder colonial nessas áreas, onde de regra são originadas as migrações, enfrentam com dificuldades crescentes no seu território, tal como animam derivas dos confrontos para os territórios vizinhos, quando a acção agressiva se organiza em cadeia.
Na América do Sul, a questão tornou-se premente em muitos dos países, quer porque o sentimento de fraternidade hispânica tem variações no que respeita às migrações recíprocas, quer porque os nativos que foram submetidos cresceram em capacidade de revisitar o passado e exigir um futuro específico.
Revisitar a problemática do pluralismo das populações passou a ser uma das urgências mais desafiantes dos nossos tempos, porque o estatuto tradicional das minorias, que ganhara alguma estabilidade na Europa do século passado, tem agora novas componentes que mais respondem a excepções do que aos normativos legais elaborados para tempos que não regressam. Os regionalismos, que se multiplicam, e tendem para institucionalizar-se em várias latitudes, designadamente para falar com voz própria nas organizações internacionais, vão exigir nova doutrina, nova legislação e novas atitudes recíprocas de povos que tendem para ser uma soma de comunidades exigentes de especificidade reconhecida. Fazer coexistir a igualdade de direitos com a protecção e reconhecimento das diferenças vai ser uma exigência crescente à medida que as definições políticas regionais se multipliquem.