"Atlanterhavsvegen" é a sua designação em norueguês. É uma estrada icónica que atravessa um arquipélago, com um comprimento de 8274 metros e uma largura de 6,5 metros, iniciando-se a cerca de 30 quilómetros a sudoeste de Kristiansund e terminando a 47 quilómetros a norte de Molde, que são os principais centros populacionais do condado de More og Romsdal, no oeste da Noruega. A infraestrutura foi construída em várias pequenas ilhas e recifes que estão conectados. Curioso é notar que, em alguns troços, a estrada dá uma sensação de montanha-russa, com pontes curvas e arcos sobre as ondas brutais do mar. A mais longa e mais proeminente das pontes, Storseisundet, tem 260 metros de comprimento e parece um trampolim para o céu. Essa ilusão de ótica encanta ou aterroriza os viajantes. Esta estrada atlântica foi iniciada a 1 de agosto de 1983, mas foram necessários seis anos para a concluir, pois doze furacões dificultaram e atrasaram a obra, sendo finalmente inaugurada em 7 de julho de 1989. A partir desta data, a estrada é gratuita em todos os dias 7 de cada mês. Ao longo do seu percurso, existem várias plataformas de observação destinadas a turistas, mas, se a intenção é pescar, em Myrbaerholmbura há pontes especialmente construídas para ambos os lados da estrada para se pescar um bacalhau ou uma cavala. Estacionei numa delas por um momento. Um pescador estava solitário, compenetrado na sua tarefa. Acerquei-me, tentando perceber se falava uma língua mais comum do que o impercetível norueguês. Afinal, tão impercetível como para ele seria o português. "I dag er det kun makrell" - disse-me e escreveu num papel, ao perceber que eu ficara na mesma, repetindo em inglês. Assim percebi que naquele dia apenas apanhara cavala, ou seja, o seu objetivo também deveria ser o bacalhau. Aparentava ter uns 70 anos de idade. Olhei para o balde e vi-o quase cheio de cavalas. Tentei passar-lhe o meu apreço por tão grande feito. Respondeu que era reformado, tendo como "hobby" a pesca e mantendo a sua banda de "heavy-metal". Fiquei espantado. Era um indivíduo que ainda aparentava uma boa forma física. Talvez um protótipo do norueguês, excepto na sua dificuldade em se expressar no esperanto da atualidade, ou seja, o inglês. Afinal, a economia norueguesa tem como base, também, a exploração de peixes diversos; o setor da saúde é considerado excelente; e um dos traços culturais reconhecidos internacionalmente é a presença de muitas bandas de "heavy metal". No final, ele soltou a última frase: "Velkommen! God tur!". Estas percebi eu, para seguir uma boa viagem, sem que, antes, eu lhe dissesse o que já aprendera: "Takk!".Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.