Nomes, siglas e casos para entender um ano decisivo
Angola
O principal confronto geopolítico de 1975 teve lugar em Angola. Nos longos meses que precederam a independência (a 11 de Novembro), estalou a guerra civil, que duraria um quarto de século, auxiliada pelos países vizinhos e os jogos tácticos das grandes potências. Boa parte das movimentações político-militares em Portugal teve como justificação, expressa ou implícita, o controlo do país que ia nascer.
rasil
País de exílio de antigos governantes, capitalistas caídos em desgraça e reaccionários avulsos. Do Rio observavam a evolução do PREC à espera do regresso. O que começou a acontecer no final da década.
blindados
Meio de transporte muito usado por militares. Para ocuparem a Quinta Divisão, fazerem provas de força ou irem tomar um copo à noite.
onselho da revolução
Criado no rescaldo do 11 de Março, após a extinção da Junta de Salvação Nacional e do Conselho de Estado. Intenções ajudar a atingir "o mais rapidamente possível os objectivos do Programa do MFA e garantir ao povo português a segurança, a confiança e a tranquilidade que lhe permitam continuar com determinação a reconstrução nacional". Centro da discussão no PREC, sobretudo após a divulgação do Documento dos Nove. Manteve-se após a "normalização" de 25 de Novembro, seria extinto pela revisão constitucional de 1982.
copcon
Comando Operacional do Continente, criado em 8 de Julho de 1974. Chefiado por Otelo Saraiva de Carvalho (graduado para o efeito em brigadeiro), que acumula com o comando da Região Militar de Lisboa. Defendia a subalternização da Assembleia Constituinte e todo o poder à democracia de base das "assembleias populares". Responsável, entre outras proezas, pela prisão de 400 militantes do MRPP na curiosa data de 28 de Maio de 1975. Em Setembro é esvaziado de funções com a criação do AMI (Agrupamento Militar de Intervenção).
costa gomes
Presidente, sucedeu a Spínola, após a renúncia deste, em 30 de Setembro de 1974. Figura adulada ou contestada, contraditória, teve importância fulcral nos momentos decisivos. Personalidade ambígua e parecendo algo hesitante, teve a alcunha popular de "Rolha", pela sua habilidade em cavalgar todas as ondas dominantes. Ao sair de Belém, integrou o Conselho Português para a Paz e Cooperação, organismo dirigido pelo PC.
lp / MDLP
Principais organizações da contra-revolução em Portugal. O ELP (Exército de Libertação Português), fundado pelo antigo subdirector da PIDE Barbieri Cardoso, lançou panfletos e foi acusado de pegar fogo a matas e pinhais. Mais importante politicamente foi o MDLP (Movimento Democrático de Libertação de Portugal), que estivera para se chamar Frente de Salvação Nacional, nome recusado pelo seu mentor, Spínola. A certa altura, garantia ter mil homens armados prontos para entrar em Portugal. Depois de ter sido denunciado pelo jornalista Gunter Walraff, que se fizera passar por traficante de armas, o MDLP perdeu a pouca importância política que tinha. Entre outros movimentos com a mesma conotação política, conta-se a Maria da Fonte, do editor Paradela de Abreu, com ligações à Igreja, a partir do arcebispado de Braga.
UR
Frente de Unidade Revolucionária, criada em 25 de Agosto, com forte incentivo da Quinta Divisão do Estado-Maior-General das Forças Armadas, no auge da disputa política. Após a divulgação dos documentos dos Nove e do Copcon, e no estertor do V Governo provisório de Vasco Gonçalves, a FUR representava uma aliança (efémera) entre os comunistas (acossados pelas bases) e a extrema-esquerda nas suas várias versões.
ORNAIS
Após a nacionalização da banca, a 13 de Março de 1975, a maioria dos jornais segue o mesmo destino por arrastamento (questão de propriedade ou de dívidas) e acaba por ficar sob controlo do PC. Excepções os poucos semanários (Expresso, principal alvo de acusações de Vasco Gonçalves, e O Jornal, criado em Maio de 1975, próximo da ala esquerda do PS e do Grupo dos Nove) e o Jornal Novo, diário lançado com dinheiro de empresários da CIP (Confederação da Indústria Portuguesa) e a criatividade de Artur Portela, à frente de uma Redacção de jovens jornalistas de esquerda próximos dos Nove. Com o 25 de Novembro, a efémera aliança entre o capital e a esquerda anti-PC desfez-se e Portela foi a primeira vítima. O combate do PREC agudizou-se a propósito de um jornal, República, socialista, ocupado pelos trabalhadores que contestavam a orientação editorial. O "caso República" tornou-se internacionalmente um dos símbolos da luta ideológica em Portugal.
ELO ANTUNES
Figura-chave da chamada ala moderada do MFA. Foi ministro dos Negócios Estrangeiros (um dos principais responsáveis pela descolonização), elaborou um plano económico considerado muito "recuado" e abandonado por força das circunstâncias após o 11 de Março, concebeu um documento que marcou a ruptura com as alas gonçalvista e otelista e contribuiu para separar as águas políticas em Agosto de 1975. Apelidado de "reaccionário" e de "protegido do imperialismo" pelos dirigentes do PC, foi a sua intervenção televisiva a 25 de Novembro que salvou o partido de Cunhal.
MFA
Movimento das Forças Armadas, criado pelos capitães que levaram a cabo o golpe de 25 de Abril. Institucionalizado após o triunfo da revolução, para controlar a "marcha para o socialismo". A precária unidade dos militares até ao 28 de Setembro deu lugar, depois disso, a uma divisão aberta, patente em assembleias tumultuosas, a partir de certa altura controladas pela chamada facção gonçalvista. Após o 25 de Novembro, dissolve-se, com o regresso dos militares aos quartéis e a reimposição da hierarquia.
OVE
Grupo de militares, membros do Conselho da Revolução, que ficou assim conhecido pela divulgação, em Agosto de 75, de um documento que visava "a clarificação de posições políticas e ideológicas (...) dentro e fora das Forças Armadas". O V Governo Provisório tinha os dias contados. O Copcon apresentaria, dias depois, um documento alternativo. As facções em guerra já tinham argumentos programáticos para a contagem, metafórica e literal, de espingardas.
TELO
O estratego do 25 de Abril, afirmou-se adepto da social-democracia depois de ir à Suécia e revolucionário ao ser recebido por Fidel Castro. Como comandante do Copcon, alcançou um enorme poder. Na altura decisiva, recusou montar o cavalo do poder e assim contribuiu para evitar o perigo de um banho de sangue.
inheiro de azevedo
Almirante, membro da Junta de Salvação Nacional, Pinheiro de Azevedo era chefe do Estado-Maior da Armada quando surgiu como a figura mais consensual para substituir Vasco Gonçalves à cabeça do Governo, após o falhanço da hipótese Carlos Fabião (então chefe do Exército). Era primeiro-ministro no 25 de Novembro, com autonomia política reduzida.
PREC
Processo revolucionário em curso expressão adoptada para sintetizar a situação política entre 28 de Setembro de 1974 e 25 de Novembro de 75. Os antigonçalvistas popularizaram o uso das iniciais.
UINTA DIVISÃO
Um simples departamento do Estado-Maior-General das Forças Armadas, tornou-se um dos protagonistas do combate político-ideológico. Chefiada pelo comandante Ramiro Correia, a famosa Quinta Divisão transformou-se na secção de agitação e propaganda da facção gonçalvista. Dali saíram posters com desenhos assinados por nomes como Abel Manta e Vespeira para glorificar a aliança "Vasco-Povo- -MFA" ou o "Poder Popular". No auge da crise que conduziu à queda de Vasco Gonçalves, Otelo mandou os comandos de Jaime Neves ocupar as instalações da Quinta Divisão.
ALIS
Regimento emblemático de Lisboa. Começou por chamar-se RAL1 (Regimento de Artilharia Ligeira n.º 1) e mudou de nome pouco depois de ter sido alvo de ataque no 11 de Março. O seu subcomandante, Dinis de Almeida, foi, há quatro anos, candidato da CDU à Câmara de Cascais.
IMOR
No auge da guerra civil - entre a Fretilin (independentista), a Apodeti (defensora da integração na Indonésia) e a UDT (que, primeiro, era pró-Portugal e acabou a fornecer pessoal político aos integracionistas pró-indonésios) - o governador português, Lemos Pires, retirou-se para a ilha de Ataúro. A situação agravou-se ainda mais. Poucos dias após a independência declarada pela Fretilin, as tropas indonésias invadiram o território e nele permaneceram até 1999. Durante um quarto de século, Timor foi um espinho cravado na consciência dos portugueses, que, com mais ou menos dificuldade, aceitaram e compreenderam o processo de descolonização e integraram meio milhão de retornados.
CP
Unidade colectiva de produção. Símbolo de uma reforma agrária que começara, de forma espontânea e caótica, com a ocupação de herdades no Alentejo e se tornou absolutamente dependente do aparelho partidário do PCP. As UCP acabaram desmanteladas pelos governos constitucionais.
ASCO
Vasco Gonçalves, primeiro-ministro de quatro governos provisórios. O seu nome, atitudes políticas, discursos e o apego final ao poder provocaram, quase em doses iguais, paixões e ódios. Convidado para formar o segundo executivo provisório, este tenente-coronel de engenharia era considerado moderado. O rescaldo do 11 de Março mostrou um militar radicalizado, colado à estratégia do PC, levando ao afastamento do Governo de PS e PPD, que logo começaram a trabalhar para o substituir. Após o efémero V Governo, saiu para sempre da cena política.