Temos escrito sobre o fim da era de Angela Merkel desde o verão de 2015, quando ela calculou mal o impacto da sua decisão de abrir as fronteiras aos imigrantes da Síria. Temos persistido neste tema após as eleições do ano passado..Merkel-Dämmerung (O crepúsculo de Merkel) voltou à agenda na semana passada, quando Volker Kauder, o seu aliado político mais próximo, foi deposto de presidente dos democratas-cristãos e da União Social Cristã da Baviera no Bundestag..A revolta dos parlamentares da CDU/CSU deixou a autoridade da chanceler alemã debilitada. Não pode haver dúvidas sobre como é vista a chefe de longa data do governo da Alemanha: ela passou claramente a sua plenitude política. Mas, por muito grave que tenha sido a queda política de Kauder, ela pode não ter qualquer impacto no momento da partida de Angela Merkel. Ela pode durar todo o mandato até 2021. Pode sair mais cedo, possivelmente para um dos dois melhores cargos em Bruxelas que ficarão vagos no ano que vem. Mas a CDU não vai empurrá-la para fora..Mais importante que o futuro da chanceler é o futuro do centro político da Alemanha. A tendência da política eleitoral alemã de favorecer grandes coligações acabou por fortalecer os extremos. Isso era previsível, foi previsto e está a acontecer agora..Em nenhum lugar a mudança na política alemã é mais visível do que na Baviera, onde as eleições estaduais devem acontecer a 14 de outubro. Em Munique, na semana passada, descobri que o sentimento geral era ainda mais pessimista do que sugerem as sondagens oficiais. Ouvi sugestões de que é mais provável que a CSU acabe perto dos 30% dos votos do que da média da sondagem mais recente que lhe dava 35%. Os sociais-democratas também estão em grande perda: o SPD está prestes a tornar-se outro pequeno partido naquele Estado. Os grandes ganhadores são os Verdes e a Alternativa para a Alemanha (AfD), o partido de extrema-direita. A AfD não se juntará a nenhuma coligação bávara em nenhum cenário, mas o seu efeito sobre a política bávara e alemã é inegável..Tal como o partido britânico da Independência do Reino Unido (UKIP), a AfD conseguiu influenciar e até definir a agenda política. Ao contrário do UKIP, tem uma influência indireta nas coligações. Devido à representação proporcional, são necessários apenas 15% ou 20% dos votos para a AfD tornar mais difícil os outros formarem uma coligação..Nas últimas eleições federais, apenas duas opções de coligação eram aritmeticamente possíveis. A grande coligação só surgiu depois da CDU/CSU, do Partido Democrático Liberal (FDP) - que não tem confiança em Merkel -, e dos Verdes não conseguirem chegar a acordo em relação a um programa..A grande coligação tem sido a alternativa perene da política alemã - acontece quando todos os outros caminhos foram esgotados. Mas as últimas sondagens a nível nacional dizem-nos que uma grande coligação pode não ser possível no futuro. As últimas duas sondagens dão à CDU/CSU e ao SPD juntos entre 43% e 45%, o que não é suficiente para formar uma coligação de dois partidos..A CDU/CSU e o SPD perderam apoio desde as últimas eleições federais. A AfD ultrapassou o SPD. O sistema político está a fragmentar-se. Mesmo uma coligação tripartida já não deve ser tomada como garantida. Se as tendências persistirem, a Alemanha poderá acabar numa situação em que todo o centro terá de se unir num governo para preservar uma maioria centrista. Isso seria um desastre político; a AfD e o Partido da Esquerda tornar-se-iam os partidos da oposição..Embora existam vários candidatos plausíveis para a sucessão de Merkel, não há ninguém com um plano para levantar a maldição que caiu sobre a política centrista na Alemanha. A CDU/CSU perdeu a direita desde que Merkel abriu as fronteiras, assim como o SPD tinha perdido a esquerda depois das reformas laborais de 2005..Não é por acaso que os líderes políticos dos três partidos da coligação estão a cambalear. O futuro de Merkel é agora um assunto de especulação às claras. Markus Söder, que assumiu como primeiro-ministro da Baviera durante o inverno, desfrutou de um breve estado de graça que terminou na primavera. Andrea Nahles gozou a sua breve popularidade depois de ter substituído Martin Schulz como líder do SPD. A única cola que mantém a grande coligação é o medo da mudança. Embora os membros do partido possam estar insatisfeitos com o atual conjunto de líderes, os possíveis sucessores com a coragem de organizar maiorias políticas em torno de novas ideias ainda não apareceram..Martin Schulz foi quem mais se aproximou. Tal como Emmanuel Macron, é um pró-europeu indefetível. Ele tinha boas ideias para reformar a zona euro e estava pronto para fazer um pacto com o presidente francês. Mas Schulz não se atreveu a fazer campanha pela UE porque as sondagens sugeriram que isso não lhe conseguiria uma vitória. Ele escolheu jogar pelo seguro e perdeu mesmo assim. O desaparecimento de Schulz é um aviso. A política alemã tornou-se avessa a riscos, receosa e entediante. Uma das razões para o florescimento da AfD é que o partido não tem nenhuma dessas características..© The Financial Times Limited, 2018