"Nem tudo são rosas". Como os precários da ciência protestaram contra o governo
A sessão de abertura do Ciência 2019, encontro que durante três dias reúne em Lisboa mais de quatro mil cientistas de todo o país, ficou hoje marcada por um protesto de cerca de 30 investigadores precários, que lançaram no ar balões cor de rosa a esvaziar-se, mas sem causar interrupções nos discursos.
Vestidos com t-shirts negras, os participantes no protesto levantaram-se primeiro durante a intervenção do ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, e encheram e largaram balões cor-de-rosa, que se esvaziaram rapidamente no ar com um ruído característico, no momento em que o governante falou na questão do emprego científico.
Já sentado, o grupo, repetiu depois a mesma largada de balões durante o discurso de António Costa, e ouviram-se mesmo alguns "ohs" de indignação na altura em que o primeiro-ministro mencionou os cinco mil contratos para investigadores celebrados ao abrigo Programa de Estímulo ao Emprego Científico, criado nesta legislatura.
Tal como Manuel Heitor já havia dito antes, António Costa reconheceu na sua intervenção que, nesta questão do emprego científico, o "trabalho não está concluído". O primeiro-ministro admitiu que, neste setor, o PREVPAP (Programa de Regularização Extraordinária de Vínculos à Administração Pública) foi insuficiente, e que "vai ser preciso criar novos mecanismos e fazer mais, e melhor".
Para os participantes no protesto, "ter um contrato que pode ir no máximo até aos seis anos, não é combater a precariedade, é apenas um paliativo", afirmou ao DN um dos participantes e promotores do protesto, Nuno Peixinho, da ABIC, a associação de Bolseiros de Investigação Científica. "A nossa ideia foi marcar uma posição e chamar a atenção para o problema", sublinha. "Viemos mostrar que nem tudo são rosas e que o discurso a este respeito tem sido muito vazio".
Os investigadores precários defendem que é preciso fazer mais para "implementar e valorizar as carreiras científicas" e, nesse sentido, defendem o "cumprimento efetivo da PREVPAP, e do decreto-lei 57", com a integração obrigatória dos investigadores precários nas respetivas instituições. "As universidades fizeram tudo para não cumprir a lei 57, e não lhes aconteceu nada ao não cumprirem a lei", acusa Nuno Peixinho, que é astrónomo e tem um contrato por três anos na Universidade de Coimbra.
Na sua sétima edição, o encontro Ciência tem este ano como convidado o Reino Unido, um dos principais parceiros de Portugal na ciência, no âmbito europeu. António Costa sublinhou, aliás, a sua "satisfação", pela participação daquele país no encontro, no ano em que, provavelmente, o Reino Unido sairá da União Europeia. "Portugal e o Reino Unido são parceiros e vão continuar a ser parceiros", frisou o primeiro-ministro.
Em números, o encontro Ciência 2019 salda-se na participação de mais de quatro mil cientistas de todo o país, incluindo uma delegação do Reino Unido, 637 comunicações orais em 121 sessões paralelas, 580 posters de estudantes de doutoramento, 50 demonstrações de projetos e ainda seis sessões plenárias que serão dedicadas a outras tantas efemérides científicas que este ano se comemoram, dos 500 anos da primeira viagem de circum-navegação, aos 50 anos da primeira alunagem pelos astronautas da NASA.
A Ciência Viva, parceira do encontro, participa igualmente na mostra, com sete projetos científicos de alunos desde o ensino básico ao universitário. Além disso, cada uma das sessões ao longo destes três dias serão apresentadas no início por jovens premiados no âmbito do Ciência Viva.
O programa detalhado do Ciência 2019 pode ser consultado no site do encontro.