Chamam-lhe velha senhora mas tem a juventude estampada no nome e mostra-se à vontade com os tempos modernos. A Juventus, vecchia signora do futebol italiano, vai mudar de emblema na próxima época e de forma radical: trocou o símbolo clássico (oval, com as cores bianconeri e o touro do brasão da cidade de Turim em destaque) por um logótipo minimalista e estilizado, com a letra J em destaque. Os adeptos mais conservadores ficaram revoltados. No entanto, este não é mais do que um capítulo da nova era do futebol global: "Cada vez mais, os clubes estão a adotar logótipos que possam projetá-los na modernidade, cortando com modelos de gestão de antigas direções e projetando-os para novos públicos, mais jovens", diz ao DN Paulo Reis Mourão, professor de Economia na Universidade do Minho. "Este novo logótipo é o símbolo do "modo de vida Juventus". A inovação significa progresso, sem esquecer quem somos. A nossa essência esteve e sempre estará em campo", declarou o presidente do clube, Andrea Agnelli, na apresentação do novo emblema. As reações dos adeptos estiveram longe da unanimidade. Mas, para Paulo Reis Mourão, estudioso da faceta económico do desporto-rei, este é um passo natural. "Vejo esta mudança como algo normal num quadro de modernidade. Os clubes tomam este tipo de iniciativas quando querem atingir um público mais alargado", aponta, lembrando que a Juventus já tinha alterado o emblema várias vezes no passado (dez nos últimos 60 anos, a derradeira em 2004). Contudo, nenhuma mexida foi tão drástica como esta. "Há uma leitura nova, na medida em que o brasão - que transporta uma ideia de nobreza, de clã, recuperando o simbolismo da Idade Média, de uma Europa feudal, da união de um local em redor da bandeira - dá lugar a um símbolo muito mais facilmente exportável no espaço mediático e no espaço moderno", descreve Reis Mourão. O objetivo de uma alteração deste género é claro: "Tem em vista a entrada nos mercados onde os clubes deixam de ser reféns do espaço [físico onde nasceram e têm sede]. Poucos estão interessados [apenas] no adepto local e projetam-se para públicos e audiências internacionais." Recentemente, At. Madrid e Manchester City também fizeram mudanças substanciais, embora não tão profundas, nos seus emblemas (o dos espanhóis só começa a ser utilizado em 2017-18). Os adeptos mais conservadores contestam a mudança - "a melhor maneira de arruinar uma história centenária", criticava um dos tiffosi desiludidos nas redes sociais -, mas ela está em marcha. "Obviamente, todos nós, que nos habituámos a apreciar uma marca, torcemos o nariz. Mas esta mudança vai ser assimilada e, a não ser que haja uma grande contrarreforma, não me parece que se regresse ao emblema anterior em breve. Acho até que outros clubes se inspirem e transformem os seus símbolos tradicionais em símbolos de exportação global", diz o professor. E em Portugal? Será que isso também vai acontecer em Portugal - onde, ao longo dos anos, Benfica, FC Porto e Sporting (este como maior ênfase) fizeram alterações mínimas e só clubes de escalões secundários como Gil Vicente, Campomaiorense e Santa Clara arriscaram mexidas substanciais (quase sempre associadas a mascotes animais e/ou à criação de sociedades anónimas desportivas)? Reis Mourão acredita que sim: "Quando olhamos para os três grandes, verificamos que já não estão presos a bandeiras e a símbolos de origem. A evolução aponta para que aqueles desenhos barrocos e elaborados sejam substituídos por símbolos simples, de desenho pouco elaborado, com uma ou duas cores predominantes." No fundo, esta será a derradeira etapa da afirmação do futebol-indústria, que os adeptos mais românticos abominam. "Os clubes já não estão presos aos valores do passado, ligados ao estádio e às ruas adjacentes: têm financiamento globalizado e audiências internacionais. De igual forma, como adeptos, também já não estamos presos a ver um espetáculo de domingo no campo pelado em frente à nossa casa, temos acesso a canais, maioritariamente pagos", onde se veem jogos de outros cantos do mundo, sublinha o professor universitário. É claro que, com a mudança, há sempre o risco de se afastar os fãs mais conservadores. "Um adepto envelhecido tenderá mais a desgostar-se do que um jovem. Contudo, goste mais ou menos, não será por isso que se vai afastar", defende Reis Mourão, admitindo que, caso a transformação não seja acompanhada dos sucessos desportivos habituais, ela possa transformar-se num tema de contestação. No caso da vecchia signora, lendas ligadas ao clube como Pavel Nedved, ex-jogador e atual vice--presidente - "é uma ideia fantástica, assim que vi aquele J gostei logo" - e Gianluigi Buffon, guarda--redes e capitão de equipa - "mostra-nos que a Juventus é uma marca global" -, são adeptos da transformação. Mas só o futuro pode confirmar se a moda veio mesmo para ficar.