Nella Maissa dá o último concerto aos 94 anos

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Música. O convite partiu da Casa da Música, no Porto, e a pianista acredita que esta será a última 'performance'pública. Durão Barroso associa-se à homenagem que hoje é prestada a uma figura notável da música portuguesa do século XX

Pianista toca ao fim da tarde (19.30) na Sala Suggia

Se Manoel de Oliveira é, aos 99 anos, o mais velho cineasta activo do mundo, com 77 anos de filmes atrás de si, Nella Maissa não lhe fica muito atrás: 94 anos e uma carreira iniciada em 1932, com a participação da então jovem italiana de 18 anos no II Concurso Chopin de Varsóvia.

Carreira que deverá ser hoje oficialmente encerrada, quando, por volta das 20.30, abandonar o palco da Sala Suggia da Casa da Música (CdM). "Foi a Anabela que tratou de tudo e os convenceu" - diz-nos, referindo-se a Anabela Baptista, assessora de imprensa do Palácio Foz. A intermediação surgiu de uma confissão: "Disse-lhe uma vez que queria muito conhecer a Casa da Música e que gostaria de tocar uma vez lá." Por isso, diz deste recital que é "a realização de um desejo", a "satisfação de um capricho". Da CdM, diz que "foram simpáticos" e fala da homenagem de hoje como "uma gentileza".

Diz-nos logo de seguida: "É talvez o último recital da minha vida", e manifesta um receio: "Deus queira que consiga chegar ao fim!..." Não por um qualquer insuficiente domínio técnico ou do programa, mas antes por algo de bem mais elementar: "Já quase não vejo e, nesta idade, há sempre problemas de saúde novos a aparecer..." Por isso, diz, "vou fazer o que posso" e pelas mesmas razões justifica o "programa pequeno, cerca de uma hora de música" que apresentará este fim de tarde.

As horas antes do recital passa- -las-á "a experimentar o piano e a altura do banco", como qualquer pianista. Mas no seu caso outros pormenores há que adquirem grande importância: "Quero testar as luzes que irão incidir sobre o palco. Porque se forem demasiado intensas, eu cego por completo." Mas não é só: "Vou ensaiar a entrada e fixar a distância que terei de percorrer até ao piano", pois, afirma, "ir sozinha ao piano, para mim já é uma complicação". Para simplificar processos, optou por "não fazer intervalo, para não ter de correr de um lado para o outro".

O programa que hoje leva ao Porto é bem ilustrativo do percurso de uma vida e reflecte tanto o seu gosto como as suas actuais possibilidades: três autores portugueses, dois dos quais do século XX. E, no final, a Fantasia em fá m, op. 49, de Chopin - "desejaria terminar com a Sonata 'Tempestade', de Beethoven, até por causa da estrutura do programa", reconhece, "mas não posso, por causa dos saltos na mão esquerda" requeridos por essa obra. Razão óbvia: "Como não vejo bem, às vezes sai certo, outras vezes não. E isso não pode ser..."

Antes do Chopin, ouve-se a Sonatina (estreada por Helena Sá e Costa, em 1942) de Armando José Fernandes (1906-1983), a Sonata n.º 3, em mib M, op. 9 n.º 1, de João Domingos Bomtempo (1775-1842) e a Sonatina Recuperada n.º 1 (obra estreada em 1961, por Maria Elvira Barroso) de Fernando Lopes-Graça (1906-1994).

Além da música, será ainda ouvida uma comunicação gravada de Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, a qual sublinhará a importância da contribuição de Nella Maissa, judia italiana feita portuguesa, para o enriquecimento do património musical português e europeu.

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