Negócio milionário. Slack e Salesforce prometem criar "o sistema operativo do trabalho"
É uma gigante tecnológica americana que reina no mercado das plataformas de gestão de relacionamento com os clientes (CRM) a nível mundial e que em 2020 cresceu 30% em clientes na Península Ibérica (dados divulgados num evento anterior da Salesforce Portugal). No entanto, está agora a ampliar as suas possibilidades com a compra milionária da ferramenta colaborativa Slack. Custou 27 mil milhões de dólares e o negócio, embora já assinado, só ficará concluído por completo já em julho.
Participámos numa mesa redonda com Bret Taylor, presidente e COO da Salesforce (que é membro do conselho de administração do Twitter e ex-CTO do Facebook), onde embora não fosse possível adiantar muitos pormenores sobre o que a Salesforce irá fazer com o Slack, as expectativas são elevadas.
Desde logo a possibilidade de rivalizar como nunca com a Microsoft (e o seu Office) na área de plataformas digitais em geral para empresas ganha dimensão teórica. Taylor rejeita comparações, mas admite "um grande entusiasmo com a união". "Conheço o fundador, Stuart, há mais de 10 anos e sei a visão que tem para o futuro do trabalho que se viu em ação como nunca durante a pandemia não só com o Slack, mas também com o Zoom".
O responsável admite que o que falta, para já, ao Slack "é a capacidade de chegar a mais gente, por ainda não ser conhecido pela maioria das pessoas e empresas". "Vive ainda muito das empresas tecnológicas e de jornalistas curiosos", adianta.
Trata-se de uma plataforma colaborativa de comunicação (mais focada no lado profissional) lançada em 2015 pelo canadiano Stewart Butterfield (que cofundou a rede social de fotos Flickr) e que envolve vários canais de conversação, organizados por tópicos, grupos privados de trabalho e mensagens diretas. Na prática, a ferramenta perfeita para tempos de trabalho remoto em pandemia tal como o Zoom foi para as videoconferências e ambas influenciaram grandemente as melhorias do último ano na plataforma Teams (da Microsoft).
No início da pandemia, em abril, tinha 12 milhões de utilizadores diários, incluindo 151 mil clientes com a versão paga do serviço, o que inclui quase metade das empresas do Top 100 da Fortune e, de acordo com a empresa, embora o Teams da Microsoft seja rival de peso, "70% dos 50 principais clientes do Slack usam o Slack ao mesmo tempo que o Office365 da Microsoft" (de que faz parte o Teams). A empresa garante ainda que a utilização do Slack reduz em média 32% dos emails e 27% das reuniões.
Um dos serviços mais populares e relevantes para a Salesforce chama-se Customer 360, uma plataforma que junta as várias áreas da empresa "numa visão 360 do que se passa" e, Bret Taylor admite que "combinar de forma mais integrada com o Slack será transformador para os clientes e para a indústria". O objetivo é claro e já tinha sido transmitido há uns meses, no início do negócio, pelo CEO da Salesforce, o famoso na indústria Marc Benioff e é repetido por Taylor: "a combinação das empresas vai ajudar a criar o sistema operativo para a nova forma de trabalho, dando hipótese às empresas de crescer e serem bem mais eficientes num mundo totalmente digital".
Dito isso, o COO da Salesforce admite que os escritórios não vão acabar, nem tão pouco as reuniões presenciais, mas "serão ajustadas às novas funcionalidades e realidade". Dá o exemplo das viagens constantes das equipas de vendas de empresas clientes da Salesforce: "vão acontecer bem menos porque percebemos que nem sempre são necessárias, só se se tira um valor extra disso".
A Microsoft não está a dormir e chegou a negociar em abril a compra da Discord, uma plataforma colaborativa mais usada para jogadores de gaming e entretenimento, mas o negócio terá caído porque a Discord estará a ponderar a entrada em bolsa e os 10 mil milhões de dólares oferecidos não terão convencido.
Taylor admite, no entanto, que a Salesforce não quer fechar o Slack apenas aos seus clientes. "Continuará a ser uma plataforma aberta [dando a entender que a versão gratuita limitada se irá manter] porque essa também é uma das mais valias do Slack", explica. Além disso, a integração já possível com ferramentas da Microsoft como Outlook ou Teams "é para continuar porque isso facilita a vida a todos".
O responsável dá ainda dois exemplos que mostram o impacto da utilização da plataforma: "todo o negócio que fizemos para adquirir o Slack foi feito num canal de... Slack, existia a área dos advogados para questões legais, dos líderes, etc"; "depois fizemos durante a pandemia a nossa Cyberweek que costuma ser presencial toda pelo Slack e incluiu além de funcionários também clientes e parceiros, numa coordenação em simultâneo e em tempo real notável".
Uma das vantagens, prevê Taylor, é que "as empresas podem usar esta ferramenta simples mas inovadora tanto para os colaboradores como para interagir com os clientes de forma simples e imediata e bem mais organizada e eficiente do que o email". "Há grandes oportunidades em impactar de forma positiva as relações com colaboradores e clientes até em termos de experiência de utilização", garante.
Apesar de estarem fãs do trabalho remoto, "que veio para ficar", os vários escritórios da empresa já começaram a abrir em 36 locais, incluindo Londres, Roma, Tel Aviv e Dublin. "Vamos continuar a apostar nos hubs locais, como o de Portugal, mesmo que as pessoas passem agora a poder trabalhar vários dias de casa, mas o formato dos escritórios em si será diferente com novas funcionalidades e formas presenciais de interagir", avança o responsável.
Certo é que ainda falta levar as novas ferramentas a muita gente: "nesta nova forma de trabalhar há inovação incrível em colaboração (é o que chamamos de 1+1 = 7) e são tempos bem diferentes do que podíamos prever em 2019". "Ninguém estava preparado para o vimos em 2020, com tanta gente a entrar no mundo digital, e agora faz sentido ter um quartel-general digital da empresa, com conversas mais rápidas e isso tem um valor tremendo até para criar um novo ecossistema que potencia uma nova geração de empresas", explica Bret Taylor.
Sobre o negócio em si, "a Salesforce está bem e recomenda-se", com crescimento anual de 24% e o lançamento já durante a pandemia de novidades "que têm sido um sucesso". O exemplo mais óbvio é a Work.com, plataforma para ajudar empresas de maior dimensão ou governos a regressar de forma estruturada ao trabalho.
"Permite gerir turnos de forma eficiente, saber quantas pessoas estão na organização e se aparecer alguém com covid saber logo que pessoas devem ser isoladas", explica, admitindo que a utilização do chamado low code (código mais simples, área da qual a portuguesa OutSystems é um dos líderes mundiais) tem sido relevante para "entregar software capaz mais rapidamente". A mesma plataforma está já a ser usada para as vacinas, para saber quem está vacinado.