Negar 'habeas corpus' é caminho para a barbárie - magistrado brasileiro Gilmar Mendes

Lisboa, 23 abr 2019 (Lusa) -- O magistrado do Supremo Tribunal Federal do Brasil Gilmar Ferreira Mendes afirmou hoje que negar um 'habeas corpus' a quem tem direito "é o caminho para a barbárie" e defendeu um regresso à "ortodoxia" das instituições.
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Gilmar Ferreira Mendes, que votou a favor do 'habeas corpus' para evitar a prisão do ex-Presidente Lula da Silva, depois da condenação em segunda instância, até ao trânsito em julgado da sentença (esgotados todos os recursos), afirmou no VII Fórum Jurídico de Lisboa, num painel sobre relações institucionais entre poderes, que negar este direito "é um caminho para a barbárie".

Por isso, acrescentou ser preciso "voltar para a ortodoxia" e impedir "um tipo de vilipêndio" que se tornou comum e "é repetido numa sanha que nos envergonha enquanto processo civilizatório".

Já em declarações à Lusa, o ministro do Supremo Tribunal Federal explicou que votou a favor do 'habeas corpus' por considerar que ainda há "discussões técnicas" em torno de questões legais que "têm de ser esgotadas" até ao trânsito em julgado.

Lula da Silva foi condenado em primeira instância na pena de prisão de nove anos e seis meses, no âmbito de um processo da Operação Lava Jato, em que era acusado de receber um apartamento de luxo à beira-mar da construtora OAS em troca de favorecimento de contratos dessa empresa com a petrolífera estatal brasileira Petrobras.

Em janeiro de 2018, a primeira condenação, num processo conduzido pelo juiz Sérgio Moro, atual ministro da Justiça brasileiro, foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, que aumentou para 12 anos e um mês a prisão do antigo chefe de Estado.

Para Gilmar Ferreira Mendes "há uma criminalização da política", salientando, no entanto, que "não há salvação na democracia fora da política".

Questionado sobre eventuais riscos para a democracia no Brasil considerou que é necessário "voltar a uma normalidade institucional", inclusive a nível do discurso.

"Não pode haver ameaças, não pode haver incentivo a turbas na internet. Devemos seguir a ortodoxia da separação dos poderes, não devemos amedrontar juízes, não devemos amedrontar legisladores", declarou, referindo que o contrário será seguir "um caminho fácil para a desinstitucionalização", o que "não é bom".

Na palestra de encerramento do fórum, Gilmar Ferreira Mendes destacou ainda que o "ativismo exagerado" não é bom "para a magistratura", que deve julgar os processos "com a sobriedade necessária".

O magistrado brasileiro disse também que a intervenção do que apelidou de "partido da polícia" não é normal e resulta do "engendramento de um nazifascismo" que "nada tem a ver com práticas democráticas" e deve ser denunciado.

"É preciso que alguém diga isso de forma clara, é preciso conter os abusos", alertou Gilmar Ferreira Mendes, acrescentando que a falta de limites gera milícias e que "num Estado de direito não há soberanos", pois todos os grupos estão sujeitos à lei.

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