Não podemos descurar a nossa saúde ocular
Vivemos tempos diferentes, já todos o ouvimos e sentimos. Nunca na história recente, o comportamento individual foi tão relevante para o nosso destino coletivo. Mas o que não podemos esquecer é que essa atenção tem também de ser muito dirigida à nossa própria saúde. O contexto de pandemia, com o confinamento daí resultante, criou um receio e uma inibição significativa naquele que era e deve ser o normal acompanhamento da situação clínica de cada um de nós.
Houve centenas de milhares de consultas de oftalmologia adiadas - e cirurgias não realizadas - essencialmente pelo receio das pessoas de se deslocarem ao Hospital, mas também porque tivemos de nos reorganizar, para responder a esta emergência de saúde pública. Sem dúvida que esta perturbação irá trazer consequências evidentes na saúde visual e qualidade de vida da população.
Em oftalmologia, esta questão é particularmente relevante, já que algumas doenças têm obrigatoriamente de ser diagnosticadas tão cedo quanto possível, carecendo muitas vezes da instituição atempada de terapêuticas adequadas. Destas doenças destacam-se com grande evidência, de acordo com as estatísticas portuguesas, a Diabetes Ocular, a Degenerescência macular e o Glaucoma.
A Diabetes Ocular consiste na afetação da integridade da circulação da retina, podendo atingir todos os diabéticos que tenham a sua doença de base descompensada e não controlada durante anos. Pode provocar hemorragias dentro do globo ocular e lesões da zona central da retina, a mácula, conduzindo a perdas de visão muito profundas que podem ser definitivas.
Por seu lado, a Degenerescência Macular atinge a zona mais relevante da retina, de que atrás falamos, a mácula, podendo existir uma maior tendência genética, assim como a associação a fatores comportamentais ou de consumo de medicamentos, condicionando também perdas graves da nossa visão central.
Finalmente o Glaucoma, muito silencioso, em que a elevada pressão ocular, não diagnosticada, conduz ao longo dos anos a lesões do nervo óptico, também com graves consequências no nosso campo visual.
Todas elas podem determinar lesões irrecuperáveis na visão, e podem ser muito silenciosas e assintomáticas no início, podendo apenas ser identificadas por um médico oftalmologista que, pela observação direta e pelos meios complementares de diagnóstico ao seu dispor, determina as medidas cirúrgicas e terapêuticas para o controlo da progressão da doença.
O acompanhamento presencial é, por isso, crítico para evitar danos irreversíveis na visão, e não deve ser adiado ou evitado.
Também a cirurgia de catarata - embora não urgente - tem um impacto enorme na qualidade de vida dos envolvidos, sendo muitas vezes um impedimento relevante para a execução de atividades básicas de vida diária e até da capacidade de cuidar de alguém.
Atualmente, para assegurar a maior segurança, as estruturas de saúde cumprem rigorosos protocolos de proteção, de acordo com as determinações da Direção-Geral da Saúde, podendo mesmo afirmar-se que as estruturas assistenciais são locais bastante seguros com um risco reduzido.
Por tudo o que já foi atrás referido é claro que, mesmo em contexto pandémico, não podemos descurar a nossa saúde individual. A nossa solidariedade coletiva começa pelo cuidado que temos connosco próprios - e essa deve ser uma preocupação sempre presente. Só assim podemos garantir que reduzimos a pressão sobre as estruturas de saúde e que estamos disponíveis para ajudar quem mais precisa de nós.Não será esta uma imensa manifestação de generosidade? Está ao nosso alcance.
Oftalmologista no Hospital CUF Tejo e na Clínica CUF Almada