Não nos tirem as leguminosas!

Estamos a construir um novo e discernido edifício em torno das leguminosas secas. Os grãos Monte da Silveira Bio inspiram a confiança necessária para o regresso tranquilo e inevitável ao trilho saudável.
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A história da alimentação humana está longe de ser uma mera linha temporal com uma sucessão lógica e ordenada de acontecimentos coerentes entre si. Estamos felizmente a construir todo um novo e discernido edifício em torno das leguminosas secas, de que nos afastámos para instalar carne, peixe e outras "riquezas". Os grãos Monte da Silveira Bio inspiram a confiança de que precisamos para o regresso tranquilo e inevitável ao trilho saudável.

É difícil conseguir a necessária distância para entender corretamente o momento da história da alimentação que estamos a viver. De certa forma, porque tudo se passou demasiado depressa para que possa criar uma base durável. O grão a que chamamos grão-de-bico alimentou a humanidade ao longo de vários milhares de anos, é indissociável das gastronomias mediterrâneas e quando ingerido juntamente com um cereal como o arroz, constitui o que se chama proteína completa. Contém os aminoácidos necessários e suficientes para a alimentação humana. Processámos caldos e sopas de forte mantença com massas, legumes e raízes, e da maravilhosa criação do pão percebemos as vantagens do petisco - conduto - a acompanhá-lo. Absorvemos e integrámos os feijões, o milho, hortícolas e tudo o mais que veio do Novo Mundo.

Nalgum momento do processo evolutivo, contudo fizemos opções menos felizes, apesar de inteiramente justificadas. Ter carne ou peixe a todas as refeições é prática muito recente e no fundo acontece porque aspirámos à vida de abundância, na míngua nunca vimos virtude. Mas com isso passámos uma fatura muito pesada às leguminosas e desequilibrámos a nossa mesa.

João Valente reserva no seu Monte da Silveira junto a Castelo Branco cerca de 40 ha a vagens destinadas à alimentação humana - grão (2,85 euros/kg), chícharo (5,90 euros/kg), feijão-frade (5,90 euros/kg), feijão catarino e feijão vermelho (5,90 euros/kg), entre outros -; animal - ervilhaca, tremocilha, luzerna, por exemplo -; todas são consideradas culturas de cobertura e de rotação, servindo para fixar azoto na terra e inibir o desenvolvimento de infestantes.

Tudo é biológico e produzido com o mesmo carinho e controlo, assim como tudo faz parte de um grande projeto de João Valente, um dos nomes que contam na nova agricultura portuguesa. Sempre em ligação com o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) e apoiado em produtores de boas sementes como é o caso da Sementes Vivas, o empresário mantém as suas culturas vigiadas de muito perto, com os cuidados que implicam e pedem. Por tabela, chegou onde muito poucos chegam, em termos de qualidade, sabor e comportamento culinário e nós é que beneficiamos com isso.

Descoberto que foi pela Mercearia Criativa, em Lisboa, foi pela mão da responsável Rita Duarte Ferreira que conheci e experimentei as leguminosas de que falamos.

Confesso desde já a minha total perplexidade com a qualidade e o rendimento de sabor do feijão-frade, criou uma nova dimensão no meu universo de possíveis. A semente veio de um produtor da Lardosa e deu-se muito bem no Monte Silveira. É autóctone, não pertence ao grupo das leguminosas que nos chegaram no século XVII do outro lado do mundo, e é estruturante na nossa alimentação. Entra bem em sopas, faz um arroz fantástico e integrado por exemplo em pataniscas é uma delícia. A sua próxima salada fria de atum, ovo e feijão-frade vai impressionar, pela predominância e riqueza do sabor.

O rechonchudo e carnudo chícharo integra bem sopas com couves e outros legumes, e adora carnes grelhadas. É parente do tremoço e neste caso é particularmente inspirador. O imaginário coletivo situa-o muito e bem nos caldos de cozedura lenta dos potes de ferro clássicos, como base de sopa da pedra e afins. O feijão vermelho produz sabor e deixa-se impregnar facilmente nos pratos de tacho da nossa tradição, caso da feijoada de carnes, arroz de feijão, e as soluções mar-terra consagradas no receituário de pescador com que sonhamos tanto. Quanto ao grão-de-bico e às muitas declinações culinárias que lhe conhecemos, há que experimentá-lo pelo menos uma vez com arroz carolino simples. Ao fazê-lo, estamos a religar-nos com o passado mais distante e ao mesmo tempo a perceber que se tudo falhar teremos sempre o nosso grão para nos sustentar.

Mercearia Criativa
Av. Guerra Junqueiro 4-A
1000-167 Lisboa
Tel.: 218 485 198
Hor´ario: 10h00-19h00
Fecha: domingo

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