"Não leio críticas. A minha preocupação é o público"
O que é que vai ser este A Canção de Lisboa?
É um olhar sobre o Portugal dos dias de hoje. Posso dizer que se junta aqui um elemento político, que fala um bocadinho do Portugal de hoje, do Portugal que atravessa uma fase complicada, da recuperação, da esperança... Isso está lá presente. Não deixa de ser a história do Vasco Leitão, que vive em Lisboa à custa das tias e que se faz passar por médico. Isso mantém-se, mas os contornos são outros. Há novidades do Brasil, há dois personagens brasileiros no filme. Há um ator russo, uma atriz espanhola... É aquilo que Lisboa é hoje, também, cheia de gente de várias origens. Por outro lado, a história mantém a traça mais conservadora, de narrativa linear. Não é uma comédia "em esteroides" como era O Pátio das Cantigas - aquilo era um género dentro de um género, era um devaneio. E correu muito bem. Aqui vamos mais pela referência das comédias francesas, é um filme mais charmoso, que mostra uma Lisboa mais charmosa. Não é bairrista, mostra uma Lisboa muito sofisticada. Acho que é também um bom cartão de visita da cidade, não só para cá como para o Brasil, onde o filme eventualmente também será distribuído.
O espetador não deve ir à espera de um remake?
É um remake na medida em que é a história do Vasco Leitão, estudante de medicina, que engana as tias a dizer que já é médico. Essa é a sinopse, que é a mesma. Mas aquele é um filme, este é outro. Não é para fazer igual, não é para tentar imitar. Estamos a refazer uma história, com uma visão diferente, com pessoas diferentes. É uma comédia de enganos, em que toda a gente engana toda a gente, toda a gente anda a mentir, isso mantém-se. Acho que mantemos essa energia do filme, que é a única coisa que para os dias de hoje faz algum sentido, porque tudo o resto está desatualizado... Não é pelo lado técnico que vamos olhar para estes filmes porque desse ponto de vista são fracotes. O John Ford nesta altura fazia obras primas, nós andávamos a fazer filmes com quadros de revista...
Mas não teme comparações?
O que quero é que o filme transmita essa alegria [do original de 1933], é um filme para a família, é um filme para toda a gente. Enquanto autor tenho isso muito presente, faço isso com perfeita consciência. Sei que estou a trabalhar para todas as idades, é isso que queremos, é essa a premissa. É um filme de encomenda, há aqui um produtor, com objetivos, e eu quero cumpri-los.
Este filme é uma estreia para si...
Nunca pensei que este fosse ser o meu primeiro filme. Venho de uma ficção de linha muito mais dramática, venho do teatro, comecei por ser ator, depois encenador, depois comecei a dirigir e a escrever. E a minha linha é quase totalmente dramática. Não enquanto pessoa, que aí sou muito palhaço. Mas nunca pensei que me estreasse a fazer um filme com uma comédia. E muito menos esta. Mas não estou preocupado, tenho muita confiança no que faço. Não estou intimidado. Sei que, em última análise, as pessoas que forem de peito aberto vão-se divertir imenso. Os que forem contra vão sempre ficar contra. Sei que houve alguma resistência inicial de alguns puristas, é normal, mas quero é que as pessoas vejam o filme e se divirtam.
Os filmes anteriores tiveram críticas muito duras.
Não sei como é que hei de responder a isso, não dou assim tanta importância à crítica. Não leio críticas, nem às coisas que eu faço. Eu tenho uma relação com o público, preocupa-me saber o que é que as pessoas gostam. A minha preocupação, para um projeto como este, é o público. E não entro em diálogos de comparação, quando começamos a comparar coisas... Não é para comparar nada, não podemos comparar, passaram quase 90 anos. Este filme é um olhar alegre, feliz, sem ser idiota, com muita ironia, sobre nós portugueses, sobre a nossa forma de pensar, a nossa forma de ser. É um retrato do Portugal de hoje, com muita ironia. E algum atrevimento.