Não fechem a porta
É evidente que o regime de atração de residentes estrangeiros e fomento do regresso a Portugal de profissionais qualificados, por mais impactos positivos gerados, também criou pressões que devem ser ponderadas. É razoável afinar os instrumentos, analisar os excessos, calibrar as políticas para cumprir os interesses equilibrados e globais do país.
Então, por que não melhorar o atual modelo de incentivos aos residentes não-habituais? Havia tanto para fazer, antes de cancelar um programa-bandeira que ajudou a revitalizar a perceção internacional do país. Podia-se terminar os benefícios a pensionistas, mantendo apenas para quadros de alto valor acrescentado, que manifestamente nos interessam. Podia-se encurtar o horizonte temporal das vantagens e reduzir os ganhos em taxas de impostos. Podia-se direcionar as vantagens para quem se fixar no interior, que obviamente precisa de sangue novo. Podia-se relacionar os benefícios a conceder com contrapartidas adicionais em valores de investimento e criação de postos de trabalho. Podia-se considerar especialmente os profissionais portugueses que estão fora e queiram voltar - e como precisamos destas energias para contrabalançar a fuga de cérebros jovens.
Infelizmente, faltou empenho para estudar a fundo as questões. Faltou ambição para desenhar soluções que compitam bem com outros países europeus, mais ricos do que nós, e que estão ávidos por atrair estes grupos socioeconómicos. Em vez de aperfeiçoar a nossa oferta, indo à luta, cá na terra seguiu-se o caminho mais preguiçoso: encerrar o programa. Passando a mensagem externa de que está tudo mal e não há nada a aproveitar. Parecemos mesmo um país que nunca sabe bem para onde quer ir. Este cancelamento foi a vitória do populismo, dos velhos preconceitos nacionalistas, da voragem ideológica esquerdista.
É pena. Ficaremos a perder. Teremos menos atividade económica, menos projetos interessantes, menos dinâmica nas nossas cidades, menos investimento na reabilitação do património, menos diversidade cultural, menos efeitos multiplicadores, e, já agora, menos receitas fiscais. Passaremos a imagem de um destino incerto, ziguezagueante, que escancara as portas quando está de mão estendida e amua logo que as coisas começam a correr bem. Não são bons cartões-de-visita para o mundo atual. Vivemos num contexto global hipercompetitivo, transparente, atento aos incentivos, e onde a consistência é um ativo determinante (veja-se o exemplo inglês, onde o regime non-dom, não-domiciliados, existe desde 1799). Por todas estas razões, e porque (re)construir uma reputação internacional dá trabalho e demora tempo, valeria a pena refletir com serenidade, estudar alternativas racionais, escolher caminhos moderados e arrepiar caminho. Ainda vamos a tempo.
Portugal tem de consolidar o posicionamento de país interessado no talento. Temos de apostar, e dobrar a aposta, e deixar claro ao mundo que estaremos sempre a apostar nos eixos da qualificação, do conhecimento, do digital, da inovação. Não devemos afastar-nos dessas linhas. Temos de continuar a ser generosos para com os imigrantes, previsíveis para os investidores, curiosos perante os estrangeiros, amigos dos empreendedores. Temos de assumir esta maneira de estar arejada, largando as vistas curtas do "orgulhosamente sós" e os votos de pobreza e inveja que continuam a limitar a nossa sociedade. Temos de ser invariavelmente abertos ao mundo. Não por necessidade, mas por opção. Não para captar fundos nos momentos difíceis, mas para prosperar a médio prazo. Não apenas por razões económicas, mas por visão cultural. Não por taticismo, mas por desígnio estratégico.
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