Na turbo vela, quanto maior é a velocidade, maior é o silêncio
O que acontece quando um catamarã da Extreme Sailing Series começa a voar? Uma espécie de silêncio. Apenas um silvo agudo, elétrico, das duas lâminas (patilhão e leme) que cortam a água e permitem manter o controlo do barco.
Os dois cascos perdem contacto com a água, içados pelos patilhões em forma de J, e o que sobra é o vento e o tal silvo. E o vento, esse, passa só a sentir-se de frente, gerado pelo movimento veloz da embarcação, como se fôssemos com a cabeça de fora num carro a alta velocidade. A força G que nos empurra para trás faz-se sentir.
O DN experimentou velejar no (estreito) porto de Hamburgo a bordo de um barco tripulado por uma das mais experientes equipas que competem na Extreme Sailing Series (ESS, uma quase Fórmula 1 da vela), o SAP Extreme, em que o homem da proa é o português Renato Conde, provavelmente o mais experimentado velejador português na elite da vela internacional. Uma experiência radicalmente diferente da da véspera, no barco da equipa portuguesa Sail Portugal, só há quatro corridas no terreno e ainda a aprender a manejar o sistema que neste ano foi estreado nos barcos da ESS, o foiling - sistema que permite aos catamarãs elevarem-se às vezes quase dois metros acima da água, proporcionando velocidades que podem ser o triplo da do vento.
No SAP Extreme, a experiência da equipa e o entrosamento entre os seus cinco velejadores permitem manobras bastantes mais rápidas e bruscas do que no Sail Portugal, movimentos arriscados de quase colisão com concorrentes (estão sete equipas na água), o catamarã de dez metros de comprimento (e um mastro de 16,5 metros) a usar muito mais intensamente o sistema de hidroplanagem - e a tripulação a puxar muito mais pelos músculos (na Taça América a preparação física já é equivalente à dos jogadores de futebol americano).
O canal onde as corridas se disputam faz que as aproximações aos muros que o marginam se façam a velocidades alucinantes - fazendo o tripulante convidado pensar se está mesmo tudo sob controlo ou não. Está, mas às vezes não. Ontem, um velejador da Red Bull foi cuspido borda fora, algo que nos códigos marinheiros não fica nem no currículo (há os que dizem que se um marinheiro cai ao mar é porque estava a mais a bordo). E às vezes o vento cai subitamente ou há manobras que correm menos bem, podendo provocar, por exemplo, o radical nose dive (afocinhamento) que se vê na fotografia, na circunstância da equipa portuguesa (que, sem o orçamento das outras, faz os possíveis e impossíveis para manter sem um risco a integridade física do seu catamarã).
Este é um desporto que, pela velocidade que adquiriu, se tornou fisicamente perigoso para os velejadores e, por maioria de razão, para os convidados que entram nos barcos. Antes de embarcar, cada convidado tem de assinar uma declaração em que no essencial se torna responsável único por tudo o que de errado eventualmente lhe possa ocorrer na experiência. É obrigatório o uso de capacete, de colete salva-vidas e de luvas, além de um macacão impermeável e sapatos apropriados. Através de um pequeno filme são explicadas regras mínimas de segurança. Basicamente: ficar quieto no sítio que lhe for determinado e seguir as instruções da tripulação em caso de acidente. As corridas são acompanhadas por pneumáticos com motores de grande potência, prontos para qualquer eventualidade.
Na regata que o DN fez, o SAP disputou a vitória com a equipa do Alinghi, que venceu (como em seis das sete corridas de ontem; a outra vitória foi para o SAP). A equipa lusa, Sail Portugal, capitaneada por Diogo Cayolla, um antigo velejador olímpico, continua em penúltimo (sexto) lugar na geral, só à frente do Land Rover BAR. Apesar disso - e até do vento mais forte - o seu desempenho ontem subiu face aos dias anteriores. Conseguiu numa das sete regatas um 2.º lugar.