Desde 2017 que a freguesia de Marinha das Ondas, no concelho da Figueira da Foz, é um verdadeiro caldo multicultural. Os primeiros imigrantes chegaram nessa primavera, para trabalhar na empresa Lusiaves, e desde então foram ocupando as casas desabitadas. Hoje, mais de 10% da população é constituída por imigrantes do Nepal, da Índia e do Bangladesh. Serão agora mais de 400, homens e mulheres, na sua maioria famílias jovens, sendo que "já nasceram cá mais de 30 bebés", conta ao DN Isabel Cordeiro, uma das mentoras da escola do ensino de português, que muito tem contribuído para a integração desta comunidade. Vai para cinco anos que Isabel percebeu que era preciso fazer alguma coisa. Funcionária da mesma empresa onde trabalham, sabia que estavam a chegar com as famílias mas não imaginava as dificuldades de integração. "Só o percebi quando um dia, através de uma menina nossa conhecida, soube que as crianças, na escola, não interagiam com as outras, por causa da língua... e foi isso que me fez despertar para as mães, para os pais"..O projeto acabou por nascer exatamente há cinco anos, em março de 2017. "O objetivo é ensinar a língua portuguesa aos imigrantes asiáticos que vieram trabalhar na nossa freguesia. Tal contribuiu também para a sua integração na comunidade e por isso começaram a trazer as suas famílias. Além disso, alguns conseguiram obter a nacionalidade, porque frequentaram cursos de certificação em língua portuguesa", conta ao DN Isabel Cordeiro, enquanto recorda que, ainda naquele sábado, ligou para Dulce Pedrosa, uma amiga que era professora de português, e foi uma peça fundamental neste projeto. A elas juntaram-se Fernanda Jordão e Vera Parracho. Estava formado o quarto fantástico que haveria de liderar uma iniciativa que começou de forma empírica, mas que acabou por se tornar num caso sério, e num exemplo de integração, sobretudo..Não tardaria para encontrarem um espaço. Isabel e as amigas falaram então com os restantes membros da Associação Cultural Recreativa e Desportiva Marinhense, que acabou por ceder as instalações. No salão, outrora dedicado a festas e bailes, agora a música era outra.."Infelizmente veio a pandemia e tivemos que interromper o nosso projeto", revela Isabel Cordeiro, enquanto acrescenta que estas quatro centenas de imigrantes "estão bem integrados, os filhos frequentam a escola de acordo com o seu nível de escolaridade, e têm um percurso escolar regular".."As aulas eram dadas ao sábado, pelas 17h00, primeiro no salão da Associação Cultural Recreativa e Desportiva Marinhense e posteriormente no Centro Escolar da Marinha das Ondas", conta Isabel, que ainda hoje se espanta quando recorda a quantidade de gente que apareceu logo no primeiro dia.."Pensámos que iriam aparecer meia dúzia de pessoas, apareceram 50". "Sempre foram aulas abertas a todas as pessoas que pertencessem à comunidade imigrante, porque o objetivo era não excluir ninguém. As maiores dificuldades estavam relacionadas com a falta de espaço, porque todas as semanas apareciam mais pessoas", adianta Isabel Cordeiro, que sublinha o apoio quer da Associação, quer da empresa onde quase todos eles trabalhavam, que forneceu material didático.."Depois, à medida que o projeto foi crescendo, tivemos o apoio da Câmara Municipal da Figueira da Foz"..Numa altura em que estão a chegar à região alguns refugiados ucranianos, o grupo de voluntárias já imagina como poderá também integrá-los. "Pensamos haver condições para dar continuidade ao projeto, que será alargado a eles também, tendo sempre como objetivo ensinar a língua portuguesa e contribuir para a inclusão social". A forma como irá decorrer dependerá do número de participantes, do espaço existente e da disponibilidade de cada um. "É um projeto que não tem nenhum financiamento e depende unicamente do trabalho voluntário e da colaboração das entidades públicas e privadas que o queiram fazer", sublinha Isabel Cordeiro..O projeto tem dado nas vistas em toda a região. Recentemente, foi distinguido pela Associação Cívica Nova Polis, da Figueira da Foz, com o prémio Natércia Crisanto, na categoria "Sociedade Civil", De acordo com a associação, o mesmo revela "um espírito de alerta para com uma franja da população naturalmente fragilizada"..Na hora de entregar esta distinção, a Nova Polis considera que a iniciativa, para além de agilizar desde logo o dia a dia daquela comunidade, com o conhecimento da língua portuguesa, "contribui para o processo de integração e a não discriminação de uma franja da população residente na freguesia. É uma ação de inclusão social num processo de modelo coletivo de cidadania"..dnot@dn.pt