Mr. Turner

A crítica ao último filme de Mike Leigh.
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JOÃO LOPES (classificação 2/5)

Retrato de um pintor

Pode dizer-se que este é um filme que, de alguma maneira, nos compele a escolher entre duas "tendências" do próprio Mike Leigh: de um lado, as crónicas realistas, mais ou menos contaminadas pela comédia, sobre o tempo presente (Um Ano Mais, Um Dia de Cada Vez, etc.); do outro, os exercícios de "reconstituição" histórica a que pertence, precisamente, Mr. Turner. Mesmo preferindo a primeira vertente, importa dizer que o retrato de J. M. W. Turner (1775-1851), apesar da sua cedência a um certo determinismo "psicológico" típico de telefilme, possui a sofisticação de produção dos grandes estúdios britânicos, devidamente apoiada numa galeria de competentes intérpretes em que se destaca, necessariamente, Timothy Spall na personagem de Turner (não sendo arriscado prever uma nomeação para o Óscar de melhor actor).

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FLÁVIO GONÇALVES (classificação 2/5)

Imaginado no nosso presente, Turner vive preso ao seu tempo

Virando as costas ao recato e à concentração de "Um Ano Mais" (2010), Mike Leigh está de volta com toda a pompa fingida do filme de época inglês. Num exercício de reconstituição ficcionada da vida do pintor William Turner, o realizador preferiu claramente filmar o artista (interpretado por Timothy Spall) no seu quotidiano problemático, em contacto com uma sociedade à qual não pode escapar.

Mr. Turner contesta assim a interioridade romântica ao optar por um mostruário dos "segredos e mentiras" da biografia do pintor, organizado por um dedicado trabalho de atores. Trata-se, porém, de um tempo fantasiado neste nosso presente, o que desmascara o psicologismo para onde o filme escorrega. Em dados intervalos, Mike Leigh chega mesmo a fazer de conta que é Turner - e é aqui que contradiz o seu ideário realista, revelando-o insuficiente.

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NUNO CAMACHO (classificação: 3/5)

Turner filtrado pelo olhar sem ilusões de Mike Leigh

Mike Leigh faz neste biopic o que muitos autores de génio fazem com este género: aproveitam-no como espelho multifacetado de si mesmos. Porque fazer biografia de um ponto de vista meramente objetivo, exterior, sem pontos de contacto com o carácter do biógrafo, é trabalho para espíritos medianos e burocráticos. Daí que Mr. Turner seja também um autorretrato do cineasta (mas feito com inteligência e subtileza). Longe de ser um filme "académico", Mr. Turner é, pelo contrário, uma visão muito pouco ortodoxa de J.M.W. Turner (1775-1851). Fugindo aos estereótipos da figuração dos pintores no cinema (que geralmente se integra no que o crítico e historiador do cinema Mark Cousins denomina "realismo romântico fechado"), Leigh dá-nos um Turner (encarnado por Timothy Spall) que é um homem dececionantemente comum, e socialmente quase selvagem, mas com um modo peculiar de "filtrar o mundo".

[youtube:Tn4zSR_5ioI]

Ficha de filme:

Mr. Turner

Realizador: Mike Leigh

com Timothy Spall, Paul Jesson, Dorothy Atkinson

2014

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