Morte não influenciará eleições e futuro próximo do país
"Julgo que desaparece uma figura política que teve um peso específico na sociedade guineense, mas este desaparecimento não tem consequências num futuro próximo do país", disse à Lusa Fernando Jorge Cardoso, investigador do Instituto Marquês de Vallê Flor (IMVF).
O ex-Presidente da Guiné-Bissau morreu hoje devido a doença cardíaca, disse à agência Lusa fonte próxima do ex-chefe de Estado, que adiantou que o corpo de Kumba Ialá se encontra em câmara ardente no Hospital Militar de Bissau.
"Estou convencido que (a sua morte) não irá influenciar as eleições gerais de 13 de abril (na sequência do golpe de Estado militar a 12 de abril de 2012)", disse o economista são-tomense Armindo Espírito Santo, que tem várias obras sobre os países africanos ao sul do Saara.
"O futuro político do país estará mais ligado ao que vai acontecer nas próximas eleições legislativas e presidenciais e à capacidade e inteligência política que os novos líderes demonstrarem na tarefa de gestão da passagem das forças armadas para os quartéis (...), sublinhou Cardoso.
Para o investigador do IMVF, "os líderes políticos são chamados novamente a resolver um dos principais problemas daquele país, a incapacidade de distinguir entre a vida política pacífica e a intervenção das forças armadas na vida política ativa do país".
"Isto tudo se liga à capacidade que os novos líderes deverão ter, com a ajuda da comunidade internacional, na contenção e reflexos do narcotráfico sobre a vida do país", complementou.
"Para a sociedade guineense, penso que provavelmente será um benefício para a democracia", disse Armindo Espírito Santo.
O investigador são-tomense diz que esta situação "irá conduzir a uma maior estabilidade, uma vez que Kumba Ialá era visto como um foco permanente de tensão na Guiné-Bissau".
"Estava envolvido em situações obscuras que ocorreram na Guiné-Bissau nos últimos tempos, os golpes de Estados, a instabilidade política e social, a sua ligação aos grupos balantas e a proeminentes figuras dentro do Exército, tudo isso tinha a ver com a sua figura, que era controversa", acrescentou o economista.
Espírito Santo disse que o ex-Presidente era carismático, polémico e "bloqueou várias vezes o processo democrático na Guiné-Bissau".
Fernando Jorge Cardoso descreveu Kumba Ialá como uma figura "errática", sem objetivos e planos definidos, e também populista, "que sabia falar com o seu povo".
"Apesar da sua base principal de apoio estar na etnia balanta, isso não significa que todos os balantas o apoiassem e nem significou que não teve apoio de outros grupos na Guiné-Bissau", referiu Cardoso.
"O Kumba Ialá criou o PRS (Partido de Renovação Social) e conseguiu que este partido até agora se mantivesse como a segunda força política nacional. Isto revela um pouco da sua capacidade interna de mobilização e captação de apoios na sociedade guineense", acrescentou o investigador do IMVF.
Para Cardoso, o seu desaparecimento coloca, desde logo, algumas dúvidas sobre o peso político que vai manter ou não o partido que criou, considerando cedo qualquer análise nesse sentido, já que a sua morte acontece muito próxima às eleições no país.
"A sua morte não representa um golpe, uma mudança, nas relações de forças e de poder dentro das forças armadas (de maioria da etnia balanta)", disse Cardoso, sublinhando que Kumba Ialá tinha apoiantes e opositores dentro das forças armadas.
"O seu desaparecimento não irá trazer convulsões na Guiné-Bissau, mas poderá trazer alguma competição no seio da sua etnia (balanta), no sentido de saber quem será o novo líder, não mais do que isso", completou Armindo Espírito Santo.
Kumba Ialá, o emblemático homem do gorro vermelho, candidatou-se à Presidência da República na Guiné-Bissau em todas as eleições desde 1994, foi eleito em 2000, mas deposto em 2003, por um golpe de Estado militar.
CSR // APN