Morreu Frank Carlucci, antigo embaixador dos EUA em Portugal
Frank Carlucci morreu aos 87 anos. O antigo secretário da Defesa e Conselheiro de Segurança Nacional na administração de Ronald Reagan e, antes, vice-diretor da CIA na administração de Jimmy Carter, foi também embaixador dos EUA em Lisboa no período pós-25 de abril, enviado por Henry Kissinger para evitar que o país se tornasse comunista. Morreu no domingo, devido a consequências da doença de Parkinson, mas a notícia só foi tornada pública esta segunda-feira pelo jornal Washington Post, que o descreve como um negociador de crises duro e de pulso firme mas com um tom diplomático que trabalhou para seis presidentes.
Descreviam-no como "pequeno e rijo". Frank Charles Carlucci III , que nasceu a 18 de outubro de 1930 no estado americano da Pennsylvania, foi oficial da Marinha e fez um MBA em Harvard. Em 1956 entra para o corpo diplomático e, em 1960, é enviado para o Congo, no período pós-independência do país.
Em 1975 torna-se embaixador em Lisboa. Kissinger, Secretário de Estado de Richard Nixon e Gerald Ford, queria "isolar Portugal na NATO e cortar os programas de assistência" americanos. Carlucci recusou, alegando que Portugal seria capaz de se afirmar como democracia, evitando tornar-se num estado comunista. "Quem é que me vendeu Carlucci como um tipo rijo?", terá perguntado então Kissinger, como lembra nesta segunda-feira o Washington Post. Mário Soares, que o viu chegar com Otelo Saraiva de Carvalho, recordava-o como "um tipo pequenino, vivo. Um típico mafioso italiano!" E afirmava que os Estados Unidos "não tiveram tanta importância como se julga" no processo revolucionário português.
40 anos depois do 25 de abril, documentos do Departamento de Estado até então considerados "secretos" davam conta de uma reunião que decorreu no verão quente de 75 entre Kissinger, Carlucci, e vários membros do departamento de Estado. "Não sou assim tão contra um golpe desse tipo [de direita], por muito chocante que seja para os meus colegas...", afirmou Kissinger, segundo a ata da reunião em que se discutiram as hipóteses de êxito de um golpe por parte da direita em Portugal. Carlucci mostrou-se contra, defendendo o apoio aos "moderados" como Mário Soares, tal como fez em relação à tese da "vacina", segundo a qual se Portugal se tornasse comunista tornar-se-ia um exemplo dissuasor, evitando que outros países do sul da Europa o fizessem.
Depois de regressar de Portugal, em 1978, alegando que o seu protagonismo se tornara excessivo, torna-se vice-diretor da CIA, durante a administração de Jimmy Carter. A agência, então chefiada por Stansfield Turner, atravessava um período conturbado, depois de revelações que implicavam a CIA em assassinatos e atos de espionagem a americanos.
Seguiu-se o seu trabalho como vice-secretário da Defesa de Ronald Reagan, onde foi uma força determinante no maior investimento militar da história dos Estados Unidos: 1,4 biliões (o trillion anglo-saxónico) em cinco anos, determinante para as conversações entre os Estados Unidos e a União Soviética de Mikhail Gorbachev na Guerra Fria. "Os soviéticos acreditaram que o podíamos fazer", afirmou numa entrevista ao Miller Center da Universidade da Virginia, em 2001. "Aquelas armas tiveram um impacto psicológico decisivo. Se não tivéssemos tido um aumento de material militar, não acredito que a Guerra Fria tivesse acabado tão depressa como acabou."
Em 1986 Carlucci tornar-se-ia conselheiro de Defesa Nacional e, no ano seguinte, secretário da Defesa, cargo que exerceu durante 14 meses.
Com a eleição de George H.W. Bush, em 1989, Carlucci deixou o governo, embora não tenha saído de Washington. Começou então a trabalhar no grupo Carlyle Group, que contava com vários ex-membros dos gabinetes governativos, incluindo o ex-secretário de Estado James Baker e, depois, o próprio Bush. Acabaria por tornar-se chairman do grupo e ser responsável pela sua expansão. Em 1997 trouxe, com Artur Albarran, a Euroamer para Portugal, que chegou a ser investigada.
O atual embaixador dos Estados Unidos em Portugal, George Glass, recordou hoje o antigo embaixador Frank Carlucci, que morreu no domingo aos 87 anos, como um "homem notável" cuja ausência será muito sentida.
"O embaixador Frank Carlucci era um homem notável. Ele fará muita falta. Os meus pensamentos estão com a sua família e amigos neste momento", escreveu George Glass, que assumiu a representação diplomática norte-americana em Lisboa em agosto de 2017, numa breve mensagem publicada hoje à tarde no Twitter.