Ministros vão precisar de luz verde da AR para irem para setor privado
O PS quer apertar a malha às incompatibilidades para titulares de órgãos de soberania e altos cargos do Estado e apresentou ontem no Parlamento um diploma que alarga os impedimentos após o exercício dessas funções. O articulado socialista mantém os três anos de período de nojo previsto na lei mas afunila as possibilidades de transição para o setor privado. Por exemplo, para ser contratado para uma empresa que opere num setor que tenha tutelado qualquer ex-governante vai precisar de luz verde da Assembleia da República.
Dito de outra forma, de um parecer vinculativo da comissão parlamentar competente, o que teria dificultado a contratação de Maria Luís Albuquerque por parte da gestora de dívidas britânica Arrow Global, que tem na sua carteira de clientes vários bancos portugueses, entre os quais o Banif.
Mas as restrições não ficam por aqui. Durante três anos, os ex-titulares de cargos políticos "de natureza executiva" não poderão assumir funções de "trabalho subordinado ou consultadoria em organizações internacionais com as quais tenham estabelecido relações em representação da República Portuguesa", uma norma que inviabilizaria a nomeação de Vítor Gaspar para o departamento de assuntos orçamentais do FMI. A esta regra excetuam-se a União Europeia, a ONU ou o regresso a um lugar anteriormente ocupado.
E há mais. "De igual modo, os consultores do Estado em processos de privatização e concessão de ativos em que tenham tido intervenção ficam impedidos de exercer funções nas entidades contraparte da negociação", pode ler-se no projeto socialista.
O diploma incide ainda sobre o estatuto dos deputados, que ficariam impedidos de "servir de perito, consultor ou árbitro em qualquer processo em que seja parte o Estado ou quaisquer outros organismos públicos", bem como de exercer "cargos de nomeação governamental remunerados". Essas nomeações só poderiam ocorrer para cargos consultivos e não remunerados e mediante o ok da comissão parlamentar competente.
E se o diploma ganhar força de lei, os deputados também não poderão "prestar serviços, manter relações de trabalho subordinado ou integrar, a qualquer título, organismos de instituições, empresas ou sociedades de crédito, seguradoras e financeiras" - preceito que impediria a permanência de Maria Luís no hemiciclo.
Em nome da transparência, o partido liderado por António Costa quer mexer também no controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos. Os socialistas querem mão pesada para quem "intencionalmente" preste informação errada ou oculte rendimentos ou património, propondo pena de prisão até três anos.
De acordo com o diploma do PS, o universo de pessoas sujeitas à obrigação de declaração de património deve abranger também os altos dirigentes da administração indireta e direta do Estado, da administração local e das regiões autónomas por um período de três anos após a cessação de funções. A ideia é "reforçar as garantias de idoneidade" e aferir se se verificou alguma forma de enriquecimento injustificado após os respetivos mandatos.
Por outro lado, os socialistas pretendem rever o código de IRS, defendendo uma taxa especial de 80% - ao invés dos atuais 60% - para tributar acréscimos patrimoniais não justificados de valor superior a cem mil euros.
Noutro projeto de resolução, o PS propõe a criação de uma comissão eventual para reforço da transparência no exercício de funções públicas, que terá um mandato de 180 dias e será aberta a audições de especialistas.
Na sexta-feira, a pedido do BE, haverá um debate sobre o regime de incompatibilidades e impedimentos dos políticos. Na mesa de Ferro Rodrigues entraram diplomas dos bloquistas e também do PCP.