Ministra desilude polícias e tréguas com o governo chegam ao fim
A ministra da Administração Interna teve azar. Herdou polícias desiludidos e sindicatos com menos paciência para promessas. É o que se passa com a direção do maior sindicato da PSP, a Associação Sindical de Profissionais de Polícia (ASPP). Passou, juntamente com as outras estruturas sindicais desta força de segurança, os quatro anos do anterior governo em intensas e duras negociações para conseguir que o novo estatuto profissional fosse aprovado mesmo no final da legislatura. O problema é que as medidas mais importantes ficaram por regulamentar e, sete meses depois de ter tomado posse, Constança Urbano de Sousa nada avançou.
Por isso a tolerância esgotou bem mais depressa com Constança Urbano de Sousa do que com os seus antecessores do executivo PSD-CDS, Miguel Macedo e Anabela Rodrigues. A ASPP promete à ministra, caso nada se altere, uma rentrée bem quente, com protestos dos polícias nas ruas.
"O sentimento que há é que está tudo parado e já esgotámos o timing aceitável", sublinha o presidente da ASPP, Paulo Rodrigues. Explica que, no início do ano, entregaram à ministra uma lista com as medidas que deveriam ser tomadas (ver caixa), parte das quais relacionadas com o novo estatuto, em vigor desde janeiro. "Nada foi resolvido", afirma. "A bem dizer, a única questão que pode ser considerada resolvida foi a conclusão dos concursos abertos ainda na legislatura do anterior governo. Porque também seria impossível manter o concurso parado", ironiza. "Ou seja, após sete meses de governo os polícias não tem qualquer garantia nem da data da resolução nem se irá ser ter alguma."
Paulo Rodrigues avança com um ultimato a Constança Urbano de Sousa: "Nos próximos dois meses tem de haver concretização o mais rapidamente possível de medidas, principalmente no que diz respeito à regulamentação do estatuto e dos concursos de promoção. Se não houver resposta teremos uma rentrée de contestação."
Desde que lidera a ASPP passaram três governos (dois PS e um PSD-CDS) e "sucessivamente têm adiado a resolução dos problemas". No entanto, assinala, "têm sido proativos quando é para cortar direitos. Entram com grandes promessas, criam grandes expectativas, mas depois vão passando os meses e tudo se esfuma. Não admitiremos que este governo nos mantenha reféns com promessas. O tempo das promessas chegou ao fim".
Há duas semanas já a segunda mais representativa estrutura sindical da PSP tinha anunciado o seu "chumbo" ao desempenho da tutela. No balanço aos primeiros seis meses de governo, o Sindicato dos Profissionais da Polícia (SPP) concluiu que a avaliação "é negativa e claramente lesiva dos interesses de todos os polícias", pelos mesmos motivos da ASPP. O presidente do SPP, Mário Andrade, disse à agência Lusa que os polícias podem vir a realizar ações de protesto caso o estatuto profissional não seja totalmente cumprido nas próximas semanas. "Seis meses é tempo mais do que suficiente para estudos e análises e exige-se que o governo e a direção nacional da PSP adotem medidas tendentes a que o estatuto da PSP seja cumprido e devidamente regulamentado", considerou o SPP.
Do lado da GNR, Constança Urbano de Sousa não tem mais sorte. Além de ter de enfrentar o desagrado da maioria dos oficiais por causa do novo estatuto que quer aprovar, as bases também estão bastante inquietas. A estrutura mais representativa, a Associação de Profissionais da Guarda (APG), não ouviu da ministra "mais do que promessas". O presidente César Nogueira faz por isso um "balanço muito negativo" destes meses de mandato. A criação de um horário de trabalho de referência na GNR, uma das principais reivindicações dos militares da corporação, foi anunciada em abril, pela ministra da Administração Interna, no Parlamento, mas César Nogueira lamentou que ainda não tenha avançado.
[citacao: Continua a faltar equipamento básico de proteção: coletes, capacetes e escudos ]
Outro grande problema que a GNR e a PSP reivindicam que seja resolvido é o dos cortes inesperados que estão a sofrer os polícias que vão para a pré-aposentação (PSP) e a pré-reforma (GNR). A Caixa Geral de Aposentações (CGA) está a aplicar a lei geral e a descontar o designado fator de sustentabilidade nas pensões, com cortes de 300 a 400 euros mensais. "É uma situação intolerável, pois está estabelecido que qualquer polícia que reunisse as condições pode passar para essa situação sem penalizações", salienta Nogueira. "O governo é que tem de resolver o problema. A CGA não tem governo próprio", assevera.
No caderno reivindicativo que a ASPP tinha entregue à tutela, chama-se também atenção para a necessidade de "obras urgentes" em instalações muito degradadas, como é o caso dos edifícios da "elite" da PSP, a Unidade Especial de Polícia e da Divisão de Trânsito do Porto. Os recorrentes e já antigos pedidos de mais equipamentos de proteção pessoal (coletes, capacetes e escudos balísticos) continuam na lista de necessidades.
O Serviço de Apoio na Doença (SAD), o subsistema de saúde dos polícias, continua a ser outro motivo de preocupação. "Os polícias passaram a descontar (com o anterior governo) 3,5% do seu vencimentos quando, segundo várias análises financeiras realizadas, concluíram que 2,5% seria suficiente para manter o equilíbrio entre receitas e despesas", alega a ASPP.