Militares da GNR filmaram-se a torturar imigrantes em Odemira

Investigação da CNN Portugal / TVI revela caso de maus-tratos e abuso de poder por parte de sete agentes da GNR contra imigrantes asiáticos no concelho alentejano. MAI esclarece que um já foi demitido e os outros seis estão suspensos.
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Sete militares da GNR estão acusados de um total de 33 crimes relacionados com alegados maus-tratos a imigrantes em Odemira, no Alentejo. Segundo avançaram esta quinta-feira a CNN Portugal e a TVI, os agentes filmaram-se a humilhar e agredir as vítimas, trabalhadores imigrantes provenientes do sul da Ásia, principalmente do Bangladesh, Nepal e Paquistão.

As imagens, que estão na Justiça, mostram, por exemplo, uma das vítimas sujeita a tortura com gás pimenta. Numa falsa operações stop, os elementos da GNR de Vila Nova de Mil Fontes levaram um imigrante para um descampado, à noite, e torturaram-no com gás pimenta, obrigando-o a inalar pela boca e pelo nariz através do tubo do aparelho de medição de taxa de alcoolemia.

Enquanto a vítima pedia água em inglês, alguns militares da GNR riam-se e proferiam insultos: "É gás pimenta, ó animal. Filho de uma grande puta! Animal!".

Segundo a investigação da CNN Portugal /TVI, os imigrantes eram apanhadas na rua, de forma aleatória e gratuita, para gozo dos sete militares, que montavam emboscadas a pretexto de falsas operações stop e de fiscalização de trânsito. Os trabalhadores de explorações agrícolas eram depois insultados, humilhados e agredidos.

No despacho de acusação, citado pela CNN Portugal / TVI, o Ministério Público não tem dúvidas: "Faziam-no em manifesto uso excessivo de poder de autoridade que o cargo de militar lhes confere". E conclui, quanto aos motivos: "Ódio claramente dirigido às nacionalidades que tinham [as vítimas] e apenas por tal facto e por saberem que, por tal circunstância, eram alvos fáceis".

Em resposta a esta investigação, o Ministério da Administração Interna esclareceu esta quinta-feira que um dos militares da GNR já foi demitido daquela força de segurança e que outros seis militares foram suspensos de funções na sequência do mesmo caso.

Em reação à notícia, a Guarda Nacional Republicana emitiu um comunicado às redações no qual esclarece que existe "um processo inicial que data de 2018 e que é denunciado pela própria Guarda".

Nesse processo, "os factos dizem respeito a cinco militares do Destacamento Territorial de Odemira, envolvidos em agressões a indivíduos Indostânicos". De acordo com o esclarecimento, "no âmbito das suas competências, a Guarda quando tomou conhecimento dos factos, prontamente reportou-os ao Ministério Público, através de auto de notícia."

Segundo a GNR, "subsequentemente, foi ainda instaurado processo de inquérito, por parte da Inspeção Geral da Administração Interna (IGAI), no sentido de apurar as circunstâncias e a conduta dos militares da Guarda e aplicação de medidas sancionatórias. De realçar, que em todo o processo, a Guarda para além de denunciante, prestou toda a colaboração nas diversas diligências e atos processuais necessários."

Durante as diligências de investigação do primeiro processo, foram apurados "factos que consubstanciam a existência de outros crimes, pelo que foi extraída certidão pelo Ministério Público, que deu origem a um novo processo crime e a um outro Processo de inquérito por parte da IGAI", acrescenta a Guarda.

"Neste segundo processo, estão envolvidos sete militares do Destacamento Territorial de Odemira, em que três deles são reincidentes. Este é o processo que relata a investigação CNN e remonta a 2019".

Relativamente a este segundo processo, que decorre os seus termos no Ministério Público, segundo a Guarda, "dos sete militares arguidos, dois militares reincidentes encontram-se a cumprir pena de suspensão decretada por S. Ex.ª o MAI." "Os restantes cinco militares aguardam medidas sancionatórias, que são da responsabilidade de atribuição pela IGAI, entidade que tutela o processo de inquérito que ainda decorre", refere o comunicado da GNR.

"Nos últimos três anos, 28 militares foram objeto de medidas expulsivas da Guarda, o que revela o rigor e a transparência aplicados, perante os comportamentos desviantes que possam colocar em causa os valores e os princípios da Instituição", sublinha a força policial, acrescentando que tanto "a Guarda Nacional Republicana, [como] os militares que servem e que já serviram a Instituição não se reveem na conduta e nos comportamentos desviantes evidenciados, razão pela qual denunciou prontamente a situação, criminalmente e disciplinarmente, sendo que caberá ao Ministério Público e à IGAI as decisões sancionatórias dos comportamentos descritos."

"A Guarda reafirma o seu compromisso de tolerância zero às diferentes formas de discriminação e desigualdades, sejam elas através do género, idade, orientação sexual, deficiência, raça, etnia, saúde, religião, nacionalidade, situação económica ou estrato social, pautando a sua atuação diária pela primazia da segurança e da salvaguarda de todo e qualquer cidadão", conclui o comunicado.

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