Mike Pence venceu o debate e foi mais pencista do que trumpista

No confronto entre vices, o republicano mostrou-se mais calmo do que o democrata Tim Kaine. Ao falar da Rússia e da Síria, o número dois de Donal Trump distanciou-se do chefe
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Mais do que defender Donald Trump, Mike Pence, o candidato republicano à vice-presidência e governador do Estado do Indiana, defendeu-se a si próprio. Para vários analistas da imprensa internacional, o debate vice-presidencial de terça-feira (madrugada de quarta em Lisboa), contra o senador Tim Kaine, terá sido o primeiro passo para uma eventual candidatura de Pence nas eleições de 2020.

Desde as eleições de 1856, as primeiras após a fundação do Partido Republicano, em 1854, houve sete candidatos à vice-presidência que mais tarde chegaram à Casa Branca pelo seu próprio pé: Theodore Roosevelt, Calvin Coolidge, Franklin Roosevelt, Harry Truman, Lyndon B. Johnson, Richard Nixon e George H. W. Bush.

"Pence parecia estar a fazer campanha pelo pencismo, para 2020 ou 2024", escreve o politólogo Chris Cillizza no The Washington Post.

O número dois distanciou-se do chefe, principalmente na questão russa. Para Trump, " Vladimir Putin é um líder mais forte do que Barack Obama". Pence, por seu turno, preferiu atacar o presidente russo, dizendo que se trata de um "fraco" que gostava de fazer bullying. "Estava mais interessado em defender o conservadorismo a que os norte-americanos se habituaram nos últimos 30 anos do que em justificar as posições de Trump. Não terá sido uma má jogada caso queira posicionar-se para ser o nomeado republicano em 2020", escreve a BBC.

Outro dos momentos em que Mike Pence se distanciou de Donald Trump foi na questão síria. "Eu teria ficado de fora e não teria lutado tanto contra Assad", disse Trump em maio. "Os EUA devem estar preparados para usar força militar e atacar posições do regime de Assad", defendeu Pence no frente-a-frente com Kaine.

Os analistas são praticamente unânimes em dar a vitória a Pence, penalizando Tim Kaine pelo aparente nervosismo e pelo estilo demasiado agressivo. O republicano esteve mais calmo, talvez pela experiência acumulada entre 1994 e 1999, quando conduziu um programa de rádio.

Kaine insistiu em repetir os comentários racistas, xenófobos e sexistas que Trump tem feito ao longo da campanha, desafiando Pence a comentá-los e a defender o chefe. O governador do Indiana, contudo, conseguiu quase sempre desviar o assunto. Kaine voltou à mesma tecla: "Já por seis vezes lhe disse que não consigo imaginá-lo a defender as posições do seu companheiro de corrida. Está a pedir às pessoas que votem em alguém que ele não consegue defender." Mike Pence disse que Donald Trump não tinha dito aquilo que dizem que ele disse. E também jogou ao ataque, referindo que Hillary é que tem baseado a campanha em insultos, aludindo ao facto de a candidata democrata ter chamado "deploráveis" a metade dos eleitores republicanos. Por fim, Pence, tentando desculpar Trump, proferiu uma das frases da noite: "Oiça, ele não é um político polido como você e a Hillary."

Apesar de a generalidade da imprensa dar a vitória a Pence, o mais provável é que o debate vice-presidencial venha a revelar-se irrelevante no que às intenções de voto diz respeito. Segundo um estudo da Gallup, realizado há quatro anos, "nenhum dos oito debates vice-presidenciais entre 1976 e 2008 parece ter alterado de forma significativa as preferências dos eleitores".

Os dados provisórios apontam para que o confronto entre Kaine e Pence tenha sido visto apenas por metade dos 80 milhões de espectadores que acompanharam o duelo entre Hillary Clinton e Trump. Uma sondagem realizada pela estação ABC News, no final da semana passada, mostrava que mais de 40% dos norte-americanos não sabiam quem são os candidatos à vice-presidência. Porém, apesar do pouco interesse que despertam, podemos estar a falar de potenciais presidentes, obrigados a assumir o cargo de repente. Até hoje houve nove vices que tiveram de substituir o líder, por morte ou demissão. Na segunda metade do século XX aconteceu por duas vezes: em 1963, com o assassínio de John Kennedy (substituído por Lyndon Johnson), e em 1974, depois de Richard Nixon ter abdicado na sequência do caso Watergate (Gerald Ford assumiu o cargo).

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