Miguel a solo no Dakar para cumprir "o sonho de uma vida"
No dia 11 de janeiro, se tudo correr bem, Miguel Caetano vai festejar o 45.ª aniversário durante a quinta etapa do Dakar, ao comando de uma moto KTM, numa ligação de 431 quilómetros entre Moquegua e Arequipa. Longe da família, dos amigos, mas a cumprir um sonho de uma vida.
Miguel Caetano é um dos 18 pilotos portugueses que vai participar na 41.ª edição do rali mais famoso do mundo, que se realiza entre 7 e 17 de janeiro unicamente no Peru (10 etapas, num total de 5000 quilómetros, 3000 cronometrados) e que, de acordo com a organização, será um dos mais duros de sempre, porque a quase totalidade do percurso é feita em dunas e areia.
Empresário no ramo da restauração, e apesar de se tratar de uma estreia, vai participar na classe mais purista da prova - Original by Motul -, ou seja, uma gigantesca aventura sem qualquer tipo de assistência ou carros de apoio. Isto significa que está "por conta própria" e que terá que ser ele a resolver qualquer problema mecânico ou de outra ordem que possa surgir.
"É um sonho de sempre, desde que me lembro de ver o Dakar através da televisão. Sempre achei que um dia ia conseguir participar. Desde criança que tenho uma enorme paixão por desportos motorizados. O Dakar era o meu programa anual, a minha novela. Primeiro pela televisão e depois agarrado à internet. Agora o sonho vai tornar-se realidade", referiu ao DN.
"Ando de mota desde os 12 anos [a primeira foi uma Yamaha MR 50]. E talvez há uns 20 mais a sério, fora de estrada. Sempre achei que era uma preparação que estava a fazer para um dia participar no Dakar. Foi sempre um sonho. Há quem tenha loucuras maiores. Esta sempre foi a minha", disse.
O sonho do Dakar acompanha-o quase desde criança. Mas a decisão de avançar em definitivo surgiu há um ano, no final de 2017. "Era um objetivo eternamente adiado, até que decidi que ia correr na edição de 2019. Quando tomei a decisão marquei logo bilhete. Depois tive a oportunidade de ir ver o último Dakar, na altura até fui convidado pela organização já como potencial participante. E se já não tinha dúvidas, a partir daí fiquei com a certeza absoluta", revela, ele que há uns anos já tinha acompanhado o grande amigo Bernardo Villar numas etapas do Dakar em África, e fez de moto zero a abertura da prova quando passou por Portugal.
O passo seguinte foi contar à família a aventura em que se ia meter. A novidade não era propriamente uma novidade, pois desde que casou há 15 anos que a mulher o ouvia dizer que um dia ia correr o Dakar. "Quando lhe contei, ela ainda teve ali uns minutos de espanto e durante um mês andou a digerir a ideia. Mas entendeu e apoiou-me. Sempre soube que era o sonho da minha vida. De qualquer forma já fiz uma promessa. Esta é uma vez sem exemplo."
Desde que tomou a decisão, Miguel optou "por uma preparação diferente do normal". "Não andei a fazer corridas nem a disputar campeonatos nacionais. Foquei-me e trabalhei muito este ano em quatro pontos: na preparação psicológica; na navegação, porque é preciso aprender a trabalhar com todos os instrumentos, como roadbook, gps, ico e cap; a preparação física, até porque há um mês e meio numa queda parti o ombro e, finalmente, em andar de moto, fiz muitos milhares de quilómetros em todo o tipo de terreno."
Miguel não vai completamente às escuras. Conhece bem o Peru e este ano já teve oportunidade de treinar em alguns locais onde a prova vai passar, em localidades no sul de Lima. "Tenho consciência e noção do que vou encontrar. E dos perigos e dificuldades que podem surgir. Também pratiquei em Marrocos. Mas as dunas não têm nada a ver. No Peru são muito maiores e não são constantes", advertiu, garantindo que está preparado caso tenha de lidar com qualquer avaria: "Desde miúdo que tenho curiosidade por mecânica. Hoje é um escape ir para a garagem e fazer a manutenção das minhas motos. Esta KTM que vou conduzir é específica para este tipo de corrida, foi feita de raiz e é muito desenvolvida. É idêntica à dos pilotos de fábrica."
Miguel não é nem nunca foi piloto profissional. E garante que não tem qualquer ambição nesse sentido - "considero-me o outsider dos pilotos portugueses no Dakar 2019". Por isso não vai a pensar em classificações. O objetivo está há muito definido: terminar a prova. "Não me magoar, tentar divertir-me ao máximo e chegar ao fim, são os objetivos. Esta opção de fazer este rali na classe Original by Motul tem a ver com o espírito inicial do Dakar, em que os pilotos saíam de França e atravessavam Marrocos e quase a África toda com poucos meios e cada um por si. No fundo vou estar ali sozinho. Ninguém me pode mexer na moto e só posso ter a ajuda de outros concorrentes da minha classe. Não vou ter nenhum mecânico, nem ninguém para apoiar-me. Apenas terei apoio da KTM Portugal para ter acesso a material que preciso. Mais nada. Podia ter ido com equipa de assistência e mecânico, mas optei por um desafio ainda maior."
Apesar de correr por gosto, Miguel Caetano já teve as suas aventuras. Já fez algumas Bajas de Portalegre e destaca duas competições em que participou no estrangeiro: "Em 2009 estive na Baja da Califórnia, numa corrida de motos ao estilo de Le Mans, em que os pilotos se vão revezando. Mas quis fazer sozinho e terminei uma prova onde nenhum outro português participou. E em 2015 terminei o Qatar Sealine Rally, que é considerada a prova mais difícil da Taça do Mundo de Todo o Terreno, com etapas de 400/500 quilómetros e temperaturas de 40/45 graus."
A partida para "o sonho de uma vida" é já no dia 1 de janeiro. Mas a prova só tem início dia 7, em Lima. Serão 10 etapas, num total de 5000 quilómetros, 3000 cronometrados, com meta também na capital peruana no dia 17. "O voo de regresso a Lisboa está marcado para o dia 20 de janeiro", diz confiante. "O que temos realmente nosso são os sonhos e o meu grande sonho é correr no Dakar de moto. A vida é rápida e ou era agora que me sinto bem ou passava e continuava a ser um sonho para o resto da vida", concluiu.