Metade dos brasileiros tem de votar duas vezes

Em 12 estados, equivalentes a 52% da população, também há eleições para governador. Com atentados <em>fake</em>, rixas regionais, casos de polícia, homofobia e discussões sobre tons de pele nas campanhas.
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No domingo, mais de metade dos brasileiros (52%), além de votar para presidente, vai eleger também o novo governador do respetivo estado, depois de na primeira volta, 12 das 27 unidades federativas terem deixado a decisão para a segunda volta. Entre elas, São Paulo, a mais rica e populosa de todas. Aí, Tarcísio de Freitas, ex-ministro de Jair Bolsonaro, e Fernando Haddad, ex-ministro de Lula da Silva, ex-prefeito da capital estadual e candidato presidencial em 2018, protagonizam um duelo que reproduz a disputa nacional. Mas há muito mais.

Tarcísio é o favorito, não só porque teve 42% dos votos no dia 2, contra 35% de Haddad, mas também porque vai liderando as sondagens desde então. Na última, no entanto, o candidato do PT, com 43%, chegou a empate técnico com o do Republicanos, preferido de 46% dos paulistas.

Para a aproximação de Haddad pode ter contribuído o episódio do suposto atentado contra Tarcísio. Numa visita do aliado de Bolsonaro a Paraisópolis, a maior favela de São Paulo, ouviu-se disparos. A candidatura imediatamente espalhou ter sido atacada por criminosos, hipótese mais tarde descartada pela polícia - o tiroteio não teve nada a ver com a presença da comitiva. Na sequência, foi revelado no jornal Folha de S. Paulo um diálogo entre um membro do staff do candidato e um operador de imagem da Jovem Pan, emissora ligada ao bolsonarismo, a pedir para apagar a gravação do tiroteio. "O que Tarcísio quer esconder de você?", perguntou Haddad nas redes sociais após a divulgação do áudio, numa eleição em que a segurança pública tem marcado o debate.

Outra provocação de Haddad a Tarcísio comum ao longo da campanha é meramente regional: ao contrário do candidato do PT, natural de São Paulo, o bolsonarista nasceu na vizinha (e rival) cidade do Rio de Janeiro. "A merenda que o governo federal distribui às crianças nas escolas é um sumo de laranja e uma bolacha, ou biscoito, como vocês dizem lá no Rio...", disse Haddad a Tarcísio num debate, a propósito de uma rixa antiga entre paulistas e cariocas sobre a forma mais correta de designar o alimento.

Em Alagoas, o governador candidato à reeleição, Paulo Dantas (MDB), lulista, chegou a ser afastado do cargo a meio do duelo de segunda volta com o bolsonarista Rodrigo Cunha (União), por decisão de uma juíza do Superior Tribunal de Justiça na sequência de uma operação policial contra o político para apurar suposto esquema de rachadinha - desvio de salários de assessores fantasmas. Dois juízes do Supremo Tribunal Federal, porém, revogaram o afastamento e a disputa eleitoral voltou à normalidade.

No Rio Grande do Sul, um dos duelos mais acirrados: Onyx Lorenzoni, ex-ministro de Bolsonaro, concorre contra o atual governador, Eduardo Leite, que chegou a ser dado como presidenciável pelo PSDB, antes de o seu partido optar por apoiar Simone Tebet, do MDB. Homossexual assumido, Leite foi vítima de homofobia por parte do rival que disse, em tempo de antena, que caso fosse eleito, "os gaúchos [gentílico do estado] teriam um governador e uma primeira-dama de verdade".

Na atribulada corrida ao governo do estado mais a sul do país, foram notícia ainda as recusas de Lorenzoni em apertar a mão a Leite, num debate, e de responder a oito perguntas seguidas do rival, noutro. Entretanto, embora neutral na disputa nacional, Leite recebeu "apoio crítico" do PT à reeleição.

Há três estados, porém, em que a disputa é "fratricida": no Sergipe, ambos os candidatos votam Lula para presidente e em Rondônia e no Mato Grosso do Sul os concorrentes são todos pró-Bolsonaro. No último desses estados, aliás, Eduardo Riedel e Capitão Contar reclamavam o estatuto de candidato oficial do bolsonarismo, com vantagem inicial para Riedel, até Bolsonaro declarar apoio a Contar em pleno debate de primeira volta na TV Globo, depois de ser desafiado pela candidata presidencial Soraya Thronicke, natural do estado, a posicionar-se. "Capitão lá, capitão aqui" passou logo depois a ser o slogan do Capitão Contar.

No Amazonas e na Bahia, o tom de pele, tema sensível no mundo em geral e no Brasil, país miscigenado, em particular, entrou no debate político. No estado do norte, o lulista Eduardo Braga declarou-se no registo oficial de candidatura "pardo", ou seja, mestiço, apesar de aparentemente branco, a mesma decisão do neutral Antônio Carlos Magalhães Neto, no estado nordestino. Na sequência, os rivais de ambos, o bolsonarista Wilson Lima e o lulista Jerônimo Rodrigues, respetivamente, acusaram-nos de usar o tom de pele para retirarem benefícios eleitorais e financeiros - há um fundo para candidatos não brancos (e para mulheres) de forma a estimular a participação política de minorias.

Enquanto em Santa Catarina, o estado mais bolsonarista, o aliado do presidente Jorginho Mello deve bater Décio Lima, do PT, apesar do caso da gravação do empresário Luciano Hang, próximo do Planalto, a pedir ao secretário de economia estadual para demitir professores e assim evitar aumento de impostos, em Pernambuco a eleição ficou marcada por uma tragédia familiar.

No dia da primeira volta, o marido da candidata Raquel Lyra morreu subitamente. Ela, neutral, enfrenta a ex-aliada Marília Arraes, apoiada por Lula, no único duelo feminino desta segunda volta.

ALAGOAS

Paulo Dantas (lulista)
Rodrigo Cunha (bolsonarista)

AMAZONAS

Eduardo Braga (lulista)
Wilson Lima (bolsonarista)

BAHIA

Jerônimo Rodrigues (lulista)
ACM Neto (neutro)

ESPÍRITO SANTO

Renato Casagrande (lulista)
Carlos Manato (bolsonarista)

MATO GROSSO DO SUL

Capitão Contar (bolsonarista)
Eduardo Riedel (bolsonarista)

PARAÍBA

João Azevedo (lulista)
Pedro Cunha Lima (neutro)

PERNAMBUCO

Marília Arraes (lulista)
Raquel Lyra (neutra)

RIO GRANDE DO SUL

Onyx Lorenzoni (bolsonarista)
Eduardo Leite (neutro)

RONDÔNIA

Marcos Rocha (bolsonarista)
Marcos Rogério (bolsonarista)

SANTA CATARINA

Jorginho Melo (bolsonarista)
Décio Lima (lulista)

SÃO PAULO

Fernando Haddad (lulista)
Tarcísio de Freitas (bolsonarista)

SERGIPE

Rogério Carvalho (lulista)
Fábio Mitidieri (lulista)

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