Melody Gardot, a voz que olha o mundo em contraluz
É assim que conhecemos Melody Gardot, uma das mais distintas compositoras e vozes do jazz feminino: aos 19 anos andava de bicicleta pela sua Filadélfia quando foi atropelada, perdeu a capacidade de andar, ficou afásica, perdeu parcialmente a memória. Antes disso já tocava música, conta-se que aos 16 anos, depois de ficar sem gasolina, entrou num restaurante e sentou-se ao piano em que tocaria standards de jazz para juntar dinheiro.
Após o acidente, e por recomendação do médico, impossibilitada de tocar piano, levou uma guitarra para a cama onde esteve deitada mais de um ano e ali a tocava, cantando também. Dois anos depois, aos 21, dava conta do "milagre de estar viva" no EP Some Lessons: The Bedrooms Sessions.
A partir daí, Melody Gardot tornou--se aquilo que dela conhecemos e que nesta quarta-feira trará a Oeiras, no EDP Cool Jazz: a figura quase mítica de óculos escuros que entra em palco de bengala. Não para nos lembrar de qualquer milagre, mas porque o vive. Os olhos, depois do acidente, tornaram-se bastante sensíveis à luz e o corpo guardou mazelas no andar.
"Conhecia-a a contraluz, ela andava pela casa a contraluz, fechava muito as janelas, era verão, e depois percebi, porque aquela luz muito intensa fazia-lhe impressão à vista, ela estava mais ou menos na penumbra. Era uma rapariga muito elegante, sempre descalça pela casa, com uma saia comprida perfeitamente à vontade. Não estava a criar o boneco para me receber." É Luísa Amaro, a guitarrista, quem recorda Melody como a conheceu, num palacete de Alfama, em 2010. A cantora, que então queria aprender a tocar guitarra portuguesa (acabou por desistir devido aos seus dedos "tão fininhos"), percorria a odisseia que definiu por Buenos Aires, Lisboa e Rio de Janeiro e cujo final seria o seu quarto disco, The Absence (2012).