MATE - Música , Arte, tecnologia e educação
Antes de tudo era a música, disse Mateus Aleluia que junto com Iya Sisi fez a plateia no teatro do convento São Francisco dançar um canto de Orixa. Isso mostra uma coisa importante que o "MATE - Música, Artes, Tecnologia e Educação" parece ter percebido e feito com maestria: destacar o comum, o que temos em comum.
Nossas diferenças devem ser percebidas sim, cuidadas e respeitadas, mas precisamos entender que elas são como uma roupa capaz de desbotar com o tempo, às vezes mudam a forma e em outras a importância. Não somos arame rígido. Nossa espécie é a única que sabe dançar. As outras nascem com habilidades rítmicas inatas, mas somente a nossa, essa dos humanos, dança, inclusive mal e sem ritmo. E sabemos cantar mal também e o fazemos quando a emoção é maior que a vergonha.
As novas revoluções, arriscaria eu a afirmar, passam por esses corpos que sentem. Que sentem saudade, que choram a morte dos que amam, aceitam as alegrias imprevistas e são capazes de viajar horas para encontrar alguém que lhes arrepia a pele. Todos nós sabemos o que é rir até doer a barriga e chorar ao ponto de sentir frio. E dançamos. E cantamos também. Qual mãe ou pai não ninou um filho com uma melodia que lembra um ressoar antigo. É o ritmo do coração de um outro o primeiro som que nos envolveu, ali, no ventre de uma mulher.
Como estaremos daqui dez anos? provocou Eron Quintiliano, criador e curador do MATE. Não sei respondi. Não sei porque dependera das escolhas de hoje. Dos caminhos de picada que vamos abrir, dos afetos construídos.
Mas sei que estamos próximos quando nos deixamos sentir. Quando os olhares de desconhecidos se cruzam e percebem estarem a rir da mesma coisa. Em tempos de guerra precisamos inverter algumas importâncias. Dar-se conta que nossa identidade não esta nem na farda nem no sotaque ou estilo da fala fruto da arbitrariedade da vida que nos faz nascer lá e não ca. A identidade habita nas palavras eleitas para falar com alguém e na forma de usar as mãos. E nossa força tampouco esta na identidade inventada das marchas de guerra ou discriminação, mas no que fazemos com o repertório que temos, a língua, o corpo, a linhagem, a cor da pele, as riquezas e as fraquezas.
Se a curadoria do MATE coordenada por Eron levou isso em consideração também não sei, mas havia delicadezas muito sofisticadas na composição e na eleição dos temas e dos artistas nesta primeira edição na Europa. Um evento fruto da cooperação entre três países: Portugal (Região de Coimbra), Espanha (Galiza) e Grécia (Tessalónica). O MATE é um projeto de dimensão europeia e espírito global, desenhado para fomentar o inter-conhecimento, capacitação, tutoria e estabelecimento de negócios no âmbito das Indústrias Culturais e Criativas (ICC), com especial ênfase para o sub-setor da Música.
Essa música que veio antes mesmo da palavra. Mesmo sendo a música o foco principal, os encontros trouxeram transversalmente os temas da inclusão, da diversidade e da igualdade de gênero, da preservação do ambiente e a sensibilização para as alterações climáticas.
Entre os objetos do festival está o do provocar e estimular reflexões, apresentar e desenvolver projetos inovadores, propiciar o diálogo, as visões e experiências diversas. Além de contribuir para fazer emergir uma rede e uma plataforma de novas oportunidades de negócio para aqueles que pretendam comprar, vender, conceber e promover o seu projeto, negócio ou empreendimento na área da música. Não podemos esquecer que cultura também gera muita riqueza de ordem material, trabalho, empregos, negócios, no Brasil, por exemplo, é responsável por uma grande fatia do PIB.
Como estaremos daqui dez anos eu realmente não sei, mas iniciativas como a do MATE parecem nos convidar a novos percursos e a criar este futuro.
Somos consertos e concertos, mas conseguimos aprender a dançar, ao fim o que mais importa é com quem dançamos e as músicas que entoamos, mesmo baixinho, mesmo desafinando.
Psicanalista e escritora, doutora em ciências humanas