Mario, Mirza ou Jonathan. As histórias dos migrantes a caminho dos EUA
Ninguém sabe ao certo quantos são. Uns dizem que serão três mil, outros quatro mil. As Nações Unidas falam em mais de sete mil. São migrantes, a maioria hondurenhos, e estão neste momento no México a caminho da fronteira com os EUA.
Mario tem apenas 12 anos e deixou a família para trás, Mirza está grávida de cinco meses, Jonathan não conseguia arranjar trabalho. Por que é que deixaram o país natal e por que é que correm atrás do sonho americano? Estas são as suas histórias.
Mario Castellanos, um hondurenho de 12 anos, viaja sozinho desde San Pedro Sula na esperança de chegar aos EUA. Foi um dos primeiros que tentou cruzar a ponte e foi recebido pelas forças de segurança mexicanas, tento tentado atirar-se ao rio. Contou à BBC Mundo que a polícia o agarrou à força, tendo sofrido ferimentos ligeiros no ombro, além de ter sido atingido pelo gás lacrimogéneo.
"Nas Honduras, sofremos", explicou, dizendo que não ia à escola e que, às vezes, ia ao centro da cidade para vender pastilhas elásticas para tentar ganhar algum dinheiro para a família. "Queriam que entrasse num gangue. Diziam que me iam pagar bem, mas eu não queria", afirmou.
A mãe de Mario disse à BBC que a família tem muitas dificuldades porque ela não trabalha e o pai é segurança. "Digo ao Mario que quando há, há que comer, e quando não há, é preciso aguentar", afirmou Dilsia, de 36 anos, explicando que o filho tinha dito em várias ocasiões que queria ir para os EUA para ganhar dinheiro, mas que partiu sem autorização.
"Se ele conseguir passar, melhor para nós, mas se não conseguir, que regresse para cá", disse a mãe, indicando que soube onde andava o filho depois de uma amiga ter dito que o havia visto na televisão.
"Caminhar é muito difícil, mas a minha missão é chegar", disse Mario. "Tenho saudades da minha casa, mas é preciso seguir em frente", acrescentou à BBC Mundo. Pelo caminho, vai recebendo comida das pessoas. "Não empacotei nada. Vim sozinho com a roupa que estava a usar, na viagem uso as roupas que as pessoas me estão a dar. Vou usando e vou deitando fora, não consigo carregar muita coisa", indicou.
A hondurenha Mirza Rivera tem 19 anos e está grávida de cinco meses. Cruzou a ponte no rio Shuciate com a mãe, mas o padrasto ficou para trás. Mas mesmo quando ele atravessar, diz que quer esperar que todos os migrantes passem também. "Não vou sozinha até aos EUA... há muitos narcotraficantes", disse à agência francesa AFP.
Mirza, que tinha comido dois dias antes de falar à AFP, conseguiu cruzar a fronteira no meio dos confrontos com as forças de segurança e, tal como outras mulheres com filhos pequenos, esperam que o resto dos familiares atravessem a ponte que divide os dois países.
Os migrantes dizem fugir da violência e da pobreza e queixam-se que o presidente hondurenho, Juan Orlando Hernández, não faz nada para resolver os problemas que os obrigam a emigrar.
O presidente norte-americano, Donald Trump, ameaça enviar os militares para a fronteira com o México para impedir que a caravana cruze a fronteira.
"Não temos medo das ameaças de Trump. Estamos a fugir do nosso país, porque do nosso país, sim, temos medo: da delinquência, de tudo o que acontece diariamente no nosso país", disse Jairon à BBC Mundo.
"Somos imigrantes, não somos assassinos. Vamos caminhar por uma vida melhor, para ver se podemos melhorar com a nossa família porque estamos a sofrer no nosso país", acrescentou este hondurenho.
"Não há emprego, não há um teto digno para as pessoas, não há alimentação, não há saúde, não há educação, por isso tomámos a decisão de fugir", queixou-se.
São os problemas de emprego que levam Jonathan Troches, de 18 anos, a deixar as Honduras para tentar chegar aos EUA. Já procurou emprego, sem sucesso, em 16 'maquilas', como são conhecidas as fábricas geridas por empresas estrangeiras que importam as matérias-primas, aproveitam a mão-de-obra barata, e exportam os produtos manufaturados para o seu país de origem.
"É por causa da idade. Se és muito jovem, não te contratam. Não há trabalho em lado nenhum e somos muitos à procura", disse Jonathan ao site independente da Guatemala Nómada.
Viaja sozinho, tendo deixado as irmãs nas Honduras. A mãe é enfermeira, o pai tem 60 anos e é diabético, não conseguindo já trabalhar como motorista de camiões.
Há muito tempo que Jonathan pensava ir para os EUA, mas não tinha os oito mil dólares que cobraria um "coiote" [as pessoas que ajudam os migrantes a cruzar ilegalmente a fronteira norte-americana] para o levar. Quando soube da caravana, viu a sua oportunidade.
Os problemas de emprego também afetam Guillermo Bendaña, mas no seu caso é por já ser demasiado velho. Espera celebrar os 60 anos já nos EUA. Os jornalistas do Nómada encontraram-no quando estava a despejar uma saqueta de soro em pó numa garrafa de água, para tentar combater a desidratação.
"Nas Honduras, depois dos 35 ou 40 anos, não dão trabalho, por muita experiência que a pessoa tenha. Mas nos EUA sim, porque sei um ofício, sou eletricista e mecânico também. Então a minha meta é chegar lá para trabalhar, não para ser criminoso. Somos pessoas humildes e eles precisam da nossa mão-de-obra. Nas Honduras não há trabalho", explicou.
Envolto na bandeira das Honduras, emociona-se a falar, lembrando que deixou para trás vários familiares, mas que nos EUA já estão dois dos seus filhos, de 12 e 15 anos.
"A terra é para todos. Deus não criou fronteiras, os homens é que criaram fronteiras. Somos todos imigrantes neste mundo", indicou. E deixou um aviso a Trump: se cortar o apoio às Honduras, como ameaça, só vai fazer pior, porque as pessoas vão começar a morrer de fome e haverá mais a querer sair.
Dayana Ávila tem 24 anos e deixou San Pedro Sula, nas Honduras, no dia 12 de outubro. Partiu com o pai e um tio, mas na Cidade de Guatemala separam-se e teme seguir sozinha. Contou à BBC Mundo como deixou a sua casa com apenas 200 lempiras (menos de oito euros), que já gastou.
"A vida lá é muito difícil. É muito duro ver os meus irmãos [tem nove] a dizer à minha mãe que têm fome e ela a dizer-lhes que não tem nada que lhes possa dar", disse. A mãe vende tortilhas, o pai é pedreiro. Ela só estudou até ao sexto ano e não consegue trabalho.
"Tenho um filho. Chama-se Aarón e tem três anos. Não o trouxe, a minha mãe ficou a cuidar dele", explica, contando que não é casada e que ficou grávida porque foi violada por membros dos gangues. "Eram vários, estavam armados. Levaram-me a um monte, violaram-me e deixaram-me quase morta. Nunca o denunciei porque me disseram que se fosse à polícia me matavam a mim e à minha família", indicou. As ameaças eram constantes e chegou a esconder-se durante 12 dias para fugir dos violadores.
O filho tem epilepsia e é preciso tomar medicamentos todos os dias. "O tratamento custa umas 5 mil lempiras [cerca de 180 euros]. Eu não tenho forma de pagar esse dinheiro", explicou, contando como ganhava seis mil lempiras a trabalhar numa cozinha e isso nem é o salário mínimo. "Por isso vim na caravana, não vou deixar que o meu filho morra", indicou. "Se chegar aos EUA talvez tenha oportunidade de trazê-lo para ser visto pelos médicos", explicou à BBC.
"Apesar de ser fruto de violação, tenho que o amar porque é meu filho, saiu de dentro de mim. Não vou deixar que morra", afirmou.