Eleva-se 2351 metros acima do nível do mar, soberana em todo o Atlântico adjacente. Para encontrar gigante que ombreie com a Montanha do Pico, no arquipélago dos Açores, há que viajar mais de 1400 Km para sueste, rumo ao Roque de los Muchachos, pico com 2426 metros, no arquipélago das Canárias. Abaixo da superfície, sob as águas do Atlântico Norte, a Montanha do Pico não é, contudo, monólito solitário. A queda abrupta de cinco mil metros rumo ao abismo, tem raízes na cordilheira subaquática que se estende por mais de 11 mil Km. São poucos os locais onde a dorsal mesoatlântica se revela. A altura média dos picos da cumeada, entre os dois e três mil metros, queda-se abaixo das ondas. A Islândia, a Ilha de Ascensão e Tristão da Cunha, juntam-se aos Açores no rol de territórios que revelam a atividade subaquática conturbada da dorsal. No seio da cadeia de montanhas submersas, o rifte, sulco central, liberta continuamente lavas, construtoras da crusta oceânica..Não obstante o seu gigantismo, as dorsais oceânicas (o sistema global de dorsais estende-se por 64 mil Km), mantiveram-se desconhecidas até à década de 1950. Como também o era a generalidade dos fundos oceânicos. Coube à dupla de geólogos norte-americanos, Bruce Heezen e Marie Tharp, revelar ao mundo um território que, então, se apresentava menos mapeado do que a Lua. Marie, em particular, tratou de tornar em objeto visual o fundo do Oceano Atlântico, obreira do seu primeiro mapa científico. Tarefa meticulosa que careceu tanto de conhecimento científico como de labor de artesã, na minúcia de reproduzir à escala, com tinta-da-china e aguarela uma área com mais de cem milhões de quilómetros quadrados..Antes de no final da década de 1940, se sentar como geóloga no Observatório Geológico Lamont, na Universidade de Columbia, em Nova Iorque, Marie teve de superar o preconceito da época: às mulheres não lhes estava reservada carreira na geologia. Tharp, nascida em 1920, contrariou o destino, terminou o bacharelato em Inglês, recusou o caminho de docência, enveredou num novo curso superior, a Geologia, foi contratada pela American Oil Company, petrolífera a operar no estado do Oklahoma. A Marie, jovem que correra os horizontes largos dos estados do Iowa, Michigan e Alabama, a par de seu pai, agrimensor, o trabalho de escritório, na avaliação de mapas, carregava travo a cárcere. Uma vez mais, a condição feminina impunha-se. Às mulheres, era-lhes interdito o trabalho de campo. Marie Tharp compunha os seus dias com um terceiro curso superior, o de Matemática, na Universidade de Tulsa..Mil novecentos e quarenta e oito, a cidade de Nova Iorque e o norte-americano Maurice Ewing, geólogo e oceanógrafo, teceram a trilogia que abriu um novo caminho a Marie e que a levaria na década seguinte a resgatar do anonimato os fundos oceânicos. Em 1948, a geóloga rumou à Big Apple onde, na Universidade de Columbia, integrou a equipa de Ewing. Marie, conhece aí um jovem geólogo, Bruce Heezen. Juntos, trabalham sobre dados fotográficos para a localização de aeronaves militares abatidas na Segunda Guerra Mundial. A dupla faz um primeiro "mergulho" nos oceanos. Segue-se-lhe uma missão sob as águas que se prolongará por quase três décadas..Heezen embarcou em mais de três dezenas de expedições a bordo do navio de pesquisa Vema. Em alto mar, com base na barimetria, método que permite a medição da profundidade dos oceanos, o geólogo coletou centenas de milhares de dados científicos. Tharp, a quem foi negada autorização para se juntar às missões oceânicas, traduzia em terra, sob a forma de mapas, a informação matemática e os dados sismográficos de terramotos submarinos. Nascia um padrão de relevos que, em 1957, originou o primeiro mapa fisiográfico do Atlântico Norte seguido, em 1961, do mapa do Atlântico Sul, mais tarde, em 1964, o do Oceano Índico..Um gigantesco puzzle que revelava todo um sistema de cordilheiras submarinas. No final da década de 1950, Marie extraiu ao "novo" mundo subaquático a matéria-prima que fundamentou a hipótese que, havia anos, rondava a cartilha de um grupo de geólogos. Em 1967, Dan McKenzie, professor de geofísica da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, sustentou num artigo publicado na revista Nature a teoria da Tectónica de Placas. Esta, assenta em dois princípios: um, a deriva continental, e outro, a expansão dos fundos oceânicos, responsável pela geração do sistema de dorsais oceânicas, identificadas por Tharp e Heezen..Heezen faleceria em 1977 vítima de ataque cardíaco no decorrer de uma das expedições oceanográficas de mapeamento do fundo marinho. Tharp manteria até 1983 a sua ligação à Universidade de Columbia. Em 1995, doou a sua coleção de mapas à Biblioteca do Congresso. Faleceu em 200, aos 86 anos..Em 1977, a revista National Geographic sintetizou num único mapa a cores o trabalho de décadas da dupla Tharp e Heezen. Ao pintor e cartógrafo austríaco Heinrich Berann, coube a tarefa de apresentar visualmente o fundo dos oceanos terrestres. The World Ocean Floor, implicou milhares de horas de trabalho ao artista que, na época, trazia um invejável currículo na criação de mapas panorâmicos. Entre eles, a representação de 1962 da cordilheira dos Himalaias, na Ásia. Para a conclusão do mapa monumental, Heinrich baseou-se em centenas de fotos dos picos montanhosos e sobrevoou em aeronave o Monte Evereste..dnot@dn.pt