Marianne Thyssen:"Na era digital os jovens vão ter vários empregos"

Preocupada com o futuro dos jovens no mercado de trabalho, lembra que acabaram os empregos para a vida, como o do seu pai, que fundou uma padaria quando era novo
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De manhã esteve a contar uma história em português para as crianças do grupo Aprender, Brincar, Crescer, do Centro Intergeracional do Areeiro. Como e quando aprendeu o português?

Devo dizer que, em primeiro lugar, gosto de Portugal, gosto de Lisboa e de várias zonas do país como Guimarães, Viseu, Viana do Castelo e tantos outros. A primeira vez que viajei dentro de Portugal foi em 1977, três anos depois da revolução, era ainda uma estudante. Andei a acampar e adorei. Enquanto me licenciei em Direito, tirei um curso básico de português mas já foi há muito tempo (Risos). E em 2015 vim fazer umas férias de bicicleta por Portugal, com o meu marido. Mas ainda consigo ler um pouco português e por isso aceitei o desafio de ler para estas crianças.

Portugal está a fazer o suficiente na área do apoio à primeira infância?

Temos provas de que se apoiarmos as crianças na primeira infância em projetos como este, que seriam inacessíveis para as suas famílias, estamos a providenciar-lhes um futuro escolar em iguais condições que os outros. Quanto à cobertura oficial de creches e jardins de infância, Portugal está no topo 5 dos melhores a nível europeu.

Uma vez disse que "os empregos precários não podem ser o novo normal". Mas já são. Que futuro têm os jovens europeus?

O que queremos agora é garantir proteção social os trabalhadores, porque sabemos que na era digital os jovens vão ter vários empregos. Mas também não queremos que sejam sempre trabalhos temporários. Os jovens precisam de estabilidade e de poder investir no futuro, de começarem uma vida, terem crédito para comprar ou renovar casa. Sabemos que temos hoje em dia mais flexibilidade no mercado de trabalho mas temos de ter a certeza que todos têm acesso a proteção social.

Mas o facto é que acabaram os empregos para a vida...

Já não são possíveis. Quando olho para as gerações antigas, o meu pai tinha uma padaria que começou quando era muito novo e foi o que fez toda a vida. Quando olho para os meus tios, começaram a trabalhar aos 18 ou 19 anos e ficaram toda a vida na mesma empresa. Agora, na era digital já sabemos que esse paradigma mudou mas temos de criar condições para empoderar os jovens nessas transições de um emprego para outro.

O que é que a Comissão Europeia está a fazer para garantir mais proteção?

Podemos fazer recomendações mas no final cada Estado membro tem de percebera necessidade de alterar legislação nas áreas relacionadas com a segurança social. E isso tem de ser feito por cada país e não a nível europeu. Mas neste momento estamos a consultar os parceiros sociais sobre o acesso à proteção social. Se chegarem a um acordo podemos ver o que fazer do lado europeu. Por outro lado, é preciso olhar para as regras dos códigos laborais, desatualizadas há 25 anos, e pensar em como integrar as novas formas de trabalho na era digital e propor direitos mínimos nesta área.

Assistimos à criação do Pilar europeu dos Direitos Sociais este mês. Que medidas já estão a ser tomadas para honrar este pilar?

Como referi há pouco, já estamos a trabalhar com os vários estados membros para que se preocupem com legislação que inclua mais proteção social aos desempregados que ficam na transição e têm de saber quais os direitos que têm e de se sentirem empoderados na fase de procurar novo emprego. Isto é muito importante. E temos de avaliar novos conceitos, nomeadamente sobre o trabalho temporário. É preciso mostrar às pessoas que se pode ultrapassar a crise económica, que temos de tomar conta dos cidadãos e preparar-nos para o novo mundo do trabalho. Não queremos deixar ninguém para trás.

Como é que esses objetivos se coadunam com uma população envelhecida a nível europeu?

Esse é um problema comum a vários Estados membros. Temos duas soluções: ou aumentamos as contribuições sociais ou vamos todos trabalhar até mais tarde. Como pagar mais não deve ser solução, vamos todos ter de trabalhar até mais tarde.

E como é que a Europa convence os empregadores a manterem pessoas idosas nos postos de trabalho?

Tem de se olhar para esses trabalhadores como pessoas com mais conhecimento e experiência. E podem-se mudar algumas coisas, como pensar em horários parciais de trabalho para esses funcionários mais velhos, por exemplo.

A cimeira dos direitos sociais de Gotemburgo, este mês, foi importante na definição de novas metas?

Foi muito importante. Há 20 anos que não tínhamos uma cimeira social. Falámos dos novos direitos laborais, de como os novos trabalhadores qualificados devem estar protegidos. Os orçamentos europeus terão de refletir no futuro as políticas de acesso à educação e ao mercado liberal e a serviços sociais de excelência.

PERFIL

› Marianne Thyssen nasceu a 24 de julho de 1956, na Bélgica. Licenciou-se em Direito pela Universidade Católica de Leuven em 1979.

› No encerramento da conferência de Lisboa, ontem, disse:"Precisamos que a inovação social ajude a lidar com a revolução digital. Os motoristas da Uber estão a substituir os taxistas. Em breve, os carros automáticos substituirão os motoristas da Uber".

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