Marcelo na faculdade que é um templo da medicina
Foi à Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), "universidade pela qual fui adotado" - é doutor honoris causa e foi um dos elementos da comissão instaladora da Faculdade de Direito do Porto -, que Marcelo Rebelo de Sousa deixou ontem um elogio ao presidir à sessão do dia da FMUP, que celebra 192 anos. "Têm aqui um templo" com "o que há de melhor", disse o Presidente da República, sem deixar de responder aos desafios levantados: defendeu que os currículos devem ser repensados à luz da aceleração dos tempos e não sempre que muda um governo; apontou que é o momento para "repensar o regime jurídico" para estatuto fundacional e admitiu que as academias vivem em exiguidade financeira, como tinha lembrado na sua intervenção a
diretora da FMUP, Maria Amélia Ferreira.
O Presidente chegou pontual, às 09.00, e após entrar na faculdade, no Hospital de São João, e ouvir uma curta atuação da tuna masculina da FMUP, seguindo para a aula magna, cedeu a várias solicitações de funcionários para as já habituais selfies. Na cerimónia concorrida, Marcelo ouviu a diretora da faculdade destacar que o número de estudantes cresceu muito nos últimos dez anos, "não tendo sido esta situação acompanhada de aumento de orçamento".
"O financiamento obtido através do Orçamento do Estado representa apenas 54% dos proveitos totais da FMUP e paga apenas 82% dos custos de pessoal e 55% dos custos totais", disse Maria Amélia Ferreira, advertindo que, para manter o equilíbrio financeiro, "há anos que não se abrem lugares para a progressão da carreira académica na FMUP". Feitas as contas por estudante inscrito, a diretora considerou que a faculdade deveria receber mais 2,6 milhões de euros do que os atuais 10 milhões.
O reitor da Universidade do Porto, Sebastião Feyo de Azevedo, bateu no mesmo problema: "O financiamento do Estado é muito inferior àquilo que precisamos para potenciar o material humano." Além disso, referiu que o regime jurídico deve ser reformado e deu o exemplo da fusão da FMUP com a Faculdade de Medicina Dentária do Porto, ainda por consumar por não ter colhido maioria absoluta no conselho geral da UP. "É um problema político, obviamente delicado, que nos empurra para o problema jurídico", disse o reitor, reiterando o compromisso de trabalhar para a fusão.
Francisco Sousa Vieira, presidente da Associação de Estudantes da FMUP, defendeu que os alunos "devem ser ouvidos" já que para muitos a faculdade "deixa de ser segunda para ser a primeira casa". "Vivemos tempos de grande mudança", alertou, concretizando que o "numerus clausus é perigosamente elevado e o número de alunos na faculdade está no limite". Este semana, Maria Amélia Ferreira já tinha avisado em entrevista ao DN que o futuro profissional dos jovens médicos é hoje de grande incerteza.
Presença excessiva no Porto
Atento, o Presidente da República soube responder a todas as questões levantadas, após conquistar a plateia que lotou a aula magna, com o autarca Rui Moreira na primeira fila, com uma brincadeira sobre as suas visitas ao Porto. "Começo a ser suspeito de presença excessiva no Porto. Já perdi a conta. Não diria que seja escandaloso mas começa a ser notado."
O afeto estava lançado para entrar nas questões reais. "O que impressiona na faculdade de medicina é o espírito de corpo." Mas há desafios novos, reconheceu Marcelo Rebelo de Sousa. Começou pelo estatutário, considerando ser o momento para "repensar o regime jurídico" que "já tem tempo suficiente para poder ser reanalisado com distância". "É certo que se pode esperar pelo fim da legislatura ou por nova legislatura, mas é, em larga medida, tempo perdido", frisou.
Depois, a estrutura curricular. "Com a aceleração da ciência e da tecnologia, com os novos desafios sociais, em particular os da sociedade portuguesa, as estruturas curriculares não podem mudar de cada vez que muda um governo, não podem mudar de cada vez que muda uma liderança de uma instituição académica, mas devem ser repensadas à luz da aceleração dos tempos. Isto, porventura, aplica-se também à formação na medicina", disse.
Os meios financeiros são outra situação, pela qual o presidente apenas demonstrou compreensão: "O país está a fazer um esforço sério para cumprir compromissos internacionais, numa trajetória de afirmação de finanças, de equilíbrio financeiro interno e externo. Isso tem custos e as academias pagam esses custos. Em qualquer caso, porque sabemos todos que a educação é central no tal conselho estratégico nacional e é central no tal objetivo universal, é permanente a preocupação dos responsáveis relativamente à exiguidade dos meios."
Muito aplaudido, Marcelo teve a tuna feminina na despedida e tirou mais umas quantas selfies, agora com grupos de caloiros. "Ele é muito divertido. Toda a gente gosta dele. Arranjamos tempo para vir vê-lo", explicou Eduardo Tavares, aluno do 1.º ano de Medicina.
O sábio convidado
O orador convidado para a 22.ª edição do FMUP foi Adriano Moreira, que fez uma exposição sobre a Conciliação no Mundo. Um "sábio", definiu Marcelo Rebelo de Sousa, já depois da intervenção que foi aplaudida de pé pela plateia. Partindo do 11 de setembro de 2001, "o início de uma nova época", Adriano Moreira abordou o tempo atual como uma era em que "o credo dos mercados substituiu o credo dos valores - é isso que estamos a viver", com o Ocidente numa encruzilhada em que o regresso da diplomacia é um instrumento decisivo. E Portugal deve aproveitar o regresso ao mar, à terra, à CPLP, para ter um conceito estratégico nacional na realidade do globalismo.