Marcelo: de herói a vilão?

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Balsemão, no seu livro Memórias, lançado na passada semana, tece duras críticas a Marcelo Rebelo de Sousa, o "escorpião" traidor, ao mesmo tempo que António Costa pede ao atual Presidente para exercer o segundo mandato com as mesmas características do primeiro, que tanta aceitação lhe granjearam. Será que Marcelo passou de herói a vilão? Acabou o estado de graça do Presidente? Uma coisa é certa: Marcelo já não é o mesmo e disse, na noite da reeleição, que nada iria mudar em si. Mas foi uma promessa não cumprida, igual a tantas outras, com que os nossos políticos nos brindam.

Se Balsemão tem razão para se queixar tanto de Marcelo, estava no Governo dele com um pé dentro e o resto do corpo fora, também António Costa terá as suas. Senão, vejamos: demarcação da estratégia do Governo de combate à covid-19; promulgação dos apoios sociais; críticas ao PRR e alguns vetos.

Se Marcelo foi, para Balsemão, um falso aliado, também o poderá ser para Costa, tanto mais que os segundos mandatos dos Presidentes são normalmente diferentes dos primeiros. De Presidente fixe, Marcelo poderá deixar de o ser. Ascensão e queda de um Presidente? O tempo o dirá, mas Marcelo já não é tão consensual como era.

As críticas de Balsemão vieram pôr a nu uma realidade indesmentível: Marcelo não é um político fiável. Parece que estou a vê-lo na noite dos incêndios a mover ataque cerrado ao Governo e a pedir a cabeça da ministra da Administração Interna. Como se os incêndios, muitas vezes incontroláveis, fossem culpa do Governo. Pior que a posição de Marcelo só a moção de censura do CDS, altamente ridícula e despropositada.

Entre Balsemão e Costa, medeiam 40 anos. A homenagem que o atual primeiro-ministro tributa ao fundador do Expresso e militante número um do PSD é mais do que justa. Jornalista, empresário de comunicação social e político, Balsemão foi das personalidades mais relevantes do nosso Portugal Democrático. A ele se ficou a dever - com a revisão constitucional de 1982, feita com Mário Soares - a normalização da vida política portuguesa, pois foi extinto o poder militar, nomeadamente o Conselho da Revolução.

António Costa, ao homenagear Balsemão, de partido diferente do seu, mas ambos primeiros-ministros, um ex outro atual, dá provas de grande sentido de Estado e de total ausência de sectarismo. Tanto um como o outro não mereciam o "escorpião" traidor, mas o meu amigo Victor da Cunha Rego - grande figura do nosso querido DN, com quem partilhei muitas horas de trabalho, ele como diretor, eu como repórter político - costumava dizer: as coisas são o que são, não o que gostaríamos que fossem! E é bem verdade.

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