Manuel Luís Goucha: "Este é o casaco televisivo certo"
Aos 66 anos, Manuel Luís Goucha passou parte de metade deles a apresentar os espaços matutinos em televisão, primeiro na RTP1, depois na TVI. "Estive 29 anos e alguns meses nas manhãs", recorda o apresentador, agora que deixou para trás esse horário para arrancar nas tardes da TVI, com um programa de entrevistas. Um lugar que estava, até dezembro, nas mãos de Fátima Lopes, que anunciou na sexta-feira a saída da estação de televisão.
A semana de estreia ficou marcada por quatro vitórias em cinco, com uma entrevista com a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, uma conversa intimista com o companheiro do apresentador, Rui Oliveira, e o início das entrevistas aos candidatos presidenciais, começando por André Ventura e Tino de Rans. Frente-a-frentes que vão prosseguir ao longo dos próximos dias.
"Em termos profissionais, é um grande desafio, este é casaco televisivo certo. Sou muito feliz a fazer televisão", afirma o apresentador. Não antecipa cenários, nem se as vitórias vêm para ficar. "Estou-me nas tintas se ganho ou não, o projeto tem e fazer sentido na minha vida, tenho de ser feliz a fazê-lo", diz, diante de toda a equipa de direção de Ficção e Entretenimento. "Não embandeiro em arco vitórias, nunca me fui abaixo com as derrotas, nunca senti esse peso, nunca ninguém mo pôs, nesta casa, até hoje. Mesmo quando andei ano e meio a perder, nunca ninguém me pressionou", afirma. Para trás, ficaram 18 anos nas manhãs da TVI, mas sem nostalgia. "Não tenho saudades dos projetos. Quando saí da Praça da Alegria [em 2002, para ir para a TVI], olhei para aquilo no dia seguinte e já não era meu. Saí a ganhar e andei a perder três anos ou quatro. Isso é que dá gozo: ir à luta, recomeçar".
Agora, Manuel Luís Goucha está escrever uma página peculiar numa televisão que costuma não ser generosa a quem muda de horário: mesmo depois de tantos anos nas manhãs, instalou-se nas tardes e tem conquistado resultados acima dos registados anteriormente pela estação.
"Já fiz manhãs, já fiz tardes a substituir a Fátima e fiz muitas noites, fiz muitas a fio com Cristina Ferreira. Os horários não pertencem a ninguém", analisa o apresentador.
Do outro lado, na concorrência, estão Tânia Ribas de Oliveira, na RTP1, e Júlia Pinheiro, na SIC, que venceu um dos dias na semana deste arranque. Amigos de longa data, ainda não comentaram resultados, mas falaram antes das luzes do cenário se ligarem, a 4 de janeiro. "A Júlia ligou-me no dia em que eu ia estrear-me, tal como lhe liguei uma ou duas horas antes de se saber publicamente que eu ia para a tarde. Adoro a Júlia, não voltei a falar com ela. Isto é tranquilo para um e para outro, temos anos de embates nisto", lembra.
Foi também a partir de um horário televisivo tradicionalmente mais conservador que Goucha, que sonhava com televisão desde os seis anos, que pôs a pé no pequeno ecrã por via do teatro, "rasgou mentalidades". Trouxe para o espaço mediático de forma gradual a sua vida privada, foi deitando por terra a "estória" de um romance em torno de si e de Teresa Guilherme, nascida em 1993, quando Manuel Luís se estreou na estação pública, no formato Olha que Dois.
Gradualmente, o apresentador foi falando do companheiro, Rui Oliveira, até que o apresentou ao público, em antena. Na semana passada, foi seu convidado numa conversa cúmplice, nas novas tardes. "É muito interessante ver que os comentários foram 95% muito elogiosos. Por muito conservador que possa ser o público de day time, tudo isto tem muito a ver com a postura que eu e o Rui assumimos publicamente", analisa o rosto das tardes. E prossegue: "O público não vê nada mais do que duas pessoas, neste caso do mesmo sexo, do mesmo género, a falarem de aspetos da vida. Ao longo destes 22 anos, desde o momento em que souberam, os espectadores só vêem dois homens que se respeitam e gostam muito um do outro".
Goucha recorda que a decisão de deixar perpassar a sua vida privada "não foi premeditada"."Curiosamente, na altura, Cristina [Ferreira, então colega de cena no Você na TV!] - e não foi só ela - teve mais medo do que o público conservador pudesse pensar". Conta Manuel Luís que, anos mais tarde, o tempo veio dar-lhe razão. "Ela assumiu publicamente numa entrega de prémios e que recebeu em meu nome que o público tinha gostado ainda mais de mim, que me acarinhou, porque fui mais verdade". "Estou grato às pessoas que me mantêm tantos depois na televisão, e com sucesso", agradece.
Sobre o futuro, Manuel Luís Goucha diz, entre risos: "agora é o que a Cristina quiser." Mais a sério, fala dos dois anos que tem por cumprir na TVI. "Podem contar comigo sempre dando o meu melhor. Com certeza que, diariamente, pode não me apetecer, mas imaginemos que este projecto é ganhador? Não faço planos".
Trabalhos que quer conciliar, na vida pessoal, com a produção de azeite oriunda do seu monte alentejano, em Monforte, e que deveria chegar ao mercado ainda este ano, não fosse a pandemia.
"Agarrei as oportunidades, sou grato à vida. Fiz tudo isto sem cunhas, sem pertencer a lobby algum, a nada, não sou íntimo de ninguém, não entra ninguém na minha casa", sublinha, olhando para trás. Manuel Luís estreou-se como ator e, de icónico bigode, começou o caminho televisivo pelos programas infantis e de culinária, em 1984, na estação pública. Dez anos depois, mudava-se para a TVI e para os grandes formatos, como "Momentos de Glória", entrevistando grandes celebridades internacionais como Peter O'Toole ou Geraldine Chaplin.
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Sem audiências extraordinárias, regressaria em 1995 à RTP Porto fazer arrancar as manhãs, tendo somado várias colegas de cena, com as quais nem sempre tudo correu bem. Depois de décadas em dupla e da perda de Cristina para a SIC, o regresso desta à TVI culminou no adeus ao formato. Agora é Goucha em nome próprio.