Mal estar, conflitualidades e equívocos do governo, um panorama nacional
Corria o último trimestre do ano de 2020, quando chegou a Portugal uma "megalancha" de nome BOJADOR, adquirida no âmbito de um concurso público internacional, para a Unidade de Controlo Costeiro da GNR (UCC-GNR), com o objetivo de operar na fiscalização e na prevenção criminal no mar territorial nacional.
Perante tal aquisição, o ruído não demorou a surgir pelas vozes de alguns responsáveis da Marinha de Guerra na reforma, que se insurgiram publicamente sobre a aquisição de um meio naval com aquelas características por uma força de segurança.
Passados sensivelmente dois anos a polemica volta a instalar-se, desta vez com o pedido por parte da GNR à Frontex (Agência de Fronteiras Europeia) de uma aeronave para patrulhamentos no mar territorial dos Açores, provocando mais uma vez um enorme mal estar no seio das Forças Armadas.
Já no dia 24 do corrente mês, e na sequência da transferência de competências do SEF, foi anunciado que a GNR ficará com o controlo de todos os postos de fronteira marítima, incluindo terminais de cruzeiro, anteriormente entregues à PSP, aparentemente, criando uma vez mais, uma situação de mal estar, desta vez com outras congéneres policiais.
Segundo declarações do Comandante-Geral da GNR, o processo de controlo de fronteiras foi revertido por se preverem questões graves do funcionamento do modelo, dificuldade na coordenação operacional, por não responder às necessidades do serviço publico, duplicação de serviço e de meios e por causar conflitualidade entre as forças.
Perante tais argumentos, acolhidos pelo atual executivo governamental, estranha-se que a oposição não chame à Assembleia da República a Ministra da Defesa Nacional, não para falar do mal estar da Marinha e da Força Aérea, mas sim do porquê da Policia Marítima, força de segurança especializada nesta área, com mais de 100 anos a operar nos portos, não seja tida nem achada em todo este processo, como previsto no n.º 1 do artigo 6º do Decreto Regulamentar 86/2007 de 12 de dezembro.
Utilizando os argumentos do CG da GNR, e dada a coexistência de duas forças de segurança nos portos e nas marinas nacionais (PM e GNR), não haverá também conflitualidade entre forças? Não haverá duplicação de meios? E se o comandante da UCC-GNR for um Oficial de Marinha de Guerra com o posto de Contra-Almirante, conforme prevê a Lei Orgânica da GNR no n.º 3 artigo 40º, não haverá conflitualidade entre forças?
O decreto-lei 43/2002 de 2 de março, cria o SAM, como sistema interdepartamental de natureza horizontal integra diversas autoridades públicas que exercem o poder de autoridade marítima como por exemplo a AMN, Polícia Maritima, GNR, PSP, PJ, SEF, Inspeção Geral das Pescas, Instituto da Água, Instituto Marítimo Portuário, Autoridades Portuárias e Direção Geral da Saúde.
Diz também o diploma que a coordenação nacional das entidades e órgãos integrantes do SAM é assegurada pelo Conselho Coordenador Nacional (CCN), composto pelos seguintes elementos: Ministro da Defesa Nacional, que preside; Ministro da Administração Interna; Ministro do Equipamento Social; Ministro da Justiça; Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas; Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território; Autoridade Marítima Nacional; Chefe do Estado-Maior da Força Aérea; Comandante-geral da Polícia Marítima; Comandante-geral da Guarda Nacional Republicana; Diretor nacional da Polícia de Segurança Pública; Diretor nacional da Polícia Judiciária; Diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras; Presidente do Instituto Marítimo-Portuário; Diretor-geral das Pescas e Aquicultura; Inspetor-geral das Pescas; Diretor-geral da Saúde; Presidente do Instituto da Água; Integra ainda o CCN um representante de cada uma das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira; participa nas reuniões do CCN o membro do Governo responsável pela coordenação da política de combate à droga e à toxicodependência sempre que estiverem agendados assuntos com aquela relacionados.
Como se pode aferir pelo grande número de entidades que atuam no SAM e que compõem o Conselho Coordenador Nacional, que em 20 anos de existência, não há memoria de ter reunido, torna-se difícil, para não dizer impossível, não haver conflitualidades entre forças, quanto mais decidir alguma coisa.
Enquanto os Governos atuarem de forma negligente, como se percebe pelo Despacho 4810/2012 de 5 de abril, não se permitindo a legislar de forma séria sobre os assuntos da segurança no mar, arrumando a casa de uma vez por todas, o mal estar permanecerá sempre, quando alguém com poder de decisão pense em avançar em determinado rumo para a sua organização.
É urgente que o Governo decida de uma vez por todas, qual o rumo que quer para o mar português e para os seus intervenientes, para que cada um saiba qual o seu papel de forma esclarecida, poupando-se muito euros ao erário publico, sem duplicação de meios e sem que o mal estar entre serviços deixe de fazer parte das parangonas dos jornais.
Associação Socio Profissional da Polícia Maritima