Voos noturnos em Lisboa permitidos até 28 de novembro
Durante mais de um mês, o Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, vai poder receber voos durante o período noturno, em duas janelas horárias: da meia-noite às 2.00 e das 5.00 às 6.00 horas. Tudo devido à troca do sistema de gestão de tráfego aéreo "por razões de segurança operacional."
A decisão que entra em vigor na terça-feira e vai até 28 de novembro já estava em cima da mesa há vários meses - e em discussão pública desde agosto - e foi oficializada esta segunda-feira., depois de publicada em Diário da República. Ao que o DN apurou junto de fonte do Governo, a situação "é excecional e com um período temporal determinado", não havendo "qualquer prolongamento" para lá da data limite.
Em relação ao documento inicialmente proposto, a portaria publicada nesta segunda-feira tem algumas alterações, como o caso da limitação horária - anteriormente, estava prevista a possibilidade de voos durante toda a noite, algo que agora é alterado. Esta decisão é saudada pela associação ambientalista Zero, que considera "positiva" a criação desta janela horária, apesar de "o período noturno ser aquele que mais impacto tem na vida e no descanso das pessoas". Perante isto, o diploma prevê algumas medidas de mitigação, tais como o local de aterragem e descolagem dos aviões (que deve ser feito em sentidos específicos, quando possível), bem como a utilização de "aeronaves de nova geração com recurso a motores menos ruidosos", lê-se na portaria n.º 255-A/2022.
Contudo, estas normas "são insuficientes", considera Acácio Pires, da Zero. "Há várias coisas que já podiam ter sido feitas, como o isolamento das casas, que já devia ter acontecido há décadas e ainda não está feito", afirma ao DN. "É importante relembrar que, com o aeroporto no local em que está, a vida de milhares de pessoas é afetada. Não são só as zonas de Alvalade e do Campo Grande, é também Campo de Ourique, Campolide, Entrecampos e zonas circundantes ao aeroporto", alerta.
Fonte da NAV garante, no entanto, que "isto não significa necessariamente que haja mais voos noturnos". "O que se pretende é criar uma margem que permita que um avião que chegue atrasado, possa, no fundo, continuar a operação de seguida. Por exemplo: um voo que venha de Paris, planeado para aterrar à meia-noite, não precisa, com esta derrogação agora aprovada, de esperar até às 6.00 para continuar a operação", podendo assim operar entre as 00.00 e as 2.00 ou mais tarde, das 5.00 às 6.00 horas.
Apesar disso, a portaria explicita que passarão a estar impostos limites máximos "de movimentos semanais e adicionais aos limites atuais", reduzindo o volume de voos noturnos até ao final das operações de substituição do sistema em causa. Assim, na primeira semana (de 18 a 23 de outubro), o limite máximo é de 168 voos; na seguinte, de 86; na terceira, de 75; na quarta, de 45; na quinta, de 30; na última, de 20. Isto traduz-se em, no máximo, mais 424 voos noturnos, caso seja necessário. "É um mecanismo de flexibilidade na operação", considera o Governo no diploma. Segundo a NAV, só para terça-feira foram cancelados, com "meses de antecedência" 250 slots de companhias aéreas, mitigando assim o impacto das alterações do sistema de controlo de tráfego aéreo.
Na portaria, é ainda esclarecido que "quaisquer factos ou condutas" que violem todas estas condições devem ser comunicadas à Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC) pela entidade gestora do aeroporto de Lisboa, a ANA.
Ao DN, fonte do ministério do Ambiente e da Ação Climática confirmou que a intenção é "permitir que as transportadoras aéreas que operam no Aeroporto Humberto Delgado possam realizar alguns dos movimentos aéreos fora das faixas horárias diárias previamente atribuídas, podendo, assim, vir a abranger parte do período noturno". Esta situação, afirma a mesma fonte, "é excecional".
Em relação às medidas de mitigação, o ministério relembra que "a portaria prevê medidas" de redução dos impactos, bem como de fiscalização, como por exemplo "a comunicação ativa à população, durante este período, bem como relatórios periódicos dos voos abrangidos e das medidas de mitigação implementadas". O objetivo principal é garantir a "transparência com a população e com o objetivo último de minimizar potenciais impactes temporários sobre o bem-estar das populações das zonas sobrevoadas."
Já com a portaria aprovada, as diferentes forças políticas manifestaram-se, com o PAN a anunciar que entregou na Assembleia da República, dois projetos de lei: um para revogar a portaria do Governo, outro para impor uma interdição de voos em todos os aeroportos nacionais entre a meia-noite e as 6.00, "salvo por motivos de força maior", como emergências ou desvios por questões de segurança. O partido liderado por Inês Sousa Real anunciou ainda que vai chamar o Governo para debater a questão, uma vez que considera - com base em denúncias - haver "uma reiterada violação dos níveis de ruído" devido aos voos noturnos na cidade.
Por outro lado, João Ferreira (um dos dois vereadores do PCP na Câmara de Lisboa) reagiu no Twitter, acusando o autarca Carlos Moedas de "não se ver nem se ouvir sobre o assunto". Os vereadores do PCP apresentaram, aliás, uma proposta, no início de setembro, para tentar travar a medida agora em vigor. A moção do PCP foi incluída no documento final - tal como outra do Livre -, que foi aprovado por maioria (com abstenções e votos contra dos vereadores do PS). "Por proposta do PCP, a Câmara tomou posição sobre isto, considerando a medida inaceitável", atirou o vereador comunista.
Também o Livre contesta a decisão. Além da moção aprovada na Câmara de Lisboa, o partido apresentou ainda uma "recomendação na Assembleia da República, que está em comissão, ou seja, ainda não foi a plenário". Afirmando que o partido é "contra esta decisão", Isabel Mendes Lopes, deputada municipal do partido, refere que "o Livre compreende a necessidade de atualização do sistema de tráfego, mas não pondo em causa a saúde e o descanso da população."
Questionado pelo DN sobre esta questão, o executivo municipal liderado por Moedas remeteu a posição para o documento em causa, acrescentando que "além da mitigação que está prevista na portaria, a Câmara irá tentar alertar e sensibilizar as pessoas afetadas pela questão."
rui.godinho@dn.pt
Notícia atualizada às 15.15 do dia 18 de outubro com as respostas do ministério do Ambiente e da Ação Climática.