Mais cirurgias oncológicas feitas fora do prazo adequado, conclui Tribunal de Contas
"O acesso à cirurgia oncológica degradou-se, entre 2017 e 2020, com uma cada vez maior proporção das cirurgias a ultrapassar os Tempos Máximos de Resposta Garantidos", pode ler-se no relatório da auditoria realizada pelo Tribunal de Contas sobre o acesso aos cuidados oncológicos entre 2017 e 2020. O mesmo aconteceu em relação ao acesso às primeiras e segundas consultas e à aos rastreios. Outra nota no documento é que estas falhas foram ainda acentuadas do ponto de vista geográfico, com doentes de algumas regiões a receberem cuidados mais tardiamente do que outros.
No documento, divulgado pelo Tribuna de Contas nesta quinta-feira é referido que, "apesar dos procedimentos instituídos para o acompanhamento do acesso a cuidados de saúde oncológicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS), os mesmos apresentaram algumas falhas, nomeadamente no apuramento e monitorização dos tempos e listas de espera nas primeiras consultas, assim como no diagnóstico e terapêutica".
Ao mesmo tempo, este relatório vem confirmar o que já há muito vinha sendo dito pelos especialistas da área, que a pandemia provocada pelo SARS-CoV-2 veio condicionar toda a resposta dos serviços à doença oncológica, bem como todas as atividades de prevenção.
O tribunal explica até que "as falhas detetadas resultam particularmente do não-desenvolvimento ou da não-substituição atempada dos sistemas de informação de suporte. Uma situação que leva a que continuem por apurar e monitorizar vários indicadores relativos ao acesso a cuidados oncológicos, nomeadamente os tempos e listas de espera nas primeiras consultas hospitalares na doença oncológica, bem como noutros cuidados de saúde essenciais neste contexto, como exames de diagnóstico e terapêutica específicos".
A degradação do acesso à cirurgia oncológica no tempo adequado é um facto nos três anos em que se debruçou esta auditoria do Tribunal de Contas. Além disto, "o crescimento da atividade cirúrgica no SNS naquele período (4,8%) também não foi suficiente para fazer face ao acréscimo verificado na procura (6%)". Por outro lado, foi registada "a existência de assimetrias geográficas significativas".
O mesmo aconteceu em relação aos rastreios, em que a análise do tribunal concluiu que, tendo em conta a base populacional, em funcionamento para os cancros da mama, do colo do útero e do cólon e reto, "não foram atingidos os objetivos de cobertura geográfica e populacional previstos para 2020. Aliás, neste ano, houve mesmo "uma quebra na execução dos programas de rastreio".
Segundo o documento, "as taxas de adesão dos utentes mantiveram-se estabilizadas, face a anos anteriores, pelo que a diminuição da atividade resultou mesmo da menor oferta do SNS". O número de utentes convidados a realizar rastreio em 2020, face a 2019, foi inferior em 46% no cancro da mama, em 54% no cancro do colo do útero e em 38% no cancro do cólon e reto.
Daí que, e tendo em conta o impacto da pandemia de covid-19 nas atividades de rastreio, deteção, diagnóstico e tratamento da doença oncológica no SNS, o tribunal tenha entendido recomendar a aprovação, publicação e implementação de um plano quantificado e calendarizado de recuperação da atividade não realizada.
No que toca a consultas, e especificamente sobre a atividade do SNS durante o período da covid-19 em 2020, o tribunal verificou que "no acesso à primeira consulta hospitalar na área oncológica, e apesar de as limitações dos dados disponíveis não permitirem concluir objetivamente sobre o impacto da pandemia, a análise de dados parcelares sobre a atividade dos Institutos Portugueses de Oncologia (IPO) mostra uma redução nos novos pedidos de consulta, a diminuição da atividade e o aumento dos tempos médios de espera, entre 2019 e 2020".
Na área da cirurgia oncológica, a pandemia teve como principal impacto a diminuição da identificação de necessidades cirúrgicas. As novas inscrições de utentes, para a realização de cirurgia, diminuíram 4,3% em 2020, face ao ano anterior, tendo as reduções sido particularmente acentuadas nos meses de abril (41,2%) e maio (35,0%), relativamente aos períodos homólogos.
No final do relatório desta auditoria, o Tribunal de Contas formula várias recomendações, nomeadamente relacionadas com os processos de definição, apuramento e monitorização dos indicadores, com o desenvolvimento e a integração dos sistemas de informação utilizados e com a melhoria dos resultados em termos de acesso.