Maestro britânico quer retirar à Elektra a fama de obra violenta e barulhenta

Estreia-se hoje (20.00), no Grande Auditório do CCB, a ópera Elektra, de Richard Strauss. Leo Hussain falou com o DN sobre esta Elektra, uma das grandes óperas do século XX, com a soprano alemã Nadja Michael no temível papel titular
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"Nem sei se o deva admitir, mas é a minha primeira Elektra", começa por dizer Leo Hussain, britânico experimentado em ópera, mas ainda com pouco Strauss no "palmarés": "Dele só fizera até agora o Capriccio, há dois anos, em Santa Fe (EUA). Para além de ser a sua última ópera, é o completo polo oposto desta, por isso pode-se dizer que estou a fazer tudo ao contrário do que esperava!" Uma "bipolaridade" (nele) que assenta, contudo, bem na ópera que amanhã se estreia no CCB: "Esta ópera tem duas faces: por um lado é visceral, expressionista e muito intensa, quase parecendo que salta do palco para aplicar um soco no estômago de cada espectador. Mas, por outro lado, é extremamente lírica: todas as personagens, com possível exceção de Clitemnestra, têm música terna - é uma ópera muito romântica, para falar verdade!"

O segredo, para Hussain, está na orquestra: "A maior parte da partitura está escrita em forte. Mas é preciso formar os músicos na cultura do forte, perceber que tem que ver com o peso e não com o volume, e que há diferentes cores para ele." E acrescenta: "Cada músico deverá ser como um atleta durante uma prova. É um desafio físico tocar esta ópera, por isso eles têm de sintonizar corpo e mente com o desafio e ser inteligentes nos momentos em que tocam, para saberem como tocar." Para dar ideia da magnitude do desafio, usa uma comparação: "Elektra é uma ópera de cinco horas que foi comprimida para apenas 01.40 horas."

Sobre a personagem principal, que domina a cena (quase) de início até final, diz: "Ela é incrivelmente complexa, mas vejo nela uma personalidade coerente. E isso percebe-se muito bem, se lermos a peça original de Hofmannsthal [o libretista], que tem o dobro da extensão deste libreto. E a sucessão de cenas permite-nos, através da sua interação com outras personagens, ir percebendo diferentes ângulos do seu carácter." Uma sucessão em que, porém, não vê transformação: "Ela permanece essencialmente a mesma. E isso é corroborado pela música: Strauss não lhe dá música nova. Tudo quanto escreve é derivado, desenvolvido de elementos ou gestos ouvidos previamente."

Desfaz-se em adjetivos sobre a escrita orquestral: "Ele põe aqui tudo quanto aprendera nos poemas sinfónicos e nota-se a mestria, demonstrativa de incrível perícia na escrita para uma grande orquestra. A paleta de cores que usa é enorme, virtualmente panorâmica. É um incrível e fantástico pintor musical!" A esse respeito, refere dois planos: "Por um lado, a sugestão de dança está por todo o lado na partitura, mas nunca é usada no sentido literal [exceto na dança da morte final], mas como acentuação da emoção contida em cada gesto. Por outro lado, esta obra está cheia de motivos condutores, mas Strauss usa-os de uma forma menos literal, mais subtil e sugestiva do que Wagner, conseguindo que eles reflitam o emaranhado de pensamentos das personagens."

Com tudo isto, reconhece em Elektra a mais compacta obra-prima da ópera, com uma ressalva: "Tem de lhe juntar o Wozzeck, que apesar de ter três atos, é até ligeiramente mais curto! Mas a Elektra dá a sensação de ser bem mais longa do que o Wozzeck, porque, como tem só um ato, tenho de pensar num arco dramatúrgico imenso e único de 01.40 horas!"

Do que o aguarda em 2018, destaca "o meu primeiro Boris Godunov, a desconhecida mas belíssima O Passageiro [de Weinberg] e, mais à frente, a Tosca, que será a minha estreia na Ópera de São Francisco." À nossa observação de que procuram um novo diretor musical por lá, responde: "Pois, então talvez seja uma altura interessante para passar algum tempo em São Francisco"

elektra

Direção musical: Leo Hussain

Encenação: Nicola Raab

Elenco: Nadja Michael, Lioba Braun, James Rutherford et al.

Coro São Carlos, Orq. Sinf. Portuguesa

Grande Auditório do CCB, dias 1 e 7 (20.00) e dia 4 (16.00)

Bilhetes dos 25 aos 60

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