Maduro enfrenta teste na repetição das eleições no estado em que Chávez nasceu
Nas eleições regionais de 21 de novembro, as primeiras que a oposição não boicotava em muitos anos, o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV, no poder) conquistou o governo de 19 dos 23 estados do país. A grande surpresa ocorreu em Barinas. Os eleitores do estado natal do falecido presidente Hugo Chávez, que desde 1999 estava nas mãos da sua família, tinham negado a reeleição do governador Argenis Chávez, o irmão mais novo do "comandante". A votação acabaria contudo por ser anulada. Este domingo, os eleitores são de novo chamados às urnas num voto que é também um teste ao presidente Nicolás Maduro.
Hugo Chávez nasceu em Sabaneta, no norte de Barinas, e na cidade existe uma estátua (além de vários murais) do presidente, que morreu de cancro em 2013. No mesmo ano em que foi eleito, 1998, o seu pai, Hugo de los Reyes Chávez, tornou-se governador do estado, cargo que ocupou até 2008. Depois foi a vez de Adán, o irmão mais velho do "comandante", que governou até 2016, sendo atualmente embaixador da Venezuela em Cuba. Desde 2017 que Argenis estava à frente dos destinos do estado e procurava a reeleição em 2021. Mas no meio da crise política venezuelana, parece que já nem o apelido Chávez era suficiente.
As projeções da Comissão Nacional Eleitoral apontavam para a vitória do opositor Freddy Superlano, candidato da Mesa de Unidade Democrática (MUD), nas eleições de 21 de novembro: tinha 37,60% dos votos, frente a 37,21% de Argenis. Mas uma semana depois da votação, o Supremo Tribunal de Justiça alegou que Superlano estava proibido por lei de se candidatar. O aliado do líder da oposição Juan Guaidó, que parte da comunidade internacional reconheceu como presidente interino a partir de 2019), seria alvo de "investigações administrativas e criminais" em relação a acusações de corrupção.
Para os opositores esta foi a desculpa encontrada para conseguir reverter o resultado eleitoral, lembrando que o deputado tinha recebido, em agosto de 2020, um indulto da parte de Maduro, junto com outros opositores que estavam detidos ou no exílio (era o seu caso). Apesar dos protestos de Superlano e da oposição, novas eleições foram convocadas para este domingo.
Diante do revés eleitoral e da polémica, Argenis Chávez demitiu-se e anunciou que não pretendia voltar a ser candidato. Maduro lançou então Jorge Arreaza para a corrida. Vice-presidente de 2013 a 2016 e chefe da diplomacia de 2017 até agosto do ano passado, o candidato tem também experiência como ministro da Ciência e Tecnologia, da Educação e das Indústrias. Além disso, apesar de não ser um Chávez, foi casado durante dez anos com Rosa Virgínia, uma das filhas do ex-presidente. "Arreaza é o pai de um amado neto do nosso comandante", lembrou Maduro, no anúncio da candidatura. Estava a falar de Jorge Arreaza Chávez, que acompanhou o pai em algumas ações e campanha.
Do lado da oposição, e tal como aconteceu nas eleições de novembro, não houve união. Sergio Garrido foi o candidato escolhido pela MUD, depois de a mulher de Superlano também ter sido inabilitada e impedida de ocupar o lugar na lista do marido. Mas a Concertação pela Mudança avançou com a candidatura de Claudio Fermín. E há mais quatro candidatos, entre eles, para complicar as coisas, Adolfo Superlano - que não tem qualquer ligação familiar a Freddy Superlano e foi até o responsável pela queixa inicial enviada ao tribunal a alegar que a sua candidatura era ilegal.
Para garantir a segurança das eleições, foram destacados 20 mil militares para Barinas, um estado de menos de um milhão de habitantes. Um número exagerado, segundo alguns analistas, que veem nesta presença uma tentativa da parte do regime venezuelano para garantir que não haverá novas surpresas com o resultado. As eleições de novembro foram as primeiras em vários anos supervisionadas por observadores internacionais. A eurodeputada socialista Isabel Santos liderou a missão da União Europeia, que apesar de ter admitido que o escrutínio ocorreu em melhores condições do que outros no passado, ainda assim detetou "deficiências estruturais" no processo. A expectativa é que o relatório final seja apresentado, em Caracas, no dia 24 de janeiro.
As eleições em Barinas são mais um teste a Maduro, que continua no poder apesar de a sua vitória eleitoral e posse em janeiro de 2019 não ter sido reconhecida por parte da comunidade internacional. Mas os protestos não se espalharam das ruas para os quartéis e Maduro manteve o apoio dos militares, que o seguraram no poder diante das investidas da oposição cada vez mais dividida. Desde então, tem aberto portas ao diálogo, mas as negociações moderadas pela Noruega no México foram suspensas depois da detenção em Cabo Verde e consequente extradição para os EUA do empresário Alex Saab, considerado o testa de ferro do governo e suspeito de corrupção.
Este ano, Maduro atinge a metade do mandato e, segundo a Constituição, pode ser alvo de um referendo revogatório. Mas o processo é difícil (implica a recolha das assinaturas de 20% dos eleitores, sendo que em cada estado tem que haver pelo menos 1% de eleitores a apoiar o projeto) e já falhou em 2016, agravando ainda mais a situação política.