MADONNA CONTADA PELO IRMÃO

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Livro. Na próxima segunda-feira, chega às livrarias portuguesas 'A Vida com a Minha Irmã Madonna', uma biografia assinada pelo irmão da cantora, Christopher Ciccone, que entretanto gerou polémica. O livro foi escrito com a colaboração de Wendy Leigh, autora de vários livros, entre os quais uma biografia de Grace Kelly

Surge (...) Madonna, pronta para me apresentar outra nova e esclarecedora experiência. No entanto, desta vez sou eu que tomo a iniciativa. Vi-a fumar erva com os amigos, estou curioso e quero fazer o que a minha irmã mais velha está a fazer. Portanto, faço-lhe perguntas.

Dois dias depois, ela presenteia-me com um charro enrolado em papel cor-de-rosa.

"São cinquenta cêntimos", diz ela, ficando com a mão estendida, à espera.

Pago-lhe.

Já nessa altura, uma perfeita mulher de negócios! Agora, com o encorajamento da Christopher Flynn, Madonna saiu de Ann Arbor sem se licenciar e muda-se para Manhattan. Mais tarde, dirá a propósito dessa primeira viagem: "Vim para aqui com trinta e cinco dólares no bolso. Foi a coisa mais corajosa que alguma vez fiz."

Foi, na verdade, corajosa ao não se licenciar e ao desafiar o nosso pai, que ficou horrorizado por o primeiro dos filhos a entrar na faculdade acabar por desistir. Lembro-me de que até eu achei um exagero o que ela estava a fazer.

Mas quanto a chegar a Manhattan apenas com 35 dólares e acabar na Times Square por não ter mais para onde ir - isso é pura mitologia. Primeiro que tudo, era uma rapariga da classe média com muitos contactos em Manhattan - outros bailarinos, outros instrutores - e, longe de ser essa vagabundazinha que não tinha sequer uma côdea de pão para comer, tinha dinheiro no bolso e um sistema de apoio completamente montado.

Pode ter passado uma noite a dormir na Casa da Música, mas isso era provável, pois esperava que um produtor ou um músico passasse e a descobrisse. Mitologia. Quanto mais avançava nela, mais mitológica se tornava a história da sua primeira viagem a Manhattan. Sombras de Anaïs Nin - a autora que também gostava de embelezar a sua própria biografia.

Sei, no entanto, que mesmo com muito mais do que 35 dólares no bolso e um grupo de amigos, aqueles primeiros meses depois de se mudar para a Big Apple não podiam ter sido fáceis para Madonna. Primeiro, estudou com o coreógrafo Pearl Lang, ganhou uns dólares a posar nua para estudantes de arte e passou alguns meses em Paris como protegida de dois produtores musicais franceses que queriam tra- tá-la como a última sensação américaine. Depois, diz-me que esteve doente durante quase todo o tempo que passou em Paris - uma infecção da garganta - que não deixava de estar relacionada, confessa ela, com o facto de detestar estar lá.

Entretanto, estou seguramente, senão infelizmente, metido no meu segundo ano da faculdade em Rochester, Michigan. Quando um dos meus amigos da faculdade me convida para passar parte do Verão na casa dos pais, em Darien, Connecticut, telefono a Madonna e pergunto-lhe se posso ir visitá-la em Manhattan. Diz que sim. Além disso, levar-nos-á a jantar quando lá chegarmos.

Na altura em que chegamos à cidade, a caminho do Connecticut, Madonna está a viver em Corona, Queens, numa sinagoga que foi convertida num estúdio, e a tocar bateria na banda do namorado, Dan Gilroy, a Breakfast Club.

Assim, o meu amigo e eu chegámos ao aeroporto, alugámos um carro e dirigimo-nos para a 53rd Avenue em Queens, mesmo junto ao local da Feira Mundial, e acabámos na sinagoga, um grande espaço aberto, ainda com gravuras religiosas nas paredes, mas com roupas e instrumentos espalhados por toda a parte. Tudo aquilo me parece um pouco sacrílego.

Mas pelo menos a minha irmã parece ter prazer em me ver.

Diz-me imediatamente que a banda é óptima, que vão crescer muito, e manda-os tocar uma canção para mim. Ela está atrás da banda, a tocar bateria, mas continua a atrair toda a atenção. Sinto--me obrigado a olhar para ela, e não para a pessoa que está à frente da banda. É sempre assim com Madonna.

Ao mesmo tempo, não posso deixar de perguntar a mim mesmo o que aconteceu à grave estudante da faculdade, à dedicada bailarina moderna que sonhava em abrir um dia o seu próprio estúdio de dança. Embora me diga que de vez em quando ainda vai a uma aula de dança, a Madonna bailarina moderna deixou claramente para trás a Madonna líder de claque, a rapariga tipicamente norte-americana, e a Madonna prima ballerina em embrião e discípula perdida de amores de Christopher Flynn.

Agora, transformou-se num Ringo Starr feminino e punk, de jeans rasgados, T-shirt branca, meias de rede pretas e o cabelo apanhado atrás em rabo- -de-cavalo. Parece-me que está apenas a esquivar-se à responsabilidade, sem orientação. Estou algo preocupado e bastante desapontado, mas mais uma vez admiro o seu sentido impressionantemente persistente de autoconfiança.|

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