Lusodescendentes nos EUA: mais dispersos e a falar mais português
A Califórnia continua a ser o estado com o maior número de imigrantes portugueses e lusodescendentes e o cluster Massachusetts-Connecticut-Rhode Island é a zona dos EUA com a maior comunidade, mas os 1,3 milhões de pessoas que se identificam como portugueses ou seus descendentes estão cada vez mais dispersos geograficamente. Esta é uma das conclusões do estudo "Imigrantes e lusodescendentes nos EUA no século XXI", agora divulgado pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD). A mesma investigação, que compreende os anos 2006 a 2020, revela que o número de falantes de português está a crescer e que estes apresentam um nível de escolaridade superior ao do resto da comunidade.
"Não podemos agir para e com a comunidade sem sabermos quantos são os seus membros, quem são, em que condições e em que estados e cidades os encontramos", escreve Rita Faden, a presidente da FLAD, na introdução do estudo. Ora para estudar esta comunidade, os investigadores liderados por Alda Botelho Azevedo, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa dividiram-na em quatro grupos - os imigrantes portugueses, os imigrantes naturalizados, os lusodescendentes que falam português e os lusodescendentes que não falam português.
Historicamente, uma característica da comunidade portuguesa era a concentração geográfica, tanto na Costa Leste (Massachusetts, Rhode Island, New Jersey e Connecticut) como na Califórnia. Mas nas últimas décadas "há efetivamente indícios de uma mudança no padrão de distribuição geográfica dos lusodescendentes que falam português", explicam ao DN as investigadoras Alda Azevedo e Lara Tavares, confirmando que se "observa o decréscimo deste grupo em estados de fixação tradicional dos portugueses nos EUA, e o crescimento noutros estados (Flórida, Texas, Geórgia e Nova Iorque)."
Mas olhemos para trás, para perceber como chegámos aqui. A fase mais antiga de emigração portuguesa para os EUA situa-se entre 1800 e 1870 e está sobretudo ligada à caça da baleia, envolvendo, em primeiro lugar, população dos Açores. "O principal destino desta imigração, dominada por população camponesa pobre e muito pouco instruída, correspondia a localidades da Nova Inglaterra como New Bedford ou Nantucket (Massachusetts), mas também teve como destinos relevantes algumas localidades da Califórnia (Sacramento, Monterey) ou o Havai", lê-se no estudo. Uma segunda fase corresponde ao período 1870/1880-1920, com intensos fluxos migratórios para o Havai (trabalho nas plantações de cana de açúcar), Rhode Island e Massachusetts (a indústria têxtil precisava de mão de obra) e Califórnia (sobretudo agricultura e pecuária). A terceira fase situa-se entre 1920 e meados dos anos 1950, marcada por uma diminuição da emigração portuguesa. Uma tendência que se inverteria nas décadas seguintes com o Azorean Refugee Act, na sequência da erupção do vulcão dos Capelinhos, no Faial, mas que regressou depois de 1985, quando a chegada de portugueses aos EUA voltou a baixar.
Hoje, uma das conclusões do estudo é que os lusodescendentes que falam português estão a crescer, enquanto todos os outros grupos estão em declínio. Uma realidade que as investigadoras admitem ter sido "em certa medida uma surpresa" mas que Alda Azevedo e Lara Tavares dizem ter "vários factores explicativos, desde logo os esforços da comunidade portuguesa e de proximidade lusa para o ensino do português nas escolas americanas". O estudo revela ainda que do total de residentes nos EUA nascidos em Portugal ou com ascendência portuguesa, mais de um quinto (22,49%) falava português em casa, além do inglês, fator que, lê-se, "revela uma preservação da identidade cultural."
Uma das razões para o declínio da população de imigrantes portugueses é o seu envelhecimento, resultado, por um lado, "de um fraco rejuvenescimento por via da redução do fluxo imigratório e, por outro lado, do envelhecimento populacional", diz o estudo.
Em termos de educação, um dado novo é o facto de 40% dos lusodescendentes que falam português terem o ensino superior - quase 10 pontos percentuais acima da média dos outros residentes nos EUA. Em termos de atividades económicas, os vários grupos da comunidade também têm comportamentos diferentes. Por exemplo, um em cada cinco dos imigrantes portugueses trabalha na construção. Já os lusodescendentes, sobretudo os que falam português, têm uma maior percentagem de trabalhadores em atividades de consultoria, científicas e técnicas do que os outros residentes nos EUA.
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