Louçã eleva a fasquia: "Marisa terá mais votos que Maria de Belém"
A estratégia é decalcada da campanha para as legislativas e o tom profético adaptado à realidade das presidenciais. Se na antecâmara da corrida ao Parlamento Francisco Louçã anteviu que o BE eleitoralmente já valia mais que o CDS, a quatro dias da eleição do novo chefe do Estado o fundador dos bloquistas foi contundente no vaticínio: "Marisa [Matias] terá mais votos que Maria de Belém."
O ex-coordenador do BE foi a estrela do comício deste 11.º dia oficial de campanha, que teve lugar em Braga, e elevou para outro patamar os objetivos da candidatura. Marisa tem falado da passagem à segunda volta, mas Louçã afastou-se dessa contabilidade e pôs as fichas todas noutra façanha: superar a ex-presidente socialista no domingo.
Belém ergueu um muro de silêncio desde a morte de Almeida Santos e ainda não veio a terreiro justificar a sua assinatura no pedido de fiscalização ao Tribunal Constitucional da revogação das subvenções vitalícias para os deputados. Louçã não deixou que o tema fosse votado ao esquecimento e fez mais: explorou as cisões entre socialistas - Belém/Sampaio da Nóvoa - no que respeita a estas presidenciais.
Com a palavra afiada, identificou então três razões para que os socialistas se inclinem para Marisa Matias. Na caça ao voto entre o universo "rosa", piscou o olho aos que "não aceitam que esta campanha seja apenas uma guerra entre o seu partido"; aos que querem superar "a maçada desta eleição", não se conformam com um "marcelismo cor de rosa" (referindo-se a Belém) e a "esquecer os seus próprios candidatos"; e, por último, àqueles que "não aceitam a casta e querem virar a página" - referindo-se à "manobra sorrateira para defesa das mordomias" dos deputados (21 socialistas e nove sociais-democratas) que recorreram ao TC. E apontou o dedo aos "partidos-empresa", como PSD e CDS - não afastando liminarmente o PS desse conjunto -, contra os quais se bate.
Num discurso que galvanizou os presentes na Escola Artística do Conservatório de Música Calouste Gulbenkian, Louçã frisou que, em tempos de crise, a sua candidata "não desistiu de ninguém" e que integra "uma esquerda que teve desgosto mas não aceita a fatalidade" e sublinhou que há 30, desde Maria de Lourdes Pintasilgo, que o país está "à espera da Marisa", a mulher que "não é uma candidata de cadeirão".
Quem também terá ficado com as orelhas a ferver com a intervenção do fundador do BE foi Marcelo Rebelo de Sousa. Louçã ancorou-se nos comentários e nas análises que têm sido feitos a esta corrida à sucessão de Cavaco e atacou com veemência a "arrogância implícita" de quem tem apostado na "estratégia da banalidade" e de "esvaziamento" político. E até os que consideram que "o melhor é o 'aceitómetro' completo". Traduzindo: a eleição de um Presidente que "garante o acordo completo com decisões que o primeiro-ministro não tomou".
Sobre esse "esvaziamento", puxou da ironia e reduziu-o ao absurdo. Só optará por ele "alguém que se candidata por estar enamorado pelo palácio de Belém" ou se o "Presidente da República tiver como função tratar do jardim".
Sem nomear a coisa nomeada, ou seja Marcelo, retomou os remoques: só pensará assim quem "considera que a campanha em si própria é uma obrigação excedentária porque o país lhe deve um prémio, um Oscar de carreira".
Na mesma toada, Louçã ainda se lembrou de equiparar a Presidência da República a uma aposta no Euromilhões, que "faz excêntricos todas as semanas", como se para se ser eleito "não fosse preciso merecer". "Não queremos uma lotaria, não queremos excentricidades em Belém", rematou.