Loris Karius, a última vítima da angústia dos guarda-redes
A angústia de um guarda-redes não existe apenas antes do penálti, momento celebrizado no título de um livro pelo austríaco Peter Handke e adaptado ao cinema por Wim Wenders. É uma angústia permanente de quem sabe que é o último homem a poder falhar em campo. Uma angústia que se transforma em drama a cada erro e que pode assumir proporções trágicas no palco e momento mais inadequados. Como aconteceu, sábado, com Loris Karius em plena final de Liga dos Campeões.
O guarda-redes alemão do Liverpool não é caso virgem, claro, no que toca a guardiões infelizes em grandes palcos do futebol. O Brasil, por exemplo, andou 50 anos a culpar Moacyr Barbosa pelo Maracanazo de 1950, por ter tentado antecipar um cruzamento do uruguaio Ghiggia que, afinal, levou a bola direitinha à baliza na final do Mundial que os brasileiros pensavam festejar em casa. "Segundo a lei brasileira, a pena máxima de condenação é de 30 anos, mas eu estou prisioneiro há 50", disse o desgraçado "goleiro" Barbosa pouco antes de morrer, na miséria, no ano 2000.
Aos 24 anos, Karius é apenas o mais recente exemplo. Não é o primeiro, nem será seguramente o último. Mas o seu drama está cheio de tons carregados. Loris, que foi contratado em 2016 pelo Liverpool ao Mainz, por cerca de seis milhões de euros, a pedido expresso do treinador Jürgen Klöpp - e que nunca desde então conseguiu ser consensual entre os adeptos dos reds, acumulando várias falhas comprometedoras -, não cometeu apenas um, mas dois erros graves que ajudaram a decidir a final de Kiev a favor do Real Madrid.
A imagem, no final da partida, de Karius com as lágrimas a escorrer pela face e a pedir perdão aos adeptos dos reds, tornou-se mais forte do que as dos próprios festejos dos jogadores do Real, deixando o guarda-redes exposto, sozinho. Numa equipa cujo lema é, precisamente, You"ll Never Walk Alone, os adeptos brindaram o jovem alemão com palmas, mas a eternidade que os companheiros demoraram a confortar Karius após o jogo mereceu ontem várias críticas na imprensa britânica.
Ameaças de morte
Também ontem, a polícia de Meyerside, condado em que se insere a cidade de Liverpool, anunciou estar a investigar as várias ameaças de morte ao guarda-redes nas redes sociais.
Sérias ou não essas ameaças, o futuro de Loris Karius levanta inevitavelmente várias interrogações nesta altura. E suscita preocupações várias sobre um guarda-redes de alma destroçada. "Estou sem palavras. Não me recordo de ter visto algo de tão brutal para um guarda-redes numa final. Uma noite como esta pode destruir uma carreira", comentou o antigo n.º1 alemão Oliver Kahn.
Já ontem à tarde, Karius voltou a abrir a alma, no Twitter: "Não dormi até agora... As imagens continuam a passar na minha cabeça, uma e outra vez. Peço imensa desculpa aos meus companheiros, aos fãs e a todo o staff. Sei que deitei tudo a perder com aqueles dois erros e dececionei-vois. Gostava que o tempo voltasse atrás, mas não é possível. E o pior é que todos sentíamos que podíamos ter ganho ao Real Madrid", lamentou o guarda-redes.