Lisboa. Lixos e gestão do espaço público são áreas críticas para os residentes
A Polícia Municipal de Lisboa (PML) quis avaliar o grau de confiança que os lisboetas tinham nos seus serviços e sujeitou-se a um escrutínio inédito: um inquérito exaustivo no terreno para saber o que pensam os residentes da cidade sobre a sua ação do dia-a-dia.
A PML é aprovada positivamente por 64% dos residentes em Lisboa, que consideram que tem um bom desempenho global. Mais, 68% confiam nesta polícia.
No entanto, o valor desce um pouco, para 54%, quando se perguntou sobre o grau de satisfação (experiência, contactos, competência) com a intervenção da PML. Apesar de serem mais de metade a dar uma classificação positiva, "a satisfação com algumas áreas de intervenção carece claramente de melhorias", é escrito no relatório.
A "saúde pública" e o "espaço público" foram sinalizadas pelos lisboetas como as áreas a necessitar de maior intervenção na cidade.
No primeiro caso, que diz respeito a situações de insalubridade, como lixo espalhado nas ruas, caixotes de lixo cheios, resíduos sólidos, dejetos de animais, 45% dos residentes dão uma classificação negativa ao que percecionam no dia-a-dia.
No segundo caso, que tem que ver com a presença policial, sinalização de ocorrências como a falta de iluminação, viaturas abandonadas, ocupação dos espaços públicos, 35% criticam a falta de atuação da PML.
Além de uma análise ao nível de satisfação que os munícipes têm na PML, havia neste estudo outro objetivo: identificar prioridades de áreas de intervenção desta Polícia que, com os pontos críticos identificados, têm assim um ponto de partida para o seu plano estratégico.
O inquérito foi executado por uma empresa independente especializada em sondagens e avaliações de mercado.
Assim, no relatório final, a que o DN teve acesso, é feito um retrato, freguesia a freguesia, sobre quais são as áreas consideradas mais críticas e que os lisboetas gostariam que fossem alvo de maior intervenção das autoridades, neste caso da Polícia Municipal. Da mesma forma, são também indicados os setores de maior sucesso.
A Polícia Municipal é constituída por oficiais e agentes requisitados à PSP. Trata-se de um corpo especializado, armado e uniformizado, pago pela Câmara Municipal de Lisboa (CML).
Depende orgânica e disciplinarmente da Direção Nacional da PSP. Operacionalmente depende do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), ou de um vereador, por delegação - atualmente Miguel Gaspar, com o pelouro da segurança.
Foi criada em 1891 e no próximo ano celebra o 130.º aniversário. É comandada há cinco anos pelo superintendente da PSP, Paulo Caldas, e conta atualmente com um efetivo de 625 pessoas (537 polícias + 98 civis).
Neste estudo, os residentes em Lisboa foram inquiridos sobre a atuação da Polícia Municipal em oito áreas-chave:
1. Mobilidade: ordenamento da circulação dos transportes públicos, circulação de peões, estacionamento abusivo.
2. Comércio: fiscalização dos espaços de diversão noturna, restauração, feiras e mercados.
3. Turismo: visibilidade policial na cidade, apoio ao turista, domínio dos diferentes idiomas.
4. Espaço público: presença policial, sinalização de ocorrências como a falta de iluminação, viaturas abandonadas, ocupação dos espaços públicos.
5. Saúde pública: situações de insalubridade, como lixo espalhado nas ruas, caixotes de lixo cheios, resíduos sólidos, dejetos de animais.
6. Ambiente: proteção do Parque Florestal de Monsanto e dos jardins municipais.
7. Urbanismo: fiscalização de obras, estabelecimentos, ruído, qualidade de vida do cidadão;
8. Policiamento comunitário: constituição de parcerias entre Polícia e comunidades para a identificação e resolução conjunta de problemas a nível local.
O relatório final foi apresentado no passado dia 5 aos presidentes de juntas de freguesia, via Skype.
"A PML foi a única instituição municipal que se sujeitou a uma avaliação pública! Da minha parte, enquanto presidente de Junta, só posso elogiar o enorme esforço diário desta instituição, que, não obstante a escassez de recursos humanos, tem revelado uma enorme capacidade em cumprir com a sua missão e com espírito de colaboração com a junta. Um grande abraço de reconhecimento a todos os agentes e colaboradores da PML e uma saudação especial ao comandante Paulo Caldas extensivo à sua estrutura de comando", escreveu Miguel Coelho, presidente da junta de freguesia de Santa Maria Maior, na página de Facebook da PML.
Foram feitas 1100 entrevistas a residentes no concelho de Lisboa, realizadas em janeiro deste ano, com uma amostra representativa das 24 freguesias.
O inquérito abrangeu, não só os munícipes, mas também os parceiros da PML: universo total dos trabalhadores da Câmara Municipal de Lisboa, PSP, escolas, politécnicos, universidades, associações, coletividades, centros sociais e paroquiais, centros de dia, Carris, EMEL, entre outros.
Neste artigo, utilizamos apenas os dados relativos à opinião dos munícipes.
A "saúde pública" e o "espaço público" foram sinalizadas pelos lisboetas como as áreas a necessitar de maior intervenção na cidade.
"A saúde pública é distintamente a área de intervenção percecionada como a mais crítica, com um índice de satisfação negativo (45%)", é sublinhado no "sumário" do estudo.
Para os analistas, "esta é claramente uma área crítica, já que é considerada a área de intervenção mais importante por 63% dos munícipes".
Na mesma linha negativa está também a gestão do "espaço público"."Também é considerado como área crítica, embora não tão expressiva como a saúde pública. Alcança a segunda média de satisfação mais baixa (com 35% de insatisfeitos) e simultaneamente é também considerada uma importante área de atuação por 61%" dos inquiridos.
No reverso da medalha está o ambiente, "considerado a força da PML, nível a manter-se e a preservar".
O ambiente "é uma das áreas em que a PML capta dos maiores scores de satisfação (59%) e é simultaneamente uma das áreas consideradas importantes na intervenção" desta Polícia, logo a seguir à saúde pública.
Neste retrato, é ainda chamada a atenção para algumas possíveis "ameaças - áreas a observar e a monitorizar, já que lhe são atribuídas avaliações de satisfação intermédias e um grau de satisfação relativo". São elas a mobilidade, comércio, policiamento comunitário e urbanismo.
O turismo suscitou uma nota especial por parte dos analistas do inquérito: "É interessante perceber que o turismo é uma área de intervenção que capta o índice de satisfação mais elevado (63%), contudo é a área com os mais baixos índices de importância, o que reflete a importância dada à relação da PML com os seus munícipes e não tanto relevante para com os turistas - é o ponto de vista de quem habita na cidade e não de quem 'apenas' a visita."
São os mais jovens (18-24) quem mais confia na PML (78%), seguidos dos mais de 65 (72%). O índice de confiança global é de 68%.
Segundo o estudo, "a confiança é fundada na conduta ética e na efetividade, e é continuamente moldada pelo que as instituições dão e recebem, bem como o que estas devem fazer para cumprir essas promessas a fim de as pessoas poderem confiar nelas".
De acordo com os últimos dados do Eurobarómetro, o índice de confiança na Polícia em Portugal era em 2019 de 70% e na Europa de 67%. A média do índice de confiança na PML, somando os munícipes com os parceiros, é de 75%.
O que mais contribuiu para a avaliação positiva dos munícipes quanto à confiança depositada foi a "experiência profissional demonstrada" e a forma de atuação policial". O fator que influenciou mais negativamente foi a pouca visibilidade dos polícias na cidade.
No que diz respeito ao "relacionamento" com a PML, apesar de a maioria dos lisboetas atribuir nota positiva (63%), há alguns alertas a ter em conta: o "tempo de resposta às solicitações" e a "competência na resolução dos problemas" foram considerados "péssimos" pela maior percentagem de munícipes - 22% e 20%, respetivamente.
Analisando mais em detalhe a atuação desta Polícia em relação às oito áreas de atuação já referidas (mobilidade, comércio, turismo, espaço público, saúde pública, ambiente, urbanismo e policiamento comunitário), 54% dos munícipes inquiridos mostraram-se satisfeitos na globalidade.
No topo das opiniões positivas está o turismo (63%), seguido do ambiente (59%), depois o comércio (57%), a mobilidade (53%), o policiamento comunitário e o urbanismo (ambos com 52% de boas avaliações).
No fim da tabela, está o espaço público, área em que a PML apenas colhe opiniões positivas de 50% dos inquiridos e 35% classificam como "péssima" a sua atuação; e a saúde pública, com 45% de opiniões negativas e apenas 40% a apoiar a atuação da PML.
E, como já foi referido, esta é a área que a maioria dos munícipes considera de intervenção mais importante da PML.
E se ainda tem dificuldade em distinguir um agente da Polícia Municipal de um da PSP, pois está entre uma minoria. Na distinção entre a PSP e a PML, os munícipes não têm dúvidas sobre quem é quem: 90% dizem que é clara a distinção entre estas duas Polícias.
É também a Polícia Municipal que ganha em matéria de visibilidade. Dos 22% de lisboetas que disseram ter visto um agente policial na rua nesse dia, 53% garantiu que esse agente era da PML.
O vereador da CML, Miguel Gaspar, que tutela a PML, sublinha que "é a primeira vez que este estudo é feito e traz transparência e humildade".
Este responsável assinala que as conclusões "dão pistas para melhorar a atuação dos nossos serviços e/ou melhorar a comunicação sobre o trabalho que é feito".
Destaca que "cada presidente da junta tem agora conhecimento de qual é a perceção dos seus residentes em relação à sua atuação".
Questionado sobre o facto de a saúde pública ter sido considerada a área mais crítica, Miguel Gaspar assinala que "esta é uma prova de que a orgânica municipal não pode funcionar como um silo".
Ressalvando que a PML não ter qualquer competência para tratar dos lixos na rua (agora é das juntas de freguesia), "se as pessoas têm esta preocupação é porque gostavam de ver mais intervenção da fiscalização".
Assinala ainda que "alguns problemas que existiam na altura do inquérito [janeiro] têm vindo a ser resolvidos, como é o caso da acumulação de lixo que se fazia sentir junto às 'ecoilhas' (contentores enterrados no chão) - em articulação com as juntas de freguesia foi alterada a gestão de recolha e melhorada a situação".
O vereador mostra-se satisfeito com esta iniciativa de avaliação, "que é mais uma forma de participação pública", e diz que pretende "transformar este inquérito num barómetro para que, ano a ano, se vá vendo a evolução".
"A nossa ambição é que a PML seja o melhor corpo policial do país, bem equipada de polícias de excelência. Esta Polícia é reconhecida internacionalmente pelo seu policiamento comunitário e isso é porque criou uma relação de grande confiança com os seus munícipes e parceiros", conclui.