Lifeline já atracou em Malta. Debate sobre migrações domina cimeira

Líderes - ainda dos 28 Estados membros da UE - estão esta quinta e sexta-feira reunidos em Conselho Europeu. Donald Tusk prevê "debate escaldante" sobre futuro da gestão dos fluxos migratórios a nível europeu
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Os líderes da União Europeia reúnem-se esta quinta e sexta-feira em Bruxelas para um "debate escaldante" sobre o tema das migrações. A expressão é do próprio presidente do Conselho Europeu, na carta convite, algo tardia, que Donald Tusk dirigiu ontem aos líderes - ainda - 28 chefes do Estado e de governo.
Tusk pede aos líderes da UE para darem luz verde à proposta da Comissão Europeia (CE), para que sejam criadas "plataformas regionais de desembarque fora da Europa", com o objetivo de alterar "o funcionamento das operações de busca e salvamento" no Mediterrâneo. O texto deixa entender que a ideia pode avançar sem o envolvimento de outros organismos internacionais como "o ACNUR e a OIM".

Estas duas entidades, que numa primeira fase foram apresentadas como indispensáveis, serão envolvidas no processo "se possível", admite o polaco que coordena os trabalhos do Conselho Europeu.

Numa altura em que se exigem soluções urgentes, na sequência de um novo momento de angústia vivido, já esta semana, abordo do navio de resgate da ONG alemã Lifeline, que esteve seis dias no mar, com 234 migrantes a bordo, sem autorização para atracar em nenhum dos portos mais próximos, as opções em cima da mesa são olhadas com desconfiança. Só ontem ao final da tarde o Lifeline atracou em Malta, depois de alguns países, incluindo Portugal, se terem oferecido para receber estas pessoas que são, na maioria, da África Subsariana. O ministro da Administração Interna português, Eduardo Cabrita, indicou ontem que Portugal poderá "acolher cerca de um décimo dessas pessoas".

Ao que apurou o DN, em Bruxelas, o ACNUR estava, até ontem, sem conhecer os detalhes da proposta e sem saber que grau de envolvimento se espera que venha a ter na ideia lançada pela CE, embora oficialmente, tenha manifestado o interesse numa "nova abordagem colaborativa", desde que combinada com o "aumento dos realojamentos". A situação é semelhante em outras instituições relevantes na matéria, como a UNICEF.

"Estamos esperançados", relativamente à proposta, "mas ainda não conhecemos todos os detalhes", confessou Sarah Crowe, que tem a pasta dos migrantes e refugiados, no organismo sediado em Genebra, tendo alertado para a necessidade de conter "uma grande preocupação" relativa aos envolvimento de Estados externos à UE. Algo que até considera "bom", embora com condições.

"Se o desembarque significar que vão ter um processamento rápido, que vão ter acesso a serviços e que não vão ser detidos, então [as plataformas] podem ser uma coisa boa", afirmou ao DN, alertando que, "se, por outro lado, significar que vão ser detidos, com base na condição de migrantes e que não vão beneficiar dos serviços que precisam, de tutores ou até de um sistema de cuidados sociais, apoio e acesso a informação legal que os jovens percebam, - se não tiverem isto -, então será uma coisa má". Com as posições divididas à volta da mesa do Conselho, ninguém arrisca apontar um desfecho para as consequências da decisão. "O nosso objetivo deve ser quebrar o modelo de negócios dos contrabandistas, já que esta é a maneira mais eficaz de parar os fluxos e pôr fim à trágica perda de vidas no mar", garante Tusk naquela carta.

As opções geram desconfiança, até por, em parte, serem apoiadas pelo líder do partido de extrema direita e antieuropeu Liga, Mateo Salvini, agora ministro do Interior de Itália. Este considera fundamental que sejam construídos centros que "tramitem as solicitações de asilo" e que se acelerem "as devoluções aos territórios de origem se não têm direito [a ficar]".

Já esta semana, Salvini esteve reunido com governantes líbios, para discutir a criação de um centro na fronteira sul do país, distante da capital, "para evitar que Trípoli se transforme num funil como é a Itália". O governante italiano defende que estas instalações deveriam ser organizadas e financiadas pelas Nações Unidas e a UE.

Mas, no Parlamento Europeu, o deputado que esta semana testemunhou a situação dos migrantes do Lifeline, o comunista, João Pimenta Lopes acredita que a medida "poderá pôr em causa até um outro princípio do direito internacional, que é o princípio da "não-repulsão". E, portanto, o que estamos a falar na prática é da garantia de que alguém que seja resgatado no Mediterrâneo, seja repelido para essas ditas plataformas regionais de receção".

"A prática tem demonstrado que o que tem vindo a ser criado, com o apoio, também da UE - seja na Turquia, seja na Líbia -, são a constituição de autênticos campos de concentração, em condições de desumanas, na maior parte dos casos [e] de intensa exploração destas pessoas", afirmou o eurodeputado ao DN, depois de relatar a situação de "fragilidade" que viu a bordo do navio da Lifeline. Os relatos que chegam dos 234 migrantes a bordo, segundo os media de Malta, é que fugiram da Líbia para escapar à tortura. E, no caso das mulheres, às violações.

Em Bruxelas

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